Uma reunião de rotina da CEE (Comissão Especial de Estudos) da Câmara de Ribeirão Preto, que apura o abandono da Base de Apoio Comunitária do bairro Heitor Rigon, ganhou uma repercussão inesperada. Não pelo conteúdo dos depoimentos, mas pela condução dos trabalhos, que regimentalmente deveria ser feita por um vereador que a integrasse.
O encontro realizado na última segunda-feira (06) foi “presidido” pela socióloga e professora Mileide Melo, integrante do “Ramon todas as vozes”, mandato coletivo que leva o nome do vereador titular Ramon Faustino (PSOL).
Mileide é um dos sete “covereadores” que compõem o grupo, mas não pode exercer o mandato. O parlamentar está afastado da função por licença-médica. A legislação eleitoral não reconhece a existência dos mandatos coletivos. Dessa forma, apenas o vereador eleito é diplomado, toma posse e exerce as atividades conforme o Regimento Interno.
A condução da reunião pela covereadora chamou a atenção do coordenador Legislativo da Casa, Fernando Ramos, que alertou os demais integrantes da comissão – o outro mandato coletivo da Câmara, “Judeti Zili” (PT) e o vereador França (PSB) – sobre a irregularidade.
“Os dois vereadores têm a obrigação de saber o regimento, a gente não tem como parar a reunião, mas eles foram alertados. Saí pessoalmente da minha sala para avisar e a assessoria da Casa também”, afirmou.
Ao Portal Thathi, França disse que estranhou a condução dos trabalhos por Mileide, mas que preferiu seguir com a reunião do que cancelá-la. “Eu vim para presidir (a reunião), mas o pessoal do Ramon tem mais conhecimento sobre o tema e estava tudo pronto. Tinha munícipe presente e por videoconferência. Preferi tocar do que cancelar e marcar tudo de novo”, completou.
O caso rendeu uma bronca por parte do presidente da Casa, Alessandro Maraca (MDB), no início da sessão desta terça-feira (7). O parlamentar leu um comunicado da Coordenadoria Legislativa que ressalta a autonomia das comissões, mas determina a condução dos trabalhos por vereadores.
“Há orientação para participação dos munícipes, mas não na condução. As reuniões devem ser conduzidas pelo presidente, vice ou membro”, pontuou.
o vereador Ramon Faustino foi questionado sobre o tema, mas não respondeu a reportagem do Grupo Thathi até o fechamento desta matéria. Se houver retorno por parte do parlamentar, ele será incluído neste texto.
Ilegalidade
O advogado Vinícius Bugalho, que integra o comitê de Ética da OAB estadual de São Paulo, considera que o caso pode configurar, em tese, o crime de usurpação de função pública, que ocorre quando alguém exerce ou pratica uma função que não lhe é devida.
“Em tese pode configurar porque a pessoa assume uma cadeira de vereadora para o qual ela não foi diplomada. Legalmente, não existe mandado coletivo. É uma criação moral, não jurídica”, opina.
Para o cientista político José Elias Domingos, é preciso debater a regulamentação dos mandatos coletivos. “Esse fenômeno é muito recente aqui no Brasil, vem de um pouco mais de quatro anos. A candidatura é individual, independentemente de como ela é exercida”, concluiu.