Ações judiciais passam a cobrar dano climático por desmatamento e queimada

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A infração ambiental nunca ficou tão cara quanto agora. A AGU (Advocacia-Geral da União) passou a adotar a cobrança por danos climáticos de desmatamento e queimadas em ações civis públicas, como estratégia para proteger e restaurar os biomas do Brasil e frear os responsáveis.

Em julho, a Justiça Federal do Amazonas determinou o bloqueio de bens avaliados em R$ 292 milhões de um pecuarista acusado de desmatar e queimar 5.600 hectares de florestas na amazônia. A decisão foi motivada por uma ação da AGU.

O valor cobrado representa a emissão de 901 mil toneladas de gases de efeito estufa, a título de compensação financeira. A cada tonelada deve-se pagar 60 euros (R$ 324, considerando a cotação daquele período), conforme cálculo da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) baseado em padrão internacional.

Mariana Cirne, procuradora nacional do clima da AGU, explica que a instituição busca ampliar a responsabilidade por danos climáticos nas esferas criminal, civil e administrativa. Ela destaca que o novo instrumento será usado de “maneira estratégica, para não banalizar”.

Fora a ação civil pública, o infrator ainda poderá ser penalizado pelo mesmo caso nas esferas criminal e administrativa.

“Como é, de fato, uma tese nova, tem que ser tratado de maneira estratégica. É muito importante que a gente escolha casos representativos, em que o infrator esteja reiteradamente causando grandes emissões, para que se utilize nesses casos e consolide uma jurisprudência mais favorável”, diz a procuradora.

Mais recentemente, no último dia 16, a AGU anunciou a primeira ação de reparação por dano climático em nome do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), no valor de R$ 635 milhões.

O montante considera a destruição de 7.075 hectares na Floresta Nacional de Jamanxim, no Pará, que gerou a emissão de 1,1 milhão de toneladas de gases-estufa.

Caso as ações sejam julgadas procedentes, os valores serão destinados ao Fundo Nacional Sobre Mudança do Clima, explica Cirne, para serem aplicados em medidas de mitigação e adaptação, principalmente voltadas às populações mais afetadas, como indígenas e ribeirinhos.

“Os valores são bem altos. Então eu peço a reparação do dano ambiental, mas também temos a responsabilidade do poder de polícia. São multas, são embargos, são medidas que são feitas pela administração, sem precisar do Judiciário”, destaca Cirne.

Segundo a procuradora, há em andamento 89 ações desse tipo no Brasil.

Comum a todas, está a ideia de que é preciso cobrar o dano que as emissões de carbono causam às gerações atuais e futuras, uma vez que o aumento da temperatura do planeta, fruto do efeito estufa, dispara eventos climáticos extremos como enchentes, ondas de calor e secas, que, além do sofrimento causado, elevam custos públicos.

Ao ser julgado, o infrator deverá apresentar projeto de compensação e não poderá acessar financiamento em estabelecimentos oficiais nem receber benefícios fiscais. Não serão permitidos também aquisição, alienação, locação ou empréstimo de equipamentos, bem como de bovinos ou produtos de agropecuária. Ficam vetadas também a transferência e a negociação das terras com áreas desmatadas.

A Abrampa (Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente) também reconhece os danos climáticos e lançou, no último dia 13, uma nota com fundamentos técnicos e jurídicos para elevar as cobranças em ações civis.

Alexandre Gaio, presidente da Abrampa, destaca a importância da qualificação dos prejuízos ambientais. A entidade, para isso, firmou uma parceria com a ONG Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), que elaborou uma calculadora de emissão de gases de efeito estufa, também baseada em padrões internacionais, na qual deve ser inserida a área afetada pelo infrator.

“Com a calculadora, é possível monetizar esse valor para cobrança de reparação dos danos ambientais, decorrente da supressão de vegetação nativa de modo ilegal em qualquer bioma”, explica Gaio, que afirma que o Ministério Público é responsável por mais de 90% das ações de reparação dos danos ambientais no Brasil.

Paulo Moutinho, cientista sênior e um dos fundadores do Ipam, conta que a cada tonelada de carbono emitida são cobrados US$ 5 (cerca de R$ 27 na cotação atual). A calculadora desenvolvida leva em consideração as diferenças dos biomas, pois cada tipo de vegetação e solo emite uma certa quantidade ao ser destruído.

“Nós calculamos o quanto há de carbono na floresta amazônica, com isso sabemos o quanto de carbono foi oriundo de um desmatamento realizado ilegalmente”, exemplifica Moutinho.

JORGE ABREU / Folhapress

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