Quadro sem tinta: Morreu em Ribeirão Preto, Paulo Camargo, um dos maiores ícones da moderna pintura brasileira

Autodidata, aprendeu desenhar anatomia vendo-se no espelho

Foto: Arte&Cultura

Na manhã deste domingo (5), a cidade de Ribeirão Preto acordou com uma triste notícia: o passamento de Paulo Camargo, um dos maiores nomes da moderna pintura brasileira. Nascido na cidade de Anhembi, no ano de 1944, foi em Ribeirão que Paulo deixou florescer a sua brilhante carreira, reconhecida nacional e internacionalmente.

O Portal da Thathi reproduz um texto de apresentação da publicação do livro Paulinho Pintor, no ano de 2001, escrito por José Fernando Chiavenato, jornalista e colunista deste Portal:

“A obra relata a trajetória de vida e analisa algumas obras do pintor Paulo Camargo, radicado em Ribeirão Preto. Um resumo de sua vida é que nasceu na cidade paulista de Anhembi. Ainda na infância morou em Rio das Pedras. Viveu uma infância conturbada desde o abandono paterno, o que lhe marcou profundamente, dando-lhe a diretriz de seu trabalho. Aos 17 anos foi morar em Belo Horizonte, onde foi revelado o seu talento para o desenho, vivendo como pintor de tudo: paredes, murais de padaria, painéis de estradas e cartazes.

Autodidata, aprendeu desenhar anatomia vendo-se no espelho. Ano seguinte, já estava em Ribeirão Preto, apresentando-se para estudar na Escola de Artes do Bosque Municipal. Foi aconselhado pelo então responsável, Antonio Palocci a ir em frente, pois desenhava melhor que os professores. Foi influenciado pelos “malditos” Van Gogh, Gaughin e Toulouse-Lautrec. Via e revia as reproduções de suas telas. Leu tudo sobre eles e suas técnicas. A par disso, leu Sartre e Marx. De todas essas leituras, resultou o seu estilo próprio.

Decidiu fazer um trabalho artístico que não só representasse a pobreza e as injustiças sociais, mas que fosse dirigido aos pobres. Seu traço é moderno, com excelente técnica. Seus quadros refletem criaturas humanas, sempre às voltas com dramas interiores. Destaque para “Os Cavaleiros do Apocalipse”, “Dom Quixote”, “João Batista”, “A guerra”, “O Começo e o Fim da Vida” e “Os Amantes”. O crítico Mário Schenberg disse que “as figuras dolorosas de Paulo Camargo não são vítimas indefesas, mas lutadores tenazes sofrendo, seguros de sua grandeza” .

Em razão dos temas e da forma como apresenta as figuras, denunciando a miséria humana, foi considerado um pintor “engajado”, revoltado com o “status quo” e, em razão disso sofreu perseguições após 64, tornando-se, como os seus inspiradores, também um pintor “maldito”. Sobre o seu processo de trabalho, explica que uma imagem é criada em sua cabeça. Convive com ela, mentalmente, por um mês, ou dois. Depois, faz um bosquejo no papel, a carvão ou lápis. Modifica, amplia, corta e acrescenta cenas, até fazer um escorço, que é o plano da obra. Aí decide o tamanho da tela, estica o tecido, faz a armação de madeira. Compra tintas e pincéis. Em seguida, faz a base, o “fundo” da tela. Peneira serragem sobre a tela e tinta, uma dez demãos. Na sequência, copia o escorço do papel para a tela grande. Aplica a tinta e vai dando forma ao quadro. Diz que só para fazer o fundo de um quadro gasta uma semana, isto se o tempo estiver seco. Trabalha direto, de 14 a 16 horas por dia. Em um mês, mais ou menos, conclui um quadro de 1,70 por 1 metro. Ao cabo desse trabalho, guarda o quadro, espera ter um número razoável e tenta conseguir um local para expor.”

Paulo Camargo será velado nesta segunda-feira (6), no Memorial Campos Elíseos, Sala Ametista, a partir das 10h.  O sepultamento está previsto para às 16h.

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