SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A maioria dos pais e mães brasileiros tem medo de que seus filhos sejam alvo de bullying na escola, segundo pesquisa Datafolha. A parcela soma 76%, incluindo quem tem muito medo (50%) e quem tem um pouco de medo (26%).
Entre as mães, 65% têm muito medo do bullying contra os filhos, o dobro do registrado entre pais, 32%.
No recorte racial, 65% das pessoas pretas têm muito medo de ver suas crianças nessa situação, ante 49% entre os pardos e 42% entre brancos.
A pesquisa foi realizada entre os dias 5 e 6 de novembro de 2024 e tem um nível de confiança de 95%, com margem de erro geral de três pontos percentuais para mais ou para menos. Com relação à cor, a margem de erro é de cinco pontos percentuais para pretos, quatro para brancos e três para pardos. Foram entrevistados 1.312 pais e mães, em 113 municípios de todas as regiões do país.
A margem é de três pontos entre os que têm filhos, sendo três para pais e quatro para mães. No recorte dos que têm filhos e são pretos, a margem é de sete pontos, de quatro para pardos e cinco para brancos.
Para Odara Philomena, pesquisadora vinculada ao Afro-Cebrap (Núcleo de Pesquisa e Formação em Raça, Gênero e Justiça Racial), o temor tem relação com o crescimento das discussões a respeito do bullying agressões e intimidações constantes a determinado indivíduo, geralmente associadas a características físicas, sotaques ou formas de se portar.
“Não é uma simples brincadeira. Ele atinge o psicossocial da criança e pode afetar o aprendizado e as formas de se relacionar. A preocupação se dá por medo dessa violência”, afirma a especialista, doutoranda em educação pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Segundo a pesquisadora, que prefere analisar os dados a partir da junção entre pretos e pardos, o que justifica a maior preocupação desses pais com as intimidações e perseguições constantes nas escolas é a percepção racial. Ela observa que pais negros podem carregar as próprias experiências ao lidar com os filhos.
“Embora o bullying e o racismo sejam coisas diferentes, o bullying pode partir de questões raciais, e a escola muitas vezes é o primeiro espaço onde crianças vivenciam situações de racismo.”
Ela explica que, enquanto com crianças brancas há uma individualização maior na hora de se colocar apelidos pejorativos, há uma repetição dos termos associados a crianças negras, que geralmente carregam um teor racial.
Já com relação à diferença de preocupação entre mães e pais, a coordenadora de avaliação e gestão de formação na Superintendência de Desenvolvimento de Pessoas da Secretaria de Educação do Rio de Janeiro, Vivian Barros, observa que 49% dos lares no Brasil são chefiados por mulheres, segundo dados do Censo 2022 divulgados IBGE. Outro aspecto tem relação com trabalho de cuidado, realizado majoritariamente pelas mulheres no país.
Ainda de acordo com o Datafolha, no universo de pais e mães brasileiros, 52% dizem que têm medo de que seus filhos sejam discriminados por sua aparência física. Entre as mulheres, 35% dizem ter muito medo disso, ante 19% dos homens.
A taxa de muito medo é mais alta entre pais e mães pretos, o correspondente a 45%, do que na parcela de pardos, que representam 28%, e de brancos, com 18%.
Esse é o maior medo da gestora pública Kelly Baptista, 40, mãe de dois meninos pretos de 6 e 10 anos. “As pessoas criam padrões, e nós, pessoas pretas que não estamos neles, sempre somos discriminados”, afirma.
De acordo com ela, que também tem medo que os filhos sofram bullying ou sejam julgados pelas roupas, o tema já foi assunto de terapia. “Tenho medo de no futuro eles serem abordados violentamente pela polícia, confundidos em algum momento e agredidos, ou até mesmo mortos. Meu medo tem muita base em estatísticas e relatos de amigos.”
O medo de que os filhos sejam discriminados pela maneira como se vestem atinge 46% dos brasileiros, sendo que 25% dos pais e mães têm muito medo desse tipo de discriminação.
Entre pais e mães pretos, 39% têm muito medo, contra 25% entre pardos e 17% na parcela de pessoas brancas. No recorte de gênero, 31% das mães têm muito medo, ante 16% dos pais.
“No caso dos negros, estar um pouco mais bem vestido é um mecanismo para tentar evitar que o racismo perpasse essas crianças”, diz Philomena.
De acordo com Barros, ações preventivas e de tratamento das situações de violência, seja por bullying ou racismo, devem ser coordenadas pelas escolas em conjunto com a comunidade escolar.
Para Philomena, é importante que formas de educação antirracista sejam trabalhadas nesses ambientes. “Precisamos sair do piloto automático do racismo estrutural e repensar nossos processos. É um caminho para diminuir esses temores e, quem sabe, dormirmos mais tranquilos com os nossos filhos.”
PAOLA FERREIRA ROSA / Folhapress