Estreia: “Deu Preguiça” – A beleza de viver o presente

Fabrício Correia
Fabrício Correia
Fabrício Correia é jornalista, escritor, professor universitário, especialista em Acessibilidade, Diversidade e Inclusão. É crítico de cinema, membro da Academia Brasileira de Cinema e apresenta o programa “Vale Night” na TV Thathi SBT.
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Deu Preguiça” chega sem grande alarde, mas traz uma mensagem que reverbera além da tela. Em um mercado saturado por narrativas aceleradas, a animação australiana dirigida por Tania Vincent e Ricard Cussó aposta em um ritmo mais contemplativo.

A trama acompanha a família Flores, um grupo de preguiças forçado a trocar a tranquilidade do interior pelo caos urbano. Para manter suas raízes, apostam em um food truck e em um livro de receitas familiares. A chegada de Dotti, uma empreendedora do ramo de fast food, ameaça não apenas o novo negócio, mas a própria união da família.

O filme propõe uma reflexão sobre a necessidade de adaptação sem perder a identidade. Em vez da habitual corrida contra o tempo, a grande questão aqui é se ainda há espaço para quem se move devagar. A narrativa respeita essa ideia, evitando pressa nos momentos emocionais e mantendo um fluxo coerente com seus protagonistas.

O embate entre slow food e fast food funciona como metáfora para os tempos modernos. “Deu Preguiça” critica, de forma sutil, a sociedade imediatista, onde tradição muitas vezes é vista como obstáculo ao progresso. A abordagem evita o tom panfletário e constrói um dilema legítimo, equilibrando modernidade e herança cultural.

Os personagens são um dos pontos altos. Gabriella, a matriarca, sustenta as cenas emocionais sem perder o tom leve da animação. Laura, sua filha, representa a ponte entre gerações, buscando inovação sem abrir mão do passado. Dotti, a antagonista, foge do clichê maniqueísta e tem motivações compreensíveis, o que enriquece o conflito.

A estética reforça o conceito do filme. A animação é fluida, os personagens carismáticos e os cenários contrastam bem a calmaria do interior com o ritmo frenético da cidade. A paleta de cores e a trilha sonora, com influências latinas, complementam a experiência. A dublagem brasileira, com Heloísa Périssé e sua filha Tontom nos papéis principais, dá autenticidade ao relacionamento das protagonistas.

A força de “Deu Preguiça” está na simplicidade com que transmite uma mensagem poderosa. Enquanto o entretenimento privilegia velocidade e reviravoltas, o filme celebra a paciência e o cuidado nos processos. Isso pode desagradar espectadores que buscam ação frenética, mas a escolha narrativa está alinhada ao tema central.

O resultado é uma obra que equilibra leveza e profundidade, sem a necessidade de clímax grandioso. Em um mundo que exige pressa, “Deu Preguiça” lembra a importância de desacelerar e valorizar o tempo das coisas.

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