Basta o tempo esfriar para que a fome aumente, a disposição desapareça, a roupa fique mais apertada e já surja aquela preocupação que atormenta: o medo de ganhar peso.
Nosso organismo pede mais energia nos dias frios — ele quer comida quentinha, conforto, aconchego. Além disso, o frio ativa regiões do cérebro ligadas à busca por bem-estar. E isso nos faz desejar alimentos que aquecem não só o corpo, mas também a memória e o afeto.
Comer mais, portanto, é um processo natural de sobrevivência humana em tempos de baixas temperaturas.
O que não tem sido natural é a culpa que estamos sentindo e o excesso de julgamento que fazemos sobre o nosso comportamento alimentar e sobre nossa imagem corporal.
No meu consultório, vejo o tempo todo que na maioria das vezes não é o peso que nos adoece — e sim o olhar duro que lançamos sobre nós mesmas.
Toda vez que nos olhamos com rigidez, que dizemos palavras duras sobre a nossa imagem, que nos enxergamos com raiva no espelho, estamos dando voz a um sistema que lucra muito quando a gente se odeia.
Já passou da hora de mudarmos esse discurso. Mas mudar esse discurso não é só parar de nos criticarmos no espelho. É mais profundo. É sobre reaprender a nos ver com humanidade.
É entender que não somos máquinas de autocontrole, nem vitrines ambulantes para agradar expectativas alheias.
Somos seres humanos com hormônios que oscilam, rotinas exaustivas, noites mal dormidas, medos que ninguém vê e uma pressão constante para sermos produtivos, fortes, leves, bem-sucedidos… tudo junto e misturado.
E, no meio de tudo isso, ainda precisamos lidar com os nossos duros julgamentos por querermos comer um pão quentinho ou por não termos forças para malhar no dia mais frio da semana? Ah, pelo amor de Deus… isso não é autocuidado. Isso é autoexigência das mais duras.
É preciso abrirmos espaço para outra forma de olharmos para nós mesmas. Uma forma mais justa, mais real, mais possível.
Uma forma que não nos condene, mas que nos abrace — exatamente como damos conta de ser hoje.
Mas como se acolher melhor? Por onde começar?
- Reduza o autojulgamento, aumente a curiosidade.
Em vez de pensar “por que comi isso de novo?”, pergunte: “o que eu estava sentindo quando comi?”.
Entender seu comportamento é o primeiro passo para cuidar — e não para punir.
- Movimente o corpo como um ato de carinho, não de dívida.
Sabe aquela frase “tá pago”? Não fale mais isso. Se a academia parece pesada, escolha algo mais leve e possível. Dançar, alongar-se, caminhar no sol da manhã… Qualquer movimento feito com prazer tem mais efeito do que esforço com raiva.
- Planeje o que puder — mas abrace a sua imperfeição.
Fazer uma sopa nutritiva, preparar um chá gostoso ou deixar frutas cortadas à mão já é autocuidado. Não precisa ser “perfeito”, só precisa ser gentil.
- Desconecte-se do ideal, reconecte-se com a realidade.
Evite perfis que te deixam mal.
Siga vozes que falam de corpo real, saúde emocional e verdade.
Você não precisa de mais cobrança — precisa de mais verdade.
- Fale consigo mesma como falaria com uma amiga querida.
Se você não diria a ela “sua preguiçosa, descontrolada, sem foco”, então por que diz isso a si mesma? Gentileza é força.
Você não precisa atravessar o inverno brigando com o seu corpo, nem tentando caber num padrão que nem foi você quem escolheu. Seu corpo muda — e isso é sinal de vida, de adaptação, de saúde. Mas o seu valor, esse permanece. Inteiro. Inabalável.
Que esse seja o inverno em que você se cubra de afeto, se alimente com presença, se mova com liberdade e se olhe com o respeito que merece.
Você não precisa esperar a próxima estação para começar a se amar. Você pode começar hoje. Que tal?



