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Pablo e Luisão: uma comédia onde o Brasil cabe inteiro dentro de um botijão de gás

Fabrício Correia
Fabrício Correia
Fabrício Correia é jornalista, escritor, professor universitário, especialista em Acessibilidade, Diversidade e Inclusão. É crítico de cinema, membro da Academia Brasileira de Cinema e apresenta o programa “Vale Night” na TV Thathi SBT.
FABR

Há séries que divertem. Outras que emocionam. E há Pablo e Luisão, que faz as duas coisas enquanto ferve o arroz na boca do fogão e equilibra a tampa com um chinelo velho. A nova produção da Globoplay é um mapa afetivo do Brasil real, costurado com fiapos de improviso, risadas, aperreios e a mais criativa forma de sobrevivência que já se viu – a do brasileiro que insiste em rir enquanto tudo desaba ao redor.

Luisão (vivido com precisão hilária por Aílton Graça) é o tipo de homem que acredita que fita isolante resolve até casamento. Ele tem um plano para tudo, geralmente errado, mas executado com a convicção dos gênios fracassados. Ao seu lado, Pablo (Otávio Müller) forma uma dupla que lembra uma mistura de Sancho Pança com o primo do conserta-tudo do bairro – os dois se completam no fracasso, e fazem dele um espetáculo.

Mas o palco dessa odisseia tragicômica é a casa de Conceição (Dira Paes), mulher de fibra, paciência e olhos que dizem “não” enquanto já preparam o café pro próximo desastre. E são os filhos – interpretados com carisma por Yves Miguel e João Pedro Martins – que testemunham tudo isso com a inocência de quem ainda acredita que um dia a bicicleta vai ser consertada.

A série, escrita por um time afiado liderado por Paulo Vieira, é construída em episódios curtos, cada um com seu caos próprio. Histórias que parecem piadas contadas na calçada, daquelas que começam com “tu não vai acreditar” e terminam com “e ainda me botaram a culpa!”. E no meio desse festival de absurdos cotidianos, surge o gênio: tudo é verdade. Ou quase. Ou o bastante para que a gente reconheça ali nossos tios, nossos pais, nossos vizinhos – e, principalmente, a nós mesmos.

O Brasil que Pablo e Luisão retratam não aparece nos comerciais de margarina nem nos painéis turísticos. É o Brasil que conserta a antena da TV com cabide, que vai à feira sem saber o que vai comprar, que aposta na quermesse como negócio promissor. É o país onde o improviso não é escolha, mas ferramenta básica de existência. É, em suma, o país que a NASA jamais compreenderia – não por falta de interesse, mas por absoluta incapacidade de processar esse código afetivo de gambiarra, fé e feijoada.

Cada episódio termina com um toque documental: os protagonistas reais, pais e tios de Paulo Vieira, aparecem para comentar os causos, reafirmando que sim, isso tudo aconteceu, e que, se duvidar, tem mais. Esse recurso não apenas confere autenticidade como reafirma o tom da série: rir é uma herança, uma prática doméstica, uma tradição de resistência.

Visualmente, a série não finge sofisticação – ao contrário, abraça o barraco, o quintal de cimento, a televisão antiga e o ventilador fazendo barulho. A trilha sonora brinca entre o brega, o forró, o gospel e o pagodinho de esquina, criando uma atmosfera que não tenta parecer outra coisa: é Brasil do começo ao fim, com orgulho.

E há ainda um mérito raro: Pablo e Luisão atualiza a tradição do humor popular sem cair na caricatura simplória. Está mais próximo de Mazzaropi do que do meme; mais interessado em gente do que em likes. Faz rir porque faz lembrar – da dureza, do afeto, da beleza escondida nos dias difíceis.

No fim, essa série não é apenas para assistir. É para guardar com carinho, como receita de avó, é um lembrete de que ser brasileiro é um exercício permanente de criar sentido no meio do absurdo.

Nota: 4,8/5 – porque 5 seria luxo, e luxo é coisa que Pablo e Luisão desconfiam.

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