SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) de aumentar a Selic (taxa básica de juros) de 10,75% para 11,25% ao ano aumenta a pressão sobre um cenário já desfavorável para quem busca financiamento imobiliário.
Utilizada pelo Banco Central para controlar a inflação, a Selic é uma bússola do mercado para estipular as taxas de juros de suas operações. Em dois dígitos, a nova taxa encarece e dificulta o crédito imobiliário pelos bancos em meio a uma alta demanda.
A elevação da taxa básica interfere no volume de recursos disponíveis na poupança para o crédito imobiliário, do qual é a principal fonte. Quando está alta, outros investimentos ficam mais atrativos e são feitos mais saques do que depósitos da caderneta, sobrando menos recursos para que os bancos emprestem dinheiro a compradores de imóveis.
Os compradores também enfrentam a redução do teto de financiamento pela Caixa Econômica Federal e menos recursos na linha Pró-Cotista em 2025 -modalidade de financiamento que tem juros menores para trabalhadores com contas vinculadas ao FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).
A Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias) entende que a decisão do Banco Central de elevar a Selic em 0,5 ponto percentual foi “tecnicamente necessária para conter a alta do dólar e a inflação”. No entanto, diz, os juros elevados impõem enormes desafios ao setor produtivo e, especialmente, à geração de empregos. “É urgente conter os gastos públicos para alcançar uma situação fiscal mais equilibrada, que permita uma redução perene na taxa de juros”, afirma, em nota.
“Com o crédito mais caro, empresas e famílias enfrentam dificuldades adicionais, já que o aumento dos financiamentos limita o acesso a capital e restringe investimentos em setores que dependem de crédito”, diz a Abrainc.
A associação afirma que o reflexo dessa pressão é o número de pedidos de recuperação judicial, que atingiu 1.700 até setembro, representando um aumento de 73% em relação ao mesmo período de 2023, segundo dados da Serasa Experian. “Esse dado revela uma piora no ambiente de negócios e evidencia a necessidade iminente de um ajuste fiscal no Brasil”, diz a nota da Abrainc.
Segundo Pedro Tenório, economista do DataZAP, o impacto do aumento da Selic é razoavelmente menor para quem tem financiamento imobiliário ou está prestes a contratar. Quem está muito próximo de fechar o financiamento imobiliário atravessou a maior parte da longa jornada de compra, tornando pouco provável a desistência no último momento. Além disso, é muito comum que os contratantes tenham uma pré-aprovação com taxas determinadas.
“É importante destacar também que os principais efeitos do aumento da Selic costumam demorar de dois a três meses, em média, para serem completamente refletidos nas taxas de financiamento imobiliário”, afirma o especialista.
Para quem está em um financiamento imobiliário o maior impacto será observado nos contratos indexados à própria taxa Selic ou à remuneração da poupança (SBPE). A parcela, nesses casos, deve ter um impacto maior do que o do aumento da TR (Taxa Referencial).
A TR é o principal indexador dos contratos atualmente -estão em mais de 95% da carteira de crédito imobiliário concedido à pessoa física em setembro de 2024, segundo o Banco Central. Nos últimos meses, a taxa estava em 0,81% ao ano (adicionais à taxa básica do financiamento), segundo Tenório. Com a alta da Selic, deverá ficar um pouco acima de 0,90%.
Já financiamentos indexados ao IPCA (aproximadamente 2% da carteira) e financiamentos sem qualquer indexação (menos de 1%) não são afetados pelo aumento da Selic.
Embora a Selic seja referência para o mercado de juros, o custo do crédito imobiliário não subiu na mesma proporção. Segundo a Abrainc, quando a Selic estava em 2% ao ano -em 2020, os bancos cobravam uma taxa de juros de 7% ao ano nos financiamentos habitacionais. Hoje, esta taxa está em torno de 11%.
A taxa básica de juros atingiu o seu pico em agosto de 2022, aos 13,75% ao ano, mantendo-se nesse patamar até agosto do ano passado, quando passou a sofrer cortes graduais até chegar em 10,50% e voltar a subir em setembro deste ano.
Independentemente da Selic, os bancos estão subindo os juros nas suas linhas de financiamento para enfrentar uma aquecida demanda por crédito imobiliário. O cenário de juros altos é debatido por todo o setor neste semestre.
O mercado de capitais tem conseguido suprir apenas parte desse déficit, por meio de letras de crédito imobiliário atreladas ao IPCA. O caminho, porém, ainda é longo para que a poupança seja substituída como instrumento principal de financiamento habitacional do brasileiro, ao lado do FGTS.
ANA PAULA BRANCO / Folhapress