Sem autorização da prefeitura de Ribeirão Preto, a empresa Botafogo Futebol SA (BFSA) ocupou, fechou ao tráfego e construiu, irregularmente, em uma rua, portanto área pública, localizada em frente à Arena Eurobike. A informação é da prefeitura da cidade, fornecida pelo secretário do Planejamento, Edson Ortega, depois de investigação exclusiva conduzida pelo Portal do Grupo Thathi de Comunicação.
O espaço, segundo apuração da Thathi, já foi utilizado em eventos negociados pela BFSA, no mercado, por valores de R$ 20 mil por dia. A prefeitura já notificou a empresa sobre a situação irregular.
Denominada Edgard Rodrigues, a rua ocupada liga a praça Valter Strambi, em frente aos portões principais de entrada do estádio Santa Cruz, à avenida Ovídeo José de Faria, e passa defronte aos recém construídos bares da Arena Eurobike. No local, geralmente interditado por cavaletes, há a presença de seguranças, que impedem o tráfego de veículos.
A reportagem do Portal do Grupo Thathi descobriu, ainda, que a BFSA cobra, em preço de tabela, R$ 20 mil para alugar o que ela chama de “Boulevard”, espaço que fica ao lado da rua. Na prática, entretanto, a divisão entre rua e o espaço é basicamente feita por uma linha no chão. Houve, inclusive, a retirada das guias, de forma que o espaço, na prática, está interligado à via pública, como se um só fosse. Em alguns dos eventos realizados no local, houve utilização não só desse espaço como da própria rua, para fins particulares.
Há, ainda, na entrada da avenida Ovídeo José de Faria, barreiras que não só impedem o tráfego pelo local como direcionam os veículos para o estacionamento particular, que foi construído em uma área do banco Axial e operado hoje pela Trexx, empresa de Adalberto Baptista, sócio da BFSA.
De acordo com Edson Ortega, secretário do Planejamento, informou que tais situações são irregulares. “A área é cadastrada como via pública, e não pode ser utilizada permanentemente e com exclusividade por particulares. O Botafogo já foi notificado e uma reunião foi marcada para 3 de março para que eles forneçam as devidas explicações”, informou.
Multa e ressarcimento
Com o fechamento da rua, a empesa BFSA impede o acesso de carros, que poderiam, inclusive, estacionar na área que fica em frente aos bares. Vale lembrar que, em frente à rua, funciona um estacionamento privado, operado pela Trexx Empreendimentos, empresa de Adalberto Baptista, investidor na BFSA.
Juristas ouvidos pelo Grupo Thathi acreditam que, por conta da situação, a empresa pode ter que pagar multa por utilizar a área pública, independente de cobrar ou não aluguel pelo uso do espaço.
“A rua é um bem público de uso comum. Pode até ser cedida para uso particular, mas não pode ser terceirizada. E, se for o caso, o poder público pode exigir compensação financeira, dependendo do caso”, informou Thiago Marrara, especialista em direito administrativo e professor da Universidade de São Paulo (USP).
Também especialista em direito administrativo, Gustavo Bugalho avalia ainda que a BFSA pode ser condenada ao pagamento de multa. “É possível que a prefeitura obrigue à demolição de eventual benfeitoria que tenha sido feita, além da retomada do lugar e a eventual imposição de multa à entidade responsável, no caso a BFSA”, informou.
Sem crime
O professor de direito penal Daniel Pacheco, também da USP, acredita que, embora um delito administrativo tenha sido praticado, se provado, a situação não deve ensejar ação criminal contra os dirigentes da BFSA, no caso Gérson Engrácia Garcia, presidente da BFSA, e Adalberto Baptista, presidente do Conselho de Administração.
Já a Prefeitura de Ribeirão pode ser responsabilizada por permitir que a área pública fosse ocupada irregularmente pela empresa.
“Não se pode impedir o tráfego de veículos pela rua. A tendência é que o Ministério Público aja e mande abrir ao tráfego. Por fechar a rua, especificamente, não há um tipo penal, mas pode haver crimes de outra natureza. Caso alguém seja impedido de entrar na área, há constrangimento ilegal. Pode acontecer, ainda, o crime cometido pelas autoridades, se por acaso fizeram vista grossa, num caso de prevaricação, ou até corrupção passiva, se houve recebimento de alguma vantagem”, disse.
Apuração
A reportagem do Grupo Thathi comunicou a prefeitura da situação em 5 de fevereiro de 2020. Não obteve resposta oficial até o presente momento. Em contato com o secretário Edson Ortega, do Planejamento, entretanto, foi informada que área é efetivamente pública e que a diretoria do Botafogo Futebol SA foi notificada, antes que a resposta fosse enviada ao Grupo Thathi, para explicar o uso particular da área pública.
A BFSA informou, entretanto, que o a área alugada não é da rua, e sim uma área que fica entre a rua e o estacionamento particular explorado por Baptista. O Grupo Thathi confirmou, entretanto, que pelo menos um evento comercializado pela BFSA foi realizado no leito da rua.
Outro lado
Procurada, a Botafogo Futebol S/A informou que “a utilização da Rua Edgard Rodrigues vem sendo objeto de discussão com a Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto”. A empresa ressaltou ainda que “não considera a Rua Edgard Rodrigues uma das áreas sobre as quais expõe direitos para alugar”.
Questionada sobre o fato de a área constar de material comercial disponibilizado ao mercado pela BFSA, e sobre o fato de já ter alugado, para ao menos uma empresa, o mesmo espaço, segundo apuração do Grupo Thathi, a empresa limitou-se a informar que a área “não consta na tabela e não houve qualquer aluguel nesse sentido”.
A empresa admitiu, entretanto, que “existe cobrança pela utilização das áreas e locais em que a Botafogo Futebol S/A tem posse, seja por cessão de uso da superfície ou por locação”. Informou, ainda, que “não ocupa ilegalmente a Rua Edgard Rodrigues e nem cobra estacionamento em sua extensão”.