RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) – Setembro de 2021: incêndios simultâneos fecham rodovias, causam acidentes e isolam uma cidade na região de Ribeirão Preto. Agosto de 2024: queimadas em série travam estradas, provocam batidas e isolam cidades na região de Ribeirão Preto.
A ocorrência de fenômenos climáticos com resultados semelhantes em curto espaço de tempo no interior paulista já tem sido tratada pelo agronegócio um dos principais prejudicados e por prefeituras como cíclicos. Por isso, poder público e agentes privados passaram a desenvolver ações de combate para tentar mitigar os danos provocados pelo fogo.
Sindicatos agrícolas e gestões municipais têm tido o entendimento de que a falta de chuvas será cada vez mais severa, o que combinado com a vegetação seca cria um cenário que facilita a propagação das chamas, mata pessoas e animais, causa prejuízo material e aumenta problemas respiratórios.
Por isso, avaliam, é preciso colocar o aquecimento global e as consequentes mudanças climáticas provocadas por ele na pauta. A ideia é que o assunto seja tratado de maneira semelhante às enchentes no verão, como um problema recorrente, com ações que tentam minimizar seus efeitos.
Questões como a falta de locais para abastecer caminhões-pipa, sinal de telefone na zona rural e até mesmo um cadastramento de todos os veículos que podem auxiliar no combate a queimadas foram discutidos na tarde desta quarta-feira (28) na Prefeitura de Olímpia, em reunião de órgãos públicos que trabalharam nos incêndios do final de semana e que voltaram a se repetir nesta terça (27), num canavial na zona rural.
Embora concentrados na sexta-feira (23) e sábado (24), os incêndios voltaram a ser registrados desde terça em locais como Batatais (três) e Pedregulho (um) e há a preocupação de que novos problemas surjam devido ao alerta de emergência para incêndios para os próximos dias.
Outras medidas foram debatidas, como a criação de um espécie de “cinturão seco” na cidade, para separar a zona urbana de locais em que o fogo possa se propagar e gerar riscos à população.
Também está nos planos conversas com usinas e produtores rurais para estudar a criação de uma espécie de calendário que permita colher a cana mais próxima da zona urbana até o mês de junho, antes de a estiagem típica do inverno se intensificar.
Assim, avaliam, no caso de novos incêndios eles estariam mais distantes do núcleo urbano e prejudicariam menos a população. O município tem apenas uma usina de açúcar e etanol instalada, mas pelo menos outras duas têm áreas de cultivo de cana em Olímpia.
O cinturão seria uma espécie de aceiro (faixa de terra sem vegetação) largo entre o fim da cidade e o início da zona rural, para evitar que as chamas se aproximem das casas e empresas. O tamanho ideal dependeria de mudanças na legislação local, mas a avaliação inicial indica que cinco metros, largura normalmente usada, é pequena para evitar a propagação do fogo em casos de ventania como ocorreu no entorno do condomínio Alphaville 3, em Ribeirão, que quase foi atingido por um incêndio no último final de semana.
“É uma forma sistêmica que o poder público vai ter de implementar para enfrentar essas coisas [clima] que não serão mais eventuais. É melhor a gente se preparar. Se tem uma suspeita que foi o crime organizado então nós temos de ter o poder público organizado e a sociedade organizada para enfrentar isso”, afirmou o prefeito de Olímpia, Fernando Cunha (PSD).
O temor se explica pelo histórico recente do interior paulista: há três anos, cidades paulistas viveram um boom de incêndios em agosto, que passaram de 1.111, no ano anterior, para mais de 2.200, segundo dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Eles resultaram num incêndio na estação ecológica de Jataí, em Luiz Antônio, e na Serra do Japi, cadeia de montanhas de 354 quilômetros quadrados que ocupa áreas de quatro municípios no entorno de Jundiaí, mas não só isso.
Agravados em setembro, levaram o caos para o interior, interditando rodovias e isolando Batatais, cidade da região de Ribeirão que novamente agora foi atingida pelas chamas. Rodovias como a Candido Portinari e a Anhanguera sofreram interdições e as queimadas causaram problemas também nas regiões de São José do Rio Preto, Bauru, Campinas e Presidente Prudente.
Ribeirão Preto é outra cidade que criou um plano de combate e prevenção a incêndios, em 2022, com cooperação entre prefeitura, Instituto Florestal e condomínios, após os problemas registrados no ano anterior, e que foi colocado à prova agora. A avaliação do prefeito Duarte Nogueira (PSDB) é a de que as ações da força-tarefa surtiram efeito, não deixaram desabrigados e impediram que o fogo chegasse às casas do Alphaville.
“A partir do que aconteceu há três anos fizemos um trabalho muito grande com as secretarias do Meio Ambiente e da Agricultura e o governo disponibilizou mais de uma centena de caminhões-pipa para o interior e fizemos brigadas”, disse o presidente da Faesp (Federação da Agricultura do Estado de São Paulo), Tirso Meirelles.
Segundo ele, o cenário de agora se repete da mesma forma que ocorreu há três anos, envolvendo uma seca muito severa, geada e tempestade de poeira. Sindicatos rurais no interior do estado também têm desenvolvido campanhas sobre o tema.
Outras medidas em discussão em prefeituras paulistas é a de criação de sala de situação para concentrar emergências ligadas e incêndios e adotar também rádios de comunicação, para agilidade em locais em que a telefonia celular não funciona no campo, cenário comum na maior parte da zona rural brasileira.
MARCELO TOLEDO / Folhapress