O Tribunal Regional Federal determinou, dia 18 de agosto de 2025, que o Google implemente, no prazo de 60 dias, novas medidas no YouTube para coibir práticas de publicidade consideradas abusivas envolvendo crianças. A decisão atende parcialmente a um pedido do Ministério Público Federal (MPF) de 2016, que ganhou força após a publicação de um vídeo do influenciador Felca sobre adultização nas redes sociais.
Publicado em 8 de agosto, o vídeo expõe o modus operandi de responsáveis por mini influenciadores que exploram a imagem de crianças em busca de engajamento e lucro. Com a presença de uma psicóloga, Felca ainda levanta o debate de como a adultização pode contribuir para que essas crianças se tornem adultos disfuncionais. A denúncia evidencia não apenas a responsabilidade dos responsáveis legais, mas também a das plataformas que permitem, e lucram, com esse tipo de exploração.
Segundo especialistas, os algoritmos analisam métricas de navegação dos usuários, como tempo de retenção, curtidas e comentários, e passam a recomendar vídeos com características semelhantes aos que despertaram interesse anteriormente. Esse ciclo cria um mecanismo de incentivo: quanto mais engajamento, maior a monetização, mais publicidade e, consequentemente, mais exploração de conteúdo. Assim, produções criadas com um propósito específico acabam chegando a públicos totalmente diferentes, enquanto a lógica algorítmica segue reforçando comportamentos prejudiciais sem qualquer responsabilidade pelo impacto sobre as crianças.
Na decisão do TRF sobre o Google, o juiz federal Gláucio Maciel entendeu que não se trata de impor controle prévio sobre os conteúdos publicados por usuários em plataformas do Google, mas de criar mecanismos de alerta e denúncia visando proteger as crianças. A empresa terá 60 dias para implementar um aviso visual ostensivo na página inicial do YouTube, ou em todos os vídeos, informando sobre a proibição de publicidade protagonizada por crianças ou direcionada ao público infantil, além de criar um campo específico na página de denúncias para esse tipo de caso
A decisão chega em um momento importante, quando o Brasil dá novos passos na regulação do ambiente digital voltado a menores. Sancionada em 17 de setembro, a Lei 15.211/25, conhecida como ECA Digital, representa um avanço significativo na proteção dos direitos de crianças e adolescentes online. Inspirada no Estatuto da Criança e do Adolescente, a legislação impõe uma série de obrigações a empresas de tecnologia, desenvolvedores de aplicativos e provedores de serviços digitais.
A nova lei exige que as plataformas disponibilizem ferramentas eficazes e de fácil acesso, em português, que permitam aos pais e responsáveis controlar compras, configurações e tempo de tela. Além disso, as empresas devem remover e reportar às autoridades conteúdos com indícios de exploração, abuso sexual, sequestro ou aliciamento de menores, e estão proibidas de tratar dados pessoais de crianças e adolescentes com a finalidade de publicidade direcionada.
Essa mobilização do Estado brasileiro busca impedir que crianças sejam exploradas diante das câmeras quando deveriam estar protegidas longe delas. Em um contexto em que a infância é constantemente ameaçada e a internet opera em uma “zona cinzenta” da lei, decisões judiciais e legislações específicas representam passos fundamentais para trazer mais segurança a esse ambiente. Combater a exploração infantil na internet significa enfrentar não apenas os produtores de conteúdo, mas também as empresas que lucram com isso e que, por isso, devem ser responsabilizadas.
Embora o desafio seja grande, decisões como essa mostram que a sociedade começa a se mover para proteger aquilo que tem de mais valioso: a infância. A criação de mecanismos de denúncia, a regulamentação das plataformas e a responsabilização das empresas representam não só avanços legais, mas também um sinal de que a infância pode voltar a ser sinônimo de cuidado, brincadeira e liberdade, mesmo em um mundo cada vez mais digital. Proteger crianças e adolescentes no mundo online é tão importante quanto fazê-lo no mundo físico.



