Alexandre Herchcovitch cria com seda e cashmere para desfilar sua ideia de luxo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um modelo do próximo desfile de Alexandre Herchcovitch vai entrar na passarela vestindo um blusão azul de cashmere com cristais bordados na gola e nos ombros. A peça será combinada com um jeans navalhado, na qual os rasgos revelam não a pele, mas sim um forro verde —e a barra da calça, quando dobrada, mostra uma estampa de flores feita de forma artesanal.

“É uma roupa luxuosa e cara mas não para ser usada numa festa”, diz Herchcovitch, enquanto manuseia a blusa em seu ateliê, o cashmere tão macio que se derrete em suas mãos. As matérias-primas nobres e o trabalho minucioso empregado nas peças do look ilustram a ideia de luxo que o estilista quer passar no desfile, seu terceiro desde que retomou as rédeas da marca que leva seu nome, há quase dois anos.

A apresentação em São Paulo, que abre a 54ª Casa de Criadores, nesta quarta-feira, levará para a passarela cerca de 40 looks nos quais as fibras naturais, como a seda e o cashmere, dão a tônica das peças de inverno e primavera. Herchcovitch fez até uma parceria com Marisa Ribeiro, estilista tradicional conhecida pelos seus tricôs de cashmere, tecido originário dos pelos de cabra e considerado um dos mais exclusivos.

O estilista conta que queria deixar bem claro para o público que sabe desenvolver uma coleção de visual elevado, para além do streetwear comumente associado a seu nome. Para isto, a apresentação será mais limpa, por assim dizer, com foco no vestuário, não nos acessórios —não haverá nenhuma joia ou boné, e as bolsas vêm em tons sóbrios, como azul escuro.

Com a ideia do refinamento em mente, ele também desfilará um tecido feito com fios de ouro de 14 quilates, desenvolvido em teares manuais por uma empresa centenária da China, que resulta em detalhes brilhosos numa roupa que passa a ideia de grandeza, feita para ser usada em ocasiões especiais. “Talvez seja o tecido mais luxuoso que já trabalhei”, afirma, num ano cheio de lançamentos em comemoração aos 30 anos de sua marca.

Em 2024, chegaram às lojas diversos produtos com a etiqueta Herchcovitch lançados em parceria com outras empresas, como uma coleção com a grife de moda masculina de básicos Aramis e outra com a marca de bonés New Era, que incluía regatas e shorts de pegada esportiva. Estão previstos para o segundo semestre material escolar e até chicletes com o logo da caveira, seu motivo mais conhecido.

Na coleção que será mostrada nesta quarta, também telegrafa a mensagem de roupa sofisticada a alfaiataria empregada na construção das peças do primeiro bloco do desfile, voltado para um vestuário mais pesado, de inverno, como no caso de um longo casaco de lã “que você vai ter para usar a vida toda”, segundo o estilista.

Apesar do aceno à tradição na feitura de roupas, o desfile não será conservador, na medida em que traz a assinatura de um estilista forjado nos inferninhos da noite eletrônica de São Paulo. Alguns vestidos vêm com sobrevestidos de argolas, outros são totalmente fechados na frente mas têm fendas atrás, deixando à mostra as pernas da modelo, no que o criador chama de “subversão da forma”.

Esse conceito ele aplica também a roupas de época das quais tirou a armação. Por exemplo, uma peça inspirada num vestido do final do século 18 que teria originalmente os quadris avantajados, volumosos, vai murchar no corpo da modelo. “Acho que fica muito mais contemporâneo quando a roupa fica mole”, ele justifica.

A menos de dois dias do desfile, o espaço de trabalho do estilista, um galpão no bairro da Barra Funda, era organizado. Araras já tinham os looks prontos para a passarela, e a ordem da entrada dos modelos estava numa série de fotos coladas na parede. De vez em quando, algum assistente comunicava a Herchcovitch que faria uma costura ou um reparo final.

Ele mostra à reportagem uma planilha na qual trabalha há meses, com fotos dos modelos e do look que cada um vai vestir. As roupas parecem peças de um quebra-cabeças que se combinam na ordem certa conforme o desfile se aproxima. Em cima da hora, “não tem grandes mudanças e nem surpresas”, ele diz. “Eu só sigo o que foi planejado.”

JOÃO PERASSOLO / Folhapress

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