Advogados se preocupam com decisão do STJ que pode respingar na Sabesp

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um julgamento no STJ (Superior Tribunal de Justiça) envolvendo consequências da mudança de controle de uma empresa aberta —mais especificamente, o risco de mudança de entendimento em relação ao que rege a CVM (Comissão de Valores Mobiliários)— está preocupando advogados e empresas interessadas na privatização da companhia de saneamento paulista Sabesp.

O caso envolve a Ternium Investments, empresa com origem em Luxemburgo que, há 12 anos, briga com a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) por uma indenização acionária de R$ 5 bilhões.

Em novembro de 2011, a Ternium comprou 27,7% da Usiminas. Pagou R$ 4,1 bilhões (à época) para Votorantim e Camargo Corrêa. Entrou no grupo de controle, mas sem tê-lo.

A CSN, que tem 12,9% das ações, pediu à Justiça uma indenização, porque entendia que a mudança no grupo de controle disparava o que é chamado de “tag along” —quando um grupo minoritário tem direito de receber uma oferta por suas ações devido à alienação do controle de uma companhia. É algo que está previsto no artigo 254A da lei nº 6.404, conhecida como Lei das S/A.

A CSN argumenta que a troca de controle ocorreu de forma disfarçada, o que a Ternium nega ter acontecido. Uma decisão referente a fraude poderia tornar a decisão do STJ específica apenas para a questão da Usiminas. Mas a corte pode divulgar uma sentença que afete o entendimento jurídico societário e as privatizações planejadas de empresas de capital aberto, como a Sabesp.

O caso está na 3ª turma do STJ. O placar está empatado em 2 a 2 e o último voto será dado pelo ministro Antonio Carlos Ferreira. Mais um parecer favorável à CSN mudaria o entendimento que, para advogados ouvidos pela Folha, é consagrado pela CVM: o tag along só seria acionado se uma empresa assumisse de fato o comando.

Nos últimos meses, advogados envolvidos nas duas partes e outros de diferentes escritórios de direito societário têm discutido como o desenrolar dessa briga pode respingar em um dos principais projetos do governo de São Paulo: a privatização da Sabesp, já que nesse processo também pode haver mudança no controle.

O estado, que tem 50,3% das ações da companhia de saneamento, de capital aberto, pretende vender entre 15% e 30% para um “acionista de referência”. É o termo que designa quem vai ter influência significativa sobre a empresa, mas sem o controle.

Para isso, o estado vai fazer um follow-on, ou seja, uma nova emissão de ações para o mercado.

O governo de São Paulo, pretende, na privatização da Sabesp, negociar uma porcentagem do controle, mas não o controle em si.

“Diante disso, acho que a formatação jurídica [da privatização da Sabesp] deve ser feita de uma forma que não dispare o tag along, como pode entender uma possível decisão do STJ. Na época do governo Fernando Henrique Cardoso [1995-2002] esse artigo 254 foi revogado para que pudessem acontecer as privatizações. Depois, foi reincorporado. Houve uma época que não havia tag along para o minoritário. É algo muito discutido se faz sentido existir”, afirma a advogada Anna Carla Marujo Rossetti, do escritório Marujo Rossetti Advogados.

“Essa discussão pode gerar uma insegurança? Claro que pode. Depende de como vai sair essa decisão. Se o STJ der uma sentença que diga: alguém entrando no grupo de controle cria a necessidade de uma oferta pública [aos minoritários], isso vai afetar diversos casos. Temos de analisar. Mas se resolver que na Usiminas houve uma simulação ou algo parecido, sem transferir controle, será algo limitado a este caso”, analisa Julian Chediak, professor de direito da PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro e presidente da Câmara Americana de Comércio do Rio.

Ele vê a privatização da Sabesp como um caso bem diferente da briga CSN-Ternium-Usiminas, mas reconhece que o STJ corre o risco de mudar um entendimento consolidado. Esse é também o pensamento de diferentes especialistas ouvidos pela reportagem, alguns dos quais pediram o anonimato porque trabalham para consórcios interessados em fazer oferta no leilão da empresa de saneamento.

“Os efeitos [da decisão do STJ] para outros casos seriam graves. Geraria uma distorção no regime que sempre se adotou para as alienações de controle e jogaria casos passados sob possibilidade de juízos muito subjetivos”, disse Otávio Yazbeck, professor da PUC-RJ, sócio da Yazbek Advogados e ex-diretor da CVM.

A disputa entre CSN e Ternium mudou de rumo com a apresentação de embargos de declaração ao STJ. Até então, a siderúrgica havia perdido em todas as instâncias, inclusive no mérito da ação no próprio Superior Tribunal de Justiça.

Entre o julgamento do mérito e a análise dos embargos de declaração (expediente que serve para apontar uma incoerência ou dirimir dúvidas), o ministro Paulo de Tarso Sanseverino morreu e o ministro Marco Aurélio Bellizze se declarou impedido para julgar.

O ministro Paulo Dias de Moura Ribeiro, relator, decidiu dar razão à CSN, acompanhado pelo ministro Humberto Martins.

A ministra Nancy Andrighi e o ministro Villas Bôas Cueva votaram por mandar o caso de volta à primeira instância para produção de novas provas.

“Nem todos os mercados têm uma lei sobre oferta pública em caso de alienação de controle, uma proteção ao minoritário, como o Brasil. Mas temos de analisar a dinâmica do caso concreto. O percentual pouco quer dizer sobre se vendeu ou não o controle”, define Viviane Muller, professora e coordenadora do Núcleo de Estudos de Mercados e Investimentos da FGV (Fundação Getúlio Vargas).

ALEX SABINO / Folhapress

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