A Polícia Civil Ribeirão Preto investiga uma troca de mensagens e ligações que levaram uma menina de 11 anos a tentar o suicídio. A menor tentou se matar na noite de domingo (1) e a mãe informou que, uma semana antes da tentativa, professores tiveram acesso a conversas nas quais ela teria recebido orientações, via celular, para cometer autolesões. A pessoa responsável pelas mensagens ainda não foi identificada. Especialistas ouvidos pela reportagem afirmam que casos como esses estão se tornando comuns e que os pais precisam estar atentos a atitudes fora do comum dos filhos e também à interações nas redes sociais.
O caso aconteceu no domingo, no Jardim Joaquim Procópio de Araújo Ferraz, na zona Oeste de Ribeirão Preto, mas foi registrado na segunda-feira (2). Segundo o boletim de ocorrência, a mãe se deparou com a criança com uma toalha enrolada no pescoço e tentando se pendurar. Desesperada, ela socorreu a menor, que tinhas também marca de cortes de faca nos braços e nas pernas.
Segundo depoimento da mãe, professores da criança onde a criança estuda também perceberam mudanças no comportamento dela. A mãe chegou a ser chamada na escola e avisada, em uma reunião com a diretora e a professora, que a jovem estaria recebendo mensagens, pelas redes sociais, nas quais era instigada a se lesionar. Ela chegou inclusive a ter acesso a prints das conversas. Alertada, a mãe monitorou as redes sociais da filha e percebeu postagens incomuns.
A menor foi socorrida pela mãe, e passa bem. O celular foi apreendido e será periciado pela polícia. A escola informou ainda que irá fazer um encaminhamento psicológico para a criança.
Análise
No Brasil, a taxa de crescimento de casos de suicídio na faixa etária de 10 a 14 anos aumentou 40% em dez anos e 33,5% entre adolescentes de 15 a 19 anos. Em média, dois adolescentes tiram a própria vida por dia, segundo dados do Ministério da Saúde. Entre os anos de 2003 e 2013, o país registrou aumento de 10% nos casos de suicídio entre crianças e adolescentes dos nove aos 19 anos. Ao longo das décadas de 1980 até 2012, o acumulado é ainda mais expressivo, chegando a 62,5% de suicídios entre adolescentes de 15 a 19 anos. Os dados fazem parte dos estudos Mapa da Violência, publicados em 2014 e 2015.
Segundo o psicólogo Felipe de Martino Pousada Gomez, é importante que os pais prestem atenção nos sinais dados pelos filhos, principalmente nas interações feitas através das redes sociais. “Os pais podem observar o comportamento da criança, se apresenta mudanças bruscas de humor e atitudes por conta de transformações profundas que podem ter relação com perdas ou perceber se a criança está passando por algum sofrimento e que acredita que tirar a vida seja a melhor saída”, avalia o psicólogo.
Ainda de acordo com Gomez, é importante que os pais se aproximem da criança e conversem sobre o assunto. “Muitas vezes, a família se distancia da criança em termos das suas necessidades, então a melhor forma de prevenir atitudes como essa é nutrindo a criança de afeto, ensinando a criança a falar e buscar ajuda em situações difíceis”, explica.
O psicólogo afirma ainda que a criança precisa se sentir amada e acolhida pela família para que consiga se abrir e expor os sentimentos. O celular da menina foi entregue para a polícia para análise e uma possível identificação do autor das mensagens. A mãe também informou que a escola fará um encaminhamento para a menina para tratamento psicológico.
Orientação profissional
Gomez diz que como criança não tem discernimento para perceber o que pode ou não ser perigoso, monitorar as evidências de mudanças no comportamento pode ser fundamental. “Diferente do que se diz, quem tenta o suicídio não está querendo chamar a atenção. Na verdade, a orientação é que quem já fez uma tentativa representa um risco muito maior”, sinaliza ele.
As escolas muitas vezes não têm profissionais capacitados para esse tipo de atendimento, visto que a criança passa grande parte da vida nessas instituições de ensino. Outro fator que deve ser observado é se a criança não está de alguma forma sofrendo humilhação dentro do ambiente escolar, se não está passando por alguma forma de violência psicológica.