Uma organização social atuante no município de São João da Boa Vista, no interior de São Paulo, é investigada pela suspeita de ter desviado cerca de R$ 50 milhões em verbas públicas destinadas à saúde, incluindo 14 milhões de origem federal.
Na terça-feira (3), em ação da Polícia Federal com a CGU (Controladoria Geral da União), foram cumpridos 13 mandados de busca e apreensão para pessoas físicas e jurídicas de dez cidades paulistas. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF) também autorizou um pedido de prisão internacional para o chefe do esquema, residente em Portugal.
A suposta quadrilha da OSS de Saúde Instituto Dra. Rita Lobato (IDRL) teria representantes em Barretos, Bragança Paulista, Franco da Rocha, Mairiporã, Mogi das Cruzes, Santo André, São Bernardo do Campo, São João da Boa Vista, São Paulo e Sorocaba.
Em declaração à imprensa, a prefeita Maria Teresinha de Jesus Pedroza (PL), de São João da Boa Vista, afirmou que ela e a gestão municipal não estão sendo investigadas.
De acordo com nota oficial, a administração do município tem colaborado com a polícia e determinou intervenção administrativa no contrato “tão logo constatou irregularidades na prestação de contas”. Também teria tomado “todas as medidas jurídicas cabíveis para resguardar o erário” público. O site da OSS está fora de serviço e, até a publicação da reportagem, a entidade não retornou o contato da Folha.
A ação foi batizada de “Quarto Elemento” pela suspeita de subcontratação de terceirizados para aplicação do esquema. Cerca de 70 servidores foram mobilizados para o cumprimento de ordens judiciais.
Em nota, a polícia informou que teve “por objetivo apurar práticas ilegais envolvendo a gestão de recursos públicos na execução de convênio” celebrado entre a Prefeitura e a OSS em abril de 2022.
A OSS se constituía como entidade de direito privado sem fins lucrativos e geria unidades de saúde na cidade. Os indícios colhidos pela polícia, contudo, apontam desvios de recursos por meio da subcontratação de empresas para supostos fornecimentos de produtos e serviços à organização.
“Também foram constatadas transferências de elevados valores das contas da organização social e das empresas subcontratadas para contas correntes do principal investigado, de seus familiares e de pessoas sob sua forte influência”, diz o documento.
Os investigados nos registros encontrados “figuram ora como sócios, ora como empregados, ora como gestores dessas empresas subcontratadas ou da principal organização social investigada.”
Além de provas do desvio, os agentes buscaram também apurar “possíveis práticas de lavagem de dinheiro relacionadas à aquisição e emplacamento de veículos de luxo e aquisição de imóveis de alto padrão em nome de pessoas integrantes do núcleo familiar do líder da organização.”
Bloqueio de contas
O TRF determinou ainda o sequestro de bens e bloqueio de valores no montante de R$ 20 milhões contra pessoas físicas e jurídicas investigadas. A prisão temporária do líder do esquema foi determinada após mostras de que ele dispunha de “elevado padrão de vida”, ostentado em redes sociais.
Os investigados poderão responder pelos crimes de organização criminosa, peculato e ocultação de capitais (lavagem de dinheiro). As penas somadas passam de 35 anos de prisão.
A prefeita Pedroza declarou ainda que “a Polícia Federal esteve no gabinete para realizar diligências e averiguar documentações referentes a processos licitatórios, com o objetivo de auxiliar nas investigações” e que o município segue à disposição das autoridades competentes para “o completo esclarecimento dos fatos.”
No Instagram, o IDRL se define como OSS “filantrópica do terceiro setor, sem fins lucrativos.” Em sua última postagem, datada de 13 de janeiro de 2023, o instituto afirma que seu trabalho é proporcionar vantagens relacionadas à “qualidade dos serviços” em saúde municipais.
A proposta seria oferecer um processo “eficiente e transparente”, com flexibilidade “na gestão, inovação e maior controle social”, bem como otimização de “custos” de gestão. O nome da OSS faz referência à Rita Lobato Velho, primeira mulher a se formar médica no Brasil, e a segunda na América Latina.
DANIELLE CASTRO / Folhapress