PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Um incêndio ocorrido no domingo (3) em uma das aldeias do Parque Indígena do Xingu, em Mato Grosso, deixou cerca de 60 indígenas desabrigados e causou comoção na comitiva que levará um de seus representantes à COP28 (conferência da ONU sobre mudanças climáticas), em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
A aldeia Ulupuwene é composta por 18 casas que abrigam cerca de dez pessoas em cada uma e são construídas em madeira e sapê, nos mesmos moldes há mais de 300 anos.
Seis delas foram completamente destruídas pelas chamas, incluindo uma que abrigava um coordenador da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) na região, deixando cerca de 60 pessoas desabrigadas–cerca de um terço da população da aldeia. O fogo começou com a queda de um raio.
Com o fogo, as famílias perderam documentos, redes, cobertores, alimentos, equipamentos, artefatos sagrados, objetos rituais e artesanatos. Não houve feridos. Como a aldeia fica isolada, a mais de nove horas da cidade mais próxima, Canarana (MT), o incêndio só foi comunicado nesta segunda (5).
Um dos membros da aldeia é o cineasta e fotógrafo indígena Piratá Waurá, da etnia waujá. Ele soube do incidente enquanto estava em Londres, hospedado pela ONG People’s Palace Projects, em uma escala da viagem até a Dubai, cidade que recebeu a COP28. A irmã de Piratá foi uma das pessoas que perderam seus pertences.
No próximo sábado (9), Piratá se apresentará no Resilience Hub, espaço da COP dedicado a mostrar exemplos de estratégias de resiliência de comunidades ameaçadas. Ele apresentará o caso de uma gruta sagrada para os povos do Alto Xingu que teve as inscrições em pedra destruídas em 2018 e está sendo reconstruída.
Conforme a People’s Palace Projects, o incêndio tem relação com as mudanças climáticas em curso. A esta altura do ano, seria esperado que a região do Alto Xingu, que fica na transição entre a floresta amazônica e o cerrado, estivesse passando pela estação de chuvas desde o final de outubro.
Em vez disso, a seca continua –interrompida eventualmente por tempestades curtas e violentas. Na de domingo, em que houve raios, um deles atingiu o sapê, material facilmente inflamável. Em seguida, a ausência de chuva dificultou o combate às chamas.
A comunidade indígena também prevê dificuldade na reconstrução das casas. Segundo a Associação Indígena Ulupuene, o tempo de construção de uma casa nesses moldes é superior a um ano e a palha de sapê, material utilizado para a cobertura, está escassa no território.
Só haverá sapê o suficiente para colheita após o período das chuvas. Na melhor das previsões, em maio de 2024.
Há duas campanhas online para ajudar a aldeia Ulupuwene, uma internacional, mobilizada pela People’s Palace Projects, e outra organizada pela associação local. Os primeiros R$ 3.500 arrecadados pela ONG internacional já foram enviados para a compra de mantimentos.
CAUE FONSECA / Folhapress