Governo lança programa de distribuição gratuita de absorventes pelo SUS

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O Ministério da Saúde informou hoje (8) que vai assegurar a oferta de absorventes pelo Sistema Único de Saúde (SUS), com foco na população que está abaixo da linha da pobreza. O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, assinou nesta quarta-feira um decreto que cria o Programa de Proteção e Promoção da Dignidade Menstrual.

Segundo o ministério, cerca de 8 milhões de pessoas serão beneficiadas pela iniciativa, que prevê investimento de R$ 418 milhões por ano.

A nova política segue os critérios do Programa Bolsa Família, incluindo estudantes de baixa renda matriculados em escolas públicas, pessoas em situação de rua ou de vulnerabilidade social extrema.

Também serão atendidas pessoas em situação de privação de liberdade e que cumprem medidas socioeducativas. O ministério acrescenta que o programa, voltado a todas as pessoas que menstruam, alcançará mulheres cisgênero, homens trans, pessoas transmasculinas, pessoas não binárias e intersexo.

De acordo com Ana Nery Lima, especialista em gênero e inclusão na ONG Plan International Brasil, que promove os direitos das crianças e a igualdade para meninas, é urgente pensar em ações e políticas públicas que garantam que meninas, mulheres e pessoas que menstruam tenham acesso a condições dignas de gerenciamento do seu ciclo menstrual.

“Por isso, medidas como a anunciada hoje são tão importantes para garantir a distribuição de absorventes para os públicos que convivem com a pobreza menstrual, para conseguirem, minimamente, conviver com dignidade”, disse.

A Organização das Nações Unidas (ONU) considera o acesso à higiene menstrual um direito, que deve ser tratado como uma questão de saúde pública. Ana Nery acredita que, no entanto, o Brasil está longe do cenário ideal.

“No país, uma em cada quatro adolescentes não possui um absorvente durante seu período menstrual e isso afeta diretamente suas vidas. A dignidade menstrual diz respeito à dignidade humana, já que quando as pessoas acessam instalações e insumos seguros e eficazes para administrar sua higiene menstrual são capazes de administrar sua menstruação com dignidade”, explicou.

Medida vetada

No Estado de São Paulo, o governador Tarcísio de Freitas vetou o projeto de lei que previa a distribuição de absorventes gratuitos em escolas, presídios e para mulheres em situação de vulnerabilidade no estado paulista.

O projeto de lei (PL) Menstruação sem Tabu, PL 1177, de 2019, foi proposto pela bancada feminina da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) e aprovado no final do ano passado.

“O PL buscava acesso a absorventes higiênicos não só em lugares públicos, mas onde realmente precisam estar. A falta de informação e de recursos para enfrentar a menstruação pode causar traumas e constrangimentos desnecessários, e é por isso que esse projeto era tão essencial”, apontou em nota a deputada estadual Marina Helou.

A proposta ampliava o impacto da política pública que existia parcialmente com a distribuição de absorventes em escolas do estado. Esse foi um dos argumentos para o veto do governo estadual.

“O Programa Dignidade Íntima também promove a formação dos profissionais da escola e estudantes a respeito da pobreza menstrual e saúde da mulher, assim como o acesso à informação sobre e higiene menstrual, por meio de ações ou campanhas educativas”, diz o texto do veto.

A justificativa do governo, publicada no Diário Oficial, também pontua que o projeto prevê a adoção de mecanismos de renúncia fiscal pelo estado, para redução do preço dos absorventes higiênicos aos consumidores finais, mas não foi feita a estimativa do impacto orçamentário e financeiro decorrente da medida.

A especialista em gênero e inclusão na ONG Plan International Brasil, Ana Nery Lima, pontua que a proporção da magnitude do Estado de São Paulo no território brasileiro faz com que o desafio relacionado à pobreza menstrual seja grande. “Embora tenhamos avanços em diversas áreas no que se refere a políticas públicas de qualidade precisamos olhar com mais atenção para essa questão”.

“A pobreza menstrual se compreende pela falta de recursos básicos (absorventes ou coletores menstruais, sabonetes, água, papel higiênico, etc), infraestrutura adequada (banheiros seguros e bem conservados e conhecimento (quebra de tabus e preconceitos sobre o tema) para que meninas, mulheres e pessoas que menstruam tenham plena capacidade fazer um gerenciamento adequado de sua menstruação”, acrescentou.

De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), uma entre dez estudantes no mundo tem dificuldades para manter a higiene íntima, com impactos importantes na vida escolar. Além disso, pelo menos 500 milhões de meninas e mulheres no mundo não conseguem ter um período menstrual seguro e higiênicos por falta de apoio e recursos.

Cálculo 

A especialista em gênero e inclusão na ONG Plan International Brasil, Ana Nery Lima, fez as contas para saber o quanto as meninas e mulheres gastam com higiene menstrual. “Temos 60 milhões de meninas e mulheres no Brasil menstruando, ou seja, 30% da população; 1 milhão de brasileiras vivem em residências sem banheiro. Estima-se que uma mulher gaste entre R$ 3 mil e R$ 8 mil ao longo de sua vida menstrual com absorventes”.

Ela complementa a conta dizendo que 11% das mulheres com mais de 80 anos não têm acesso à rede geral de distribuição de água, violação que se agrava progressivamente para as mais jovens até chegar a 17% entre as meninas com até 19 anos. “O Brasil tem hoje cerca de 7,5 milhões de meninas nessa condição – meninas que menstruam na escola. Quase 90% delas frequentam a rede pública de ensino. É preciso garantir que meninas, mulheres e pessoas que menstruam estão em São Paulo, assim como em todo país, possuam condições de dignas de acesso a políticas básicas para deixarem de conviver em situação de pobreza menstrua”, protestou.

Ministério Público

Nesta semana, o Ministério Público Federal (MPF) reforçou um pedido na Justiça para que a União apresentasse plano de distribuição de absorventes a estudantes de baixa renda da rede pública, a mulheres em situação de vulnerabilidade social extrema, a detentas e a jovens em conflito com a lei internadas.

A distribuição é garantida pela Lei Federal 14.214 de 2021, mas o governo anterior foi contra a política. O texto, aprovado pelo Senado em setembro de 2021, foi sancionado pelo então presidente da República Jair Bolsonaro que, no entanto, vetou a distribuição gratuita dos absorventes.

O veto presidencial foi derrubado em março do ano seguinte pelo Congresso Nacional. No mesmo mês, Bolsonaro decidiu regulamentar a distribuição. Em novembro, o Ministério da Saúde lançou o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, com a promessa de atender a 4 milhões de mulheres.

Em outubro, a organização não governamental (ONG) Criola havia entrado com ação na Justiça Federal, pedindo que o governo federal apresentasse, em 15 dias, os planos para distribuição dos absorventes.

“A ideia era desenvolver essa política o mais rápido possível, com a urgência [de] que ela necessitava, visto que as pessoas que serão beneficiadas desta política são pessoas em situação de vulnerabilidade”, lembrou a coordenadora-geral da ONG Criola, Lúcia Xavier.

*Contém conteúdo da Agência Brasil, e da Rádio Nacional; entrevista com a Plan International à TV Thathi SBT 

Edição: Nayara Francesco

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