A gestão de uma organização, pública e privada, envolve duas dimensões: a racional e a emocional. A primeira exige as competências técnicas de um gestor, que ocupa posição formal na hierarquia da empresa e demonstra competência na articulação e na viabilização de processos, estratégia e estrutura. O gestor contribui significativamente para melhorar o desempenho da organização, age como um executivo, criando ou recriando o modelo estratégico e organizacional dentro do qual as diversas competências do seu time se integram. Para exercer esse papel, ele não precisa ser mero executor de uma estratégia definida pela cúpula da organização. É responsável pelo lado hard da gestão, fortalecendo a unidade que está sob seu comando.
A dimensão soft da gestão abarca cultura, liderança e pessoas e exige as competências de um líder, ou seja, aquele que opera com a energia que direciona a empresa para as necessárias mudanças que o mercado exige. É capaz de se comunicar não só com o intelecto, mas também com a alma e o coração das pessoas. Diferentemente do gestor, o líder é necessariamente legitimado por seus liderados, dando-lhe autoridade porque se identificam com os seus conceitos, valores e expectativas, trazendo-lhes, portanto, significado para suas vidas. Desta forma, sua liderança não depende de um cargo formal na hierarquia.
Nem todos os líderes são gestores, nem todos os gestores são líderes. Os líderes atuam na mobilização das pessoas, que é o lado mais emocional da sua ação. Os gestores atuam na eficiência operacional da empresa, o lado mais racional. Nenhum dos dois papéis é completo sozinho. As competências de gestor e de líder quando articuladas pela atuação “agridoce” e por uma visão de futuro se traduzem no papel do dirigente. O dirigente se mostra capaz de harmonizar os opostos porque percebe a unidade entre eles. Não rivaliza nem alimenta a divisão, porque superou a dicotomia entre o bem o mal, entre curto e longo prazos, entre o resultado e o foco nas pessoas.
A atuação “agridoce” concilia racionalização e revitalização, duas necessidades da organização. O desempenho superior sustentado da organização é obtido quando se é capaz de administrar a tensão entre duas forças aparentemente contraditórias: a necessidade de melhoria permanente do desempenho operacional e da produtividade por meio da racionalização constante das atividades existentes e a necessidade de crescimento e expansão pela revitalização contínua dos processos, da estratégia, da estrutura e das pessoas, tudo isso amalgamado pela cultura. Enquanto a maioria dos gestores considera que ambas são mutuamente excludentes, o dirigente articula essas duas dimensões de forma dinâmica e temperada.
A visão de futuro, que é modelada pela ambição, é a capacidade de compartilhar sonhos e causas e de criar significado para as pessoas. Além de coordenar o esforço coletivo a partir de uma razão de ser e em busca de um sonho compartilhado, o dirigente espelha a capacidade gerencial de conduzir a estratégia da organização e operacionalizá-la no dia a dia. Sua visão de futuro é o que dá sentido a uma utopia, partilhada coletivamente. O dirigente é aquele que tem a coragem de mudar o fluxo natural das coisas. Ninguém constrói um sonho e transforma sua empresa e o mundo obedecendo ao fluxo natural. O exercício da liberdade e a construção de um caminho novo exigem a determinação e a disciplina para fazer da vida algo que vai contra o processo inercial.
A aceitação de tensões como um processo natural do mundo dos negócios representa um desafio ao modo de pensar das pessoas nas organizações. E permite, inclusive, compreender que o perfil do dirigente está longe da perfeição. O dirigente integra suas falhas e dificuldades em oportunidades de aprendizagem. Conhecedor de suas deficiências, o dirigente está atento para a composição de sua equipe. Afinal, ninguém é perfeito, mas uma equipe pode ser.
O dirigente estadista
Não é fácil ser dirigente, é bem verdade. Mas aquele que o é ainda pode ir além. Ele pode extrapolar o limite da organização e exercer um papel na sociedade, para além daqueles exercidos pela organização. O dirigente pode ser um estadista. Sua atuação na empresa e pela empresa acaba por fazê-lo reconhecido na sociedade, para além da empresa e do seu setor na economia. O dirigente estadista é capaz de temperar os papéis de gestor e de líder de acordo com a necessidade da organização em cada momento, mas também de exercer influência na construção de uma sociedade melhor, a partir do seu poder de referência. Tem, assim, uma atuação política, no sentido literal do termo. O estadista faz da organização que preside uma participante da “cidade”, parte que é de um todo maior, atualizando a sua vocação “cidadã”, sinônimo de “política”.
Para exercer o papel de estadista, o dirigente-líder-gestor compreende que todas as visões particulares são importantes, a fim de que sua síntese promova a unidade que compõe as partes .
Da mesma forma que é importante para um dirigente estadista enxergar as suas forças e fraquezas, gerenciar o seu lado sol e o seu lado sombra, é essencial que faça a gestão competente dos paradoxos que o contexto em movimento apresenta. A competição presente no ambiente organizacional de hoje exerce pressões contraditórias sobre as lideranças. São forças antagônicas — do mercado, da sociedade, de cada indivíduo — que atuam simultaneamente nas organizações e são intrínsecas ao cenário internacional de negócios deste início de século. Como não existe a possibilidade de escolha entre uma e outra força, o dirigente precisa gerenciar esse contexto, reconciliando e equilibrando as oposições.