SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Consumir notícias veiculadas pela mídia profissional no Brasil fez as pessoas acreditarem menos em desinformação eleitoral no pleito presidencial de 2022, indica estudo que será publicado na britânica Public Opinion Quarterly.
O artigo “O nexo da desinformação eleitoral: como o consumo de notícias, uso de plataformas e confiança no noticiário influenciam a crença em desinformação eleitoral” monitorou o comportamento online de 2.200 brasileiros e coletou dados sobre o que eles consumiram de conteúdo durante 14 semanas antes, durante e depois das eleições.
Além disso, foram realizadas pesquisas qualitativas, com entrevistas, com os internautas para determinar como diferentes tipos de conteúdo online se relacionaram à crença em desinformação eleitoral em 2022.
O estudo aponta que a exposição a conteúdo de veículos classificados como “mídia tradicional” definidos como aqueles que existiam antes da internet e ocupam um lugar central no ecossistema de mídia do país está associada a níveis mais baixos de crença em desinformação eleitoral. Entre os veículos acessados estavam Folha de S.Paulo, O Estado de S. Paulo, Band, BBC Brasil, CNN Brasil, G1, Gazeta do Povo, Globo, O Globo e Jovem Pan.
Já o uso de conteúdo de veículos de mídia chamados nativos digitais (aqueles que tiveram sua origem online e algumas vezes são abertamente partidários) e das plataformas de internet, como Facebook, X (antigo Twitter), YouTube, Instagram, WhatsApp, Google, Telegram e TikTok, não está associado a nenhuma mudança nas crenças em informações falsas. Entre os nativos digitais acompanhados estavam Brasil 247, Brasil Sem Medo, Diário do Centro do Mundo, Jornal da Cidade Online, Metrópoles e Antagonista.
O artigo é liderado pela brasileira Camila MontAlverne, pesquisadora pós-doutora no Instituto Reuters para o Estudo do Jornalismo, na Universidade de Oxford, em conjunto com Rasmus Kleis Nielsen, diretor do instituto, e outros autores.
“O maior grau de confiança das pessoas nas notícias da mídia tradicional potencializa os efeitos positivos do consumo de conteúdo desses veículos durante a campanha, o que nos permite dizer que acesso à mídia tradicional ajudou a conter os efeitos de desinformação eleitoral”, disse MontAlverne à reportagem.
“Nossas descobertas mostram como o consumo e a confiança em notícias produzidas profissionalmente podem ajudar a proteger o processo eleitoral”, afirma o estudo.
Para selecionar os participantes, os pesquisadores fizeram parceria com a empresa de opinião pública Netquest para ter uma amostra demograficamente equilibrada. Mas fazem a ressalva de que, como o acesso à internet no Brasil é menor entre população de baixa renda, a amostragem tende a ser enviesada para pessoas de maior renda e instrução.
Para avaliar a crença em desinformação eleitoral, os pesquisadores perguntaram aos participantes sobre a veracidade de quatro afirmações falsas que circularam no período eleitoral: os votos são contabilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral em uma sala secreta; é impossível auditar as urnas eletrônicas no Brasil; existe um documento secreto que revela falhas na contagem dos votos da eleição de 2018 e existe um software que consegue mudar os votos dentro das urnas eletrônicas.
Os pesquisadores cruzaram essas respostas com o tipo de conteúdo mais consumido pelos pesquisados mídia profissional, nativa digital ou plataformas.
Eles também indagaram aos pesquisados se confiavam na informação da mídia em geral e de determinados veículos, e cruzaram as informações para determinar em que medida a confiança em notícias estava relacionada à crença em desinformação.
Quanto mais as pessoas acessavam conteúdo da mídia profissional, menos elas acreditavam em notícias falsas sobre a eleição. Já os acessos à mídia digital nativa e às plataformas digitais não estão relacionados a mudanças no nível de crença em fake news.
Além disso, quanto menor a confiança em veículos da mídia profissional, mais as pessoas acreditavam em conteúdos falsos.
“O estudo mostra o papel fundamental desempenhado pelas instituições jornalísticas para se contrapor às tentativas de políticos de contestar o resultado das eleições disseminando desinformação, o que, no Brasil, levou a uma onda de violência”, afirma o estudo.
PATRÍCIA CAMPOS MELLO / Folhapress