Num universo com cerca de sete mil estudantes do nono ano do ensino fundamental e idade entre 13 e 15 anos, mais de 80% já consumiram algum tipo de substância psicoativa, revela pesquisa da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP.
O estudo está entre os dez classificados pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC – Education For Justice) e pela Sociedade Internacional de Criminologia (ISC) para ser premiado durante o 19º World Congress of Criminology que acontecerá no mês de outubro em Doha, no Qatar.
Segundo os pesquisadores, é muito comum adolescentes experimentarem essas substâncias nesta fase. Porém, destacam, há preocupação com jovens que, além de consumirem mais frequentemente e em maior quantidade, apresentam problemas de saúde física e mental e estiveram envolvidos em casos de violência física e sexual.
O trabalho “Uso de substância e envolvimento em situações de violência: um estudo tipológico em amostra brasileira”, do Grupo de Estudos e Pesquisa em Desenvolvimento e Intervenção Psicossocial (GEPDIP) foi feito a partir da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar realizada pelo IBGE em parceria com os Ministérios da Saúde e da Educação em 2015. Essa pesquisa contou com a participação de mais de 100 mil alunos brasileiros do nono ano de escolas públicas e privadas de áreas urbanas e rurais em todo o País.
Essa é a primeira vez que a Pesquisa Nacional é analisada de forma sistemática, levando em consideração o envolvimento dos adolescentes com casos de violência e problemas da saúde.
“Nós trabalhamos com uma subamostra de 6.702 adolescentes que responderam todas as questões relacionadas ao uso de substâncias”, revela o psicólogo André Vilela Komatsu, um dos autores da pesquisa.
Os estudantes foram classificados em cinco grupos, abstencionistas, experimentadores de álcool, usuários de drogas convencionais, usuários de múltiplas substâncias e usuários de drogas pesadas.
Os dois grupos com menor uso de substâncias foram os que apresentaram menos problemas de saúde e envolvimento em violência; este é o caso dos abstencionistas, 18% dos alunos que não consomem nenhum tipo de substância, e também dos experimentadores de álcool, 26%, que em geral fizeram uso apenas de álcool.
Em contrapartida, usuários de drogas convencionais, que utilizam ou álcool e tabaco ou álcool e maconha, 28%, e os que consomem múltiplas substâncias, álcool, tabaco e maconha, 23%, estiveram envolvidos em casos de violência, mas não apresentaram nenhum tipo de problema de saúde.
Risco pessoal e social
A pesquisa revelou que 5% são usuários de drogas pesadas. Eles consomem álcool, tabaco, maconha e crack com frequência e de forma acentuada, apresentando maior prevalência de problemas de saúde física e mental que os demais grupos. Além disso, estiveram envolvidos em casos de violência com maior frequência, inclusive em casos de vitimização por abuso sexual.
Segundo o psicólogo André Vilela Komatsu, o caso desses 5% de jovens é preocupante, pois além do consumo não ser apenas experimental, como é o caso dos outros alunos, as dificuldades que podem desenvolver durante essa fase impactam de forma negativa no próprio desenvolvimento. “São questões que se não forem resolvidas agora, vão custar muito mais caro lá na frente, tanto para os jovens quanto para a sociedade”.
Para o psicólogo, uma das soluções é criar mecanismos capazes de identificar a problemática já em seus primeiros sinais, através da capacitação da equipe escolar para “escutas acolhedoras, rastreamento de problemas relacionados ao abuso de substâncias e para violência contra crianças e adolescentes”.
Komatsu afirma ainda que outro ponto a ser explorado é o aumento de oportunidades de lazer e cultura. Diz que, se os jovens tiverem opção de atividades estimulantes para a fase de desenvolvimento em que se encontram, ‘‘tenderão a investir mais tempo nessas atividades e, consequentemente, irão se expor menos a situações de risco para se envolverem com atividades ilícitas”.