Um motorista de Ribeirão Preto processou a Uber depois de ser excluído da plataforma de transporte devido a uma falsa acusação de racismo. Sem o direito de se defender, o homem ficou dois meses desempregado e conseguiu voltar para o aplicativo somente nesta sexta-feira (4), por intermédio de uma liminar conferida pela Justiça. Em nota, a empresa disse que vai recorrer da decisão.
Paulo Roberto Pinto, 56, foi removido do aplicativo no dia 27 de março, após se recusar a levar um passageiro que fez o pedido da corrida por meio da conta de outra pessoa. De acordo com o motorista, o direito de negar o embarque em situações como essa está entre as normas da empresa e foi por isso que ele não aceitou.
“Falei que não poderia levar porque ele era um rapaz e quem pediu foi uma mulher. Disse que pela política da Uber eu poderia ter essa liberdade de não aceitar. Não aceitei e orientei a ele que comunicasse a pessoa que pediu que ela deveria cancelar a viagem”, disse.
O motorista foi embora, acreditando que mal entendido havia parado por aí. Porém, meia hora depois, recebeu um comunicado da empresa dizendo que ele seria removido da plataforma, após supostamente quebrar uma das normas do aplicativo. “Na época a Uber alegou que eu teria praticado conduta imprópria, um crime de racismo contra essa pessoa que chamou a viagem”.
Roberto Pinto tentou recorrer da decisão da empresa, explicou o caso, enviou mensagens, relatou mais de uma vez o ocorrido, mas não obteve sucesso e ainda assim foi excluído da plataforma.
Veja nas imagens abaixo o diálogo entre o motorista e o suporte da plataforma
Sistema
Há mais de um ano trabalhando no aplicativo da Uber e com mais de sete mil viagens, Roberto Pinto estava no rol de melhores motoristas da plataforma e, inclusive, ostentava a categoria “Diamante” da empresa, com média 4,96 de um máximo de 5,00 nas avaliações. Porém, de uma hora para a outra, o homem se viu proibido de atuar em sua única fonte de renda em meio a pandemia e sem o direito de poder se defender das acusações.
“Nunca tive problemas em lidar com qualquer tipo de pessoa, de classe social, ou de opção sexual”, conta, “eu não sei quem é a pessoa, não sei o que ela reportou à plataforma. A plataforma não me comunicou nada, então fica aquilo o disse por não disse”.
Processo
Apesar de explicar inúmeras vezes o ocorrido, a Uber não mudou a decisão e manteve a exclusão do motorista que decidiu entrar com um processo contra a empresa para resolver a situação. “Eu me senti prejudicado porque em nenhum momento houve depoimento ou uma escuta das partes, mas no restante, essas coisas de aplicativo são assim. Dependendo do que o passageiro fala na central deles, nós motoristas infelizmente não somos ouvidos”, conta.
Foi então que os advogados Thiago Roberto Coletto e Andressa Ferreira Coletto, entraram com uma petição judicial para que a empresa reintegrasse imediatamente o motorista no aplicativo. No documento, eles classificam a acusação de racismo como um “ato de revanchismo” por parte do passageiro que levou ao banimento de Roberto Pinto e afirmam que a Uber obtinha meios para confirmar a veracidade da história por meio do GPS da acusadora.
“Ocorre que o autor [o motorista] foi descredenciado por motivo absolutamente injusto, vítima de um ato de vingança por não ter aceito burlar as regras de segurança do próprio aplicativo”, diz a defesa. “Outrossim, a plataforma possui todo o histórico das viagens realizadas pelo autor, bem como, a localização por GPS da passageira, ou seja, tinha conhecimento indeclinável que esta não se encontrava no local para onde o motorista foi direcionado”.
Os advogados questionam ainda o fato de as decisões da empresa terem sido tomadas de forma automatizada e alegam que “nesse aspecto, a inteligência artificial não consegue obter a resposta óbvia ou mesmo analisar questões controvertidas em que se analisa de forma intrínseca questão fáticas postas de maneira antagônica pelas partes”.
Decisão
Para o juiz Guilherme Stamillo Santarelli Zuliani, da 1ª Vara Cível do Foro de Ribeirão Preto, a Uber agiu de maneira arbitrária ao excluir o motorista, sem conceder o direito de apresentar provas de que as acusações não eram reais. O magistrado definiu a situação como uma “em evidente afronta aos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal, sobretudo por se tratar de denúncia grave anunciada pelo passageiro (racismo)”.
Por isso, em decisão publicada no dia 25 de maio, o juiz condenou a empresa a recadastrar Roberto Pinto na plataforma no prazo de até 24 horas, sob multa diária de R$200, limitada a R$10 mil. Zuliani concedeu ainda o prazo de 15 dias para que a Uber conteste a decisão.
O motorista pediu, ainda, indenização de R$ 1,3 mil por cada semana que ficou afastado indevidamente da plataforma por conta dos recursos que deixou de receber no período em que foi impedido de trabalhar. O pedido será julgado pelo juiz na anáise do mérito da ação e, se ele entender que o afastamento foi injusto, a empresa terá que efetuar o pagamento.
O motorista retornou para a plataforma nesta sexta-feira (4) e agora aguarda a resolução do processo.
Outro lado
Procurada, a Uber afirmou à reportagem que não vai comentar o caso, mas disse que vai recorrer da decisão judicial. Enquanto uma nova resoução sobre o assunto não é tomada pelo Judiciário, o motorista seguirá trabalhando.