Agro não vai entrar no mercado regulado de carbono tão cedo, diz CNA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O projeto de lei que regulamenta o mercado de carbono no Brasil foi aprovado nesta quinta-feira (21) na Câmara dos Deputados excluindo a agropecuária do sistema de metas de emissões.

Com 299 deputados aliados, ficou fácil para o setor manter o texto aprovado no Senado em outubro, que retirava toda atividade primária agropecuária do escopo do mode lo, ainda que seja a principal responsável pelas emissões de gases de efeito estufa (GEE) no Brasil.

Durante a votação no plenário, o PSOL chegou a apresentar um destaque sugerindo a volta do agro ao mercado, mas a proposta foi rejeitada.

Assim, após a aprovação do texto no Congresso, proprietários rurais ficarão imunes aos tetos de emissões de GEE estipulados pelo órgão gestor do mercado. O mesmo não acontecerá, por exemplo, com a indústria.

Por outro lado, o agro poderá vender créditos de carbono no mercado voluntário. Ou seja, proprietários rurais não precisarão cumprir metas, mas aqueles que conseguirem comprovar reduções de emissões poderão arrecadar com a venda de créditos.

“Queremos participar do mercado de carbono desde que tenhamos essas regras claras de como isso vai acontecer. Estamos produzindo comida, energia e soluções climáticas. Se você cria um teto de emissões nessas ações, você está indo contra essa própria narrativa de que é preciso reduzir emissões e alterar a matriz energética”, diz à Folha de S.Paulo Nelson Ananias, coordenador de sustentabilidade da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) e principal porta-voz do setor sobre o tema.

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Pergunta – O agro fora do mercado de carbono não passa impressão negativa à sociedade?

Nelson Ananias – A gente entende que não. Queremos a retirada do agro do mercado regulado dos tetos de emissões, dentro do Plano Nacional de Regulação, porque entendemos que a metodologia de se medir o agro ainda não está madura o suficiente para que o setor entre nessa contabilidade. Mas a gente continua apoiando o alcance das metas das NDCs [Contribuição Nacionalmente Determinada, sigla em inglês adotada no Acordo de Paris para designar as metas nacionais de clima] através da recuperação de matéria ativa. O agro continua podendo contribuir para a redução das emissões como um provedor de crédito de carbono íntegro.

Queremos participar do mercado de carbono desde que tenhamos essas regras claras de como isso vai acontecer. Estamos produzindo comida, energia e soluções climáticas. Se você cria um teto de emissões nessas ações, você está indo contra essa própria narrativa de que é preciso reduzir emissões e alterar a matriz energética.

P. – Então o agro quer entrar vendendo crédito no mercado voluntário e não sendo um dos setores que precisarão cumprir metas no mercado regulado?

N. A. – Sim. A gente pode entrar no mercado regulado fornecendo offsets para o cumprimento de outros setores da economia nesse mercado regulado, até porque o agro já faz isso. Quando o produtor rural faz um plantio direto ou ILPF (integração lavoura pecuária floresta), ele já está gerando créditos de carbono.

P. – O relator do projeto na Câmara, o deputado Aliel Machado (PV-PR), chegou a oferecer ao setor a possibilidade de entrar no mercado sem estar sujeito a multas por alguns anos. Por que nem essa proposta agradou o agro?

N. A. – A proposta dele era de que o agro entraria no mercado três anos após o plano de implementação entrar em vigor, desde que essas metodologias já estivessem definidas. Mas a gente entendeu que essa proposta não criava uma segurança necessária nem incentivava aquilo que o agro pode propor como ente regulado. [Esse modelo] Não deixa claro quando isso acontecerá, não deixa claro qual vai ser o sistema de monitoramento e qual vai ser a metodologia a ser aplicada, até porque não existe essa metodologia. Não há no mundo algum lugar onde isso esteja sendo implementado de forma ampla, principalmente por um setor agropecuário do tamanho do Brasil.

Como é que a gente aplica uma única regra em várias propriedades e tipos diferentes de produtores? No setor de energia e de transporte, por exemplo, você consegue ter um padrão de medição, mas no agro, não. Se, de repente, aparece uma metodologia para um tipo de produção, isso pode ser extrapolado e prejudicar, principalmente pequenos e médios produtores.

P. – Mas existe alguma estimativa de quando essas metodologias estarão prontas e de quando o agro estará interessado em entrar no mercado regulado?

N. A. – A gente entende que não há um horizonte. Não há nada hoje que diga realmente que a gente pode daqui a seis anos, por exemplo, ser regulado. A gente não vê horizonte nesse espaço de tempo.

P. – Os produtores rurais estão insatisfeitos com a criação dos mercados jurisdicionais de carbono?

N. A. – A gente entende que o texto é geral e bem confuso. Ele diz que o produtor pode solicitar a retirada da parte dele do mercado jurisdicional, mas isso ainda precisa ser regulamentado. A gente ainda precisa estudar quais os impactos e quais as regulamentações para dizer se realmente é uma vantagem ao produtor rural esses mercados jurisdicionais ou não.

PEDRO LOVISI / Folhapress

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