RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A Águas do Rio, principal concessionária de saneamento básico do Rio de Janeiro, afirma que o governo estadual inflou os dados sobre coleta de esgoto de cidades em que atua no edital de licitação para a privatização do serviço em 2021.
Em ofício enviado à Agenersa (Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico) em 31 de outubro do ano passado, a empresa indica a necessidade de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão.
A revisão pode impactar os investimentos de R$ 24 bilhões prometidos, incluindo a despoluição da baía de Guanabara.
Em nota, o governo estadual afirma que está avaliando os números do processo de concessão e que “qualquer necessidade de ajuste poderá ser pleiteada pela concessionária”.
A Águas do Rio diz que discute o tema com a Agenersa e o governo desde novembro de 2023 e reforça o compromisso com a execução do plano de investimentos.
O diagnóstico da Águas do Rio ainda está incompleto. A concessionária afirmou à agência reguladora que ainda não teve tempo hábil de analisar todos os documentos encaminhados pela Cedae, antiga responsável pelo saneamento básico na região. Ela promete finalizar o estudo em abril.
Contudo, declara já ter identificado “drástica discrepância entre os percentuais informados pela Cedae à época da modelagem da licitação e o existente em municípios populosos”.
As principais cidades em que a diferença foi encontrada são Duque de Caxias, São Gonçalo, Nova Iguaçu, Belford Roxo, Itaboraí e Mesquita.
Ela aponta ainda que “não há qualquer forma de cobertura de esgoto” em outras nove cidades onde o edital de licitação apontava atendimento entre 33% e 87% da população. Entre elas, ficam na região metropolitana Magé (40% no edital), Nilópolis (33%) e Queimados (42%).
A lista também inclui Cantagalo, onde, segundo o governo, a cobertura era de 87% à época da licitação, mas a concessionárias diz não haver qualquer sinal de coleta de esgoto.
De acordo com a empresa, as discrepâncias ampliam a necessidade de investimento para alcançar 90% de cobertura de coleta de esgoto em sua área de atuação até 2033, como prevê o contrato de concessão. Também reduz, segundo ela, a receita prevista da operação.
A Aegea Saneamento, controladora da Águas do Rio, foi a principal vencedora da licitação para concessão do saneamento básico no Rio de Janeiro, realizado em agosto de 2021. Ela arrematou dois dos quatro blocos disponíveis.
Pelo maior deles, o bloco 4, pagou R$ 7,2 bilhões, ágio de 187,7% em relação ao preço mínimo. Pelo bloco 1, ofereceu com bônus de R$ 8,2 bilhões, ágio de 103,1%, sobre o preço mínimo.
As exigências do edital preveem um investimento de R$ 24,3 bilhões nas zonas sul, norte e centro da capital e outros 16 municípios do estado.
Desse total, R$ 2,7 bilhões se referem à construção de coletores de tempo seco para interromper o despejo de esgoto na baía de Guanabara até 2026. O projeto, porém, já está em atraso em razão da demora na aprovação das obras na Agenersa.
O governo fluminense arrecadou, no total, R$ 22,7 bilhões com o leilão (68% da Aegea). Os recursos foram usados em um pacote de obras que se tornou uma das bandeiras de campanha para a reeleição do governador Cláudio Castro (PL).
Dois anos depois, a empresa afirma que o edital no qual as propostas foram baseadas continha dados errados e alerta para a necessidade de revisão do contrato.
“É fundamental que a agência e o poder concedente, em conjunto com a concessionária, avaliem o cenário atual vis-à-vis a previsão editalícia para nortear as próximas ações pois o desvio de cobertura não apenas majora de maneira importante os investimentos da concessionária, bem como frusta de maneira relevante as receitas previstas no estudo de viabilidade técnica e econômica referencial”, afirma o ofício enviado à Agenersa.
O próprio edital já previa uma possível divergência entre os dados de cobertura que ali constavam e os efetivamente existentes. Contudo, estabelecia um limite de 18,5% para essa diferença o que, segundo a concessionária, foi superado em muitos municípios.
O documento estabelecia que a concessionária teria dois anos após assumir a operação plena da distribuição de água e coleta de esgoto para apontar os eventuais erros. A Águas do Rio assumiu o serviço em outubro de 2021.
O documento, assinado pelo diretor-presidente da empresa, Alexandre Bianchini, e o diretor institucional Anselmo Leal, afirma que os dados enviados ainda são preliminares porque a Cedae só concluiu a entrega das informações técnicas em agosto do ano passado, quando deveria ter repassado tudo antes de entregar o serviço para a concessionária.
Por essa razão, a empresa não formalizou um pedido de reequilíbrio do contrato. Apontou para as discrepâncias, sinalizou para a necessidade de revisão das bases do acordo e pediu mais seis meses para finalizar os estudos.
GOVERNO DIZ ESTAR AVALIANDO NÚMEROS DA CONCESSÃO
O governo estadual disse, em nota, que “a Cedae está avaliando os números constantes dos documentos que integram o processo de concessão”.
“A Casa Civil informa que qualquer necessidade de ajuste poderá ser pleiteada pela concessionária durante os processos de revisão contratual”, disse o governo.
A Águas do Rio afirmou, em nota, que “o tema é objeto de um grupo de trabalho criado entre o poder concedente, a agência reguladora e as concessionárias desde novembro de 2023”.
“A Águas do Rio reforça seu compromisso com a execução do plano de investimentos atingindo a universalização da cobertura em coleta e tratamento esgoto até 2033, sem prejuízo da aceleração dos seus efeitos na baía da Guanabara através da implantação do sistema de coleta em tempo seco”, disse a empresa.
ITALO NOGUEIRA / Folhapress