O Parlamento Italiano aprovou por unanimidade a introdução do crime de feminicídio em seu Código Penal, com previsão de pena de prisão perpétua. A aprovação, simbólica e poderosa, ocorreu no Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres. O novo artigo tipifica o feminicídio como o ato de “provocar a morte de uma mulher” através de “atos de discriminação, ódio ou prevaricação, ou através de atos de controle, posse ou domínio sobre a vítima enquanto mulher”.
A unanimidade da votação parece ser o resultado de um olhar atento à barbárie. Afinal, a tragédia dos assassinatos de mulheres não é exclusiva da sociedade italiana. Em todo o mundo, assistimos a um crescente discurso de ódio que se reflete em números cada vez maiores de violências, estupros e feminicídios.
Os números mostram que as vidas de inúmeras mulheres são interrompidas no momento em que desafiam viver com a liberdade que lhes é de direito. O que presenciamos não é um crime individualizado. A violência de gênero é um fenômeno coletivo, sistemático e estrutural: um instrumento de controle sobre o corpo feminino que reafirma a submissão ao patriarcado.
No Brasil, o cenário é de urgência. Dezesseis mulheres são agredidas a cada hora e em um dos países que mais mata, não se pode falar em casos isolados, mas em um projeto de controle e extermínio. Os detalhes chocam: na última semana, uma mulher teve as pernas amputadas após ser atropelada e arrastada pelo ex-marido, já na Zona Leste de São Paulo, uma mulher foi esfaqueada também pelo ex-marido no centro de acolhimento, onde buscava ajuda.Todos esses atos, distintos em suas circunstâncias, possuem uma raiz comum: a recusa à autonomia feminina, uma insistência em controlar a vida dessas mulheres, sejam elas quem forem, em qualquer idade, raça ou etnia.
E diante de um congresso que trabalha contra os direitos femininos, que buscam diariamente formas de legitimar a violência contra seus corpos, a ação do Parlamento italiano surge como um respiro de esperança e um espelho moral a ser seguido. E enquanto na Itália a lei endurece, punindo o feminicídio com a pena máxima, no Brasil assistimos à manifestações que clamam pela vida. A reação a essas barbáries tem sido intensa: as mulheres estão exaustas de viver sob o medo eterno e sendo forçadas a ver seus agressores saírem impunes pela porta da frente das delegacias.
A Ministra Cármen Lúcia resume a urgência: “É preciso que nós, enquanto sociedade, atuemos juntos para promover uma educação capaz de mudar, de forma mais profunda, essa cultura brasileira de violências, especialmente contra as mulheres, que acaba explodindo neste quadro de barbárie que estamos vivendo”.
A decisão histórica do Parlamento italiano é uma vitória crucial da civilidade, que manda um recado claro de que o Estado não tolerará mais o feminicídio. É um passo gigante que, com a rigidez da lei, tenta proteger essas vidas da estrutura do ódio. No entanto, a lei sozinha não basta. Ela é o freio de emergência, mas a solução definitiva está na raiz da nossa sociedade: na urgência da educação anti machista, na forma como socializamos e ensinamos nossos meninos a desafiar e questionar as expectativas de gêneros e na luta intransigente contra a proliferação de ideologias tóxicas de dominação.
Enquanto eles querem mulheres caladas, sozinhas e dominadas, a resposta deve ser oposta, mulheres cada vez mais unidas, fortalecidas e em movimento. A chama da esperança não está apagada. Enquanto houver mulher viva, seguimos lutando.



