Frequentemente, o Direito Penal é visto como um ramo das ciências jurídicas com poderes extremos, capaz de resolver os mais complexos conflitos e de desempenhar um papel fundamental na prevenção do fenômeno delitivo.
Todavia, infelizmente, essas duas formas de atuação são bastante limitadas na prática. Em primeiro lugar, é extremamente limitado o poder de resolução de conflitos por parte desse setor do direito. Enquanto o Direito Civil fixa indenizações reparatórias que resolvem ou diminuem sensivelmente o conflito, o Direito Penal, ao menos tradicionalmente, prende, o que não resolve a questão e ainda, na maior parte dos casos, deteriora o condenado.
A situação não é muito melhor ao procurarmos um efeito preventivo em tal setor jurídico. É certo que as punições sempre inibem as práticas delitivas, porém, muito menos do que gostaríamos. Isso ocorre porque, ao contrário do que o senso comum sugere, o efeito inibitório não vem tanto da quantidade de sanção prevista para os crimes, mas sim da certeza da punição. Em outras palavras, nas hipóteses em que existe a certeza – ou uma grande probabilidade – de impunidade, tal função preventiva também acaba não ocorrendo.
Por tudo isso, o grande desafio do Direito Penal contemporâneo é mostrar-se eficaz, ser capaz de apurar o ocorrido e, se for o caso, punir os autores dos crimes, o que passa muito mais pela aplicação prática do Direito Penal do que por eventuais alterações legislativas.
Por tais razões, não é exagero dizer que as Operações Sevandija e Lava a Jato não teriam as proporções que tomaram sem a ajuda da delação premiada. Tal instituto, ainda que alvo de críticas, acabou dando uma eficácia à persecução penal jamais vista.
No entanto, nos deparamos muitas vezes com críticas a eventuais abusos ou irregularidades que seriam cometidos pelas autoridades envolvidas nesse tipo de operação, que poderiam, dependendo do caso, produzir nulidades que, na prática, dificultariam muito a punição dos envolvidos, confirmando o fracasso preventivo do Direito Penal.
Assim, o momento atual é de reflexão sobre o futuro da persecução criminal. A necessidade presente é certamente a de se apurar eventuais práticas de crimes, com a consequente punição dos responsáveis. Isso ajudaria muito no reforço da finalidade preventiva do Direito Penal, já que a criação de uma cultura intolerante com a prática de delitos inibiria sensivelmente essas condutas no futuro. Por outro lado, o fracasso de operações como a Sevandija e a Lava a Jato, confirmaria a ideia da impunidade, significando a perda de uma excelente oportunidade para reverter tal quadro.
Porém, não podemos deixar de lado as garantias e regras processuais. Lembremos que todo Estado Democrático de Direito deve assegurar o contraditório, a ampla defesa e coibir abusos. Dentre outras razões, tais regras são fundamentais para que se descubra a real verdade dos fatos. Punir a pessoa errada, além de tremendamente injusto, também reforça a ideia da impunidade, de que os verdadeiros culpados jamais serão responsabilizados.
Na realidade, o problema não é tanto a existência de garantias, mas o mau uso delas. Há uma importante regra em Processo Penal: não há nulidade sem prejuízo. Assim, a nulidade deve ser reconhecida em último caso, apenas quando se tratar de um vício realmente grave, capaz de influenciar na decisão da causa, seja com viés acusatório ou defensivo. Não há sentido em se prender a meros formalismos, buscando anular procedimentos que atingiram sua finalidade com perfeição, com base em detalhes sem relevância prática.
De posse de todos esses elementos, o caminho a seguir fica bastante claro: precisamos buscar punições exemplares para os verdadeiros autores dos crimes, criando uma tradição nesse sentido. Porém, tudo isso tem que ser feito dentro da legalidade, respeitando os direitos e garantias fundamentais, sem exageros de nenhum dos lados.
Já nos ensinava Aristóteles, que a virtude está no meio, de modo que o adequado só pode ser buscar um persecução penal efetiva, respeitando as garantias processuais, mas, ao mesmo tempo, sem rigores formalistas excessivos, reconhecendo nulidades apenas quando efetivamente necessário para resguardar o Estado Democrático de Direito.