Com votação online pela primeira vez, a advocacia paulista escolhe nesta quinta-feira (21) quem irá comandar a OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo) pelos próximos três anos, após campanha curta marcada por ataques pessoais e acusações de influência política e ideológica.
Ao todo, seis chapas concorrem ao comando da seccional, responsável por todo o estado, com expectativa de que a votação online diminua a abstenção. Parte delas busca mobilizar a pauta de diversidade como diferencial ou se apresentar como a “verdadeira renovação”. Duas acenam de modo mais direto ao voto conservador e bolsonarista.
Cada uma tem quase 200 integrantes, com destaque para os cinco cargos da diretoria, que incluem presidente e vice, e para os candidatos a conselheiro federal. Obrigatória para todos os advogados com a anuidade em dia, a votação ocorre das 9h às 17h.
O grupo que está no comando da entidade atualmente tem como candidato o advogado Leonardo Sica, atual vice na chapa. Ele concorre ao posto pela segunda vez.
Em 2018, perdeu para Caio Augusto Silva dos Santos, que hoje representa a chapa que mais tem fustigado a situação, a partir de boletim de ocorrência de violência doméstica registrado contra Sica em 2010. As acusações exploradas nas redes sociais renderam queixa-crime contra um membro da chapa e processo de Sica contra o Facebook para remoção de conteúdo do WhatsApp.
Em postagem em suas redes, Carlos Kauffmann, que concorre agora e foi presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da seccional na gestão de Caio, lamentou o que classificou como desrespeito entre as duas chapas nesta eleição, apontando brigas e judicialização, e defendeu que a eleição deveria se pautar em propostas. Sobre a chapa de Caio, também apontou a “utilização política” da entidade e critica o fato de a chapa envolver o apoio de dois ex-presidentes da ordem, somando quase 20 anos de gestões.
Derrotado em 2021, ao tentar se reeleger, Caio Augusto é criticado por voltar ao pleito da entidade depois de concorrer às eleições de 2022 como deputado federal e ainda com apoio público de nomes da política partidária, como Marcos da Costa, secretário do governo Tarcísio de Freitas, e Marcos Pereira, presidente do Republicanos.
Entre os acenos da chapa à parcela da advocacia mais conservadora está sua vice, Angela Vidal Gandra Martins, ex-secretária do governo Jair Bolsonaro (PL) e pública defensora da pauta contra o aborto.
Ela entrou na chapa de Caio praticamente na reta final, no início de outubro. Antes disso, chegou a aceitar o convite para integrar a chapa de Alfredo Scaff, que se candidata pela segunda vez e traz consigo diferentes nomes ligados ao bolsonarismo.
Admirado por bolsonaristas e com nome citado entre aqueles que defendiam uma intervenção militar em 2022, seu pai, o advogado Ives Gandra, chegou a gravar vídeo de apoio a Scaff, mas disse que depois de ter sido liberado por ele de sua palavra, passou a apoiar a chapa de sua filha.
Com apoio apenas da direita, Scaff defende que a OAB não pode ter ideologia e diz que dialogará com todos se eleito. Entre os conteúdos que ele tem utilizado na campanha, está um vídeo em que é elogiado pelo ex-presidente.
Sica, que é sobrinho do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, criticou em entrevista o uso do parentesco por parte da oposição. Ao longo da campanha, entretanto, teve evento de apoio à sua chapa com a presença do tio e outros políticos da sigla em Mogi das Cruzes.
Em 2021, Patricia Vanzolini, atual presidente, defendia a bandeira da diversidade, pauta sobre a qual outras duas chapas buscam ter protagonismo este ano. Reportagem da Folha mostrou que, ainda assim, a maioria das seis chapas tem um ou nenhum negro na diretoria, que é composta por cinco integrantes.
Carlos Kauffmann tem como vice a professora e doutora em direitos humanos Lucineia Rosa, que estava entre as advogadas negras cotadas para a vaga da ministra Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal. E fez composição com o grupo da advogada Luanda Pires, que antes tentou articular uma chapa formada por pessoas negras, periféricas e LGBTQIA+.
O advogado Renato Ribeiro de Almeida, especialista em direito eleitoral, busca destacar que a sua é a única chapa com três mulheres negras na diretoria e afirma representar o interior do estado. Ele é conselheiro do Instituto Luiz Gama, que tem ao menos outros três membros com cargos de destaque na composição.
O advogado Paulo Quissi, que está em seu terceiro mandato como presidente da OAB de Carapicuíba e fundou a Associação dos Advogados Empreendedores, busca se contrapor aos demais candidatos, que ele liga a um perfil mais elitista e distante da realidade da maior parte da advocacia.
Depois de ter tido duas candidatas em 2021, ano em que foi eleita a primeira mulher para o comando da OAB-SP em mais de 90 anos de história, há apenas homens encabeçando as chapas este ano.
Apesar de não tentar a reeleição para presidente, Patricia Vanzolini tem aparecido com grande destaque nos materiais de campanha da situação, muitas vezes com mais destaque que a vice.
Ela mobilizou ao longo de sua gestão a pauta da diversidade, com destaque para as listas de indicação da advocacia para tribunais (o chamado quinto constitucional) com paridade de gênero e cotas raciais de 30%.
Um vídeo de apoio publicado por Caio no perfil dele dá uma mostra do tipo de crítica que é feita a essas bandeiras de diversidade. Na filmagem, o presidente da União Brasileira dos Juristas Católicos diz que a OAB teria se tornado “lugar de pautas identitárias e ideologizado”.
Além do voto para a seccional, advogados também devem escolher a chapa de sua subseção, que é composta por cinco membros. Com 386 grupos inscritos, pouco mais da metade das 257 subseções do estado têm apenas um concorrendo.
RENATA GALF E ARTHUR GUIMARÃES / Folhapress