Alto nível político precisa se engajar para decidir cifra do financiamento climático, diz negociador da COP29

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Com o início da COP29, a conferência sobre clima da ONU (Organização das Nações Unidas) mais próximo, aumenta a pressão para a solução de um problema histórico nas negociações: destravar o financiamento climático.

Essa é a principal meta do evento, que começa em novembro na cidade de Baku, capital do Azerbaijão.

E há duas grandes questões sobre a mesa: o valor da nova meta de financiamento e como a cifra será calculada.

“Como estamos falando de bilhões, trilhões de dólares, isso precisa ser decidido pelo alto nível político, esse engajamento é necessário”, diz à Folha Yalchin Rafiyev, negociador-chefe da COP29.

A discussão gira em torno da sigla NCQG, sigla em inglês para nova meta coletiva e quantificada.

O Acordo de Paris definiu que os países desenvolvidos deveriam repassar às nações em desenvolvimento ao menos US$ 100 bilhões anuais para o financiamento climático.

Segundo a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), tal meta só foi cumprida em 2022, com dois anos de atraso. Rafiyev espera que a COP29 consiga não só construir uma nova meta, mas garantir que ela seja executada.

“Durante o processo de negociação, há visões diferentes, é claro. A definição da NCQG traz uma série de elementos: o valor, quem vai pagar, quem será beneficiado com esta quantia, quanto tempo teremos para levantar esta quantidade…”, diz o azeri.

“[Por enquanto] não vemos nenhum país criando precondições ou barreiras. Temos esperança que esse espírito construtivo continue”, afirma.

Tão importante quanto a meta é elaborar como esse valor será contabilizado. Há uma série de dúvidas quanto a isso.

Por exemplo, se serão consideradas apenas doações feitas pelos países ou se também serão somados valores com origem em fundos privados. Se serão incluídas ainda linhas de crédito e, se sim, quais tipos de crédito. Ou então se serão, ou não, levados em conta investimentos dos próprios países neles mesmos.

É preciso discutir também se nova meta contabilizará apenas as doações e investimentos feitos após a sua definição ou será retroativa. Também será necessário decidir quais países e/ou instituições terão que contribuir e com qual percentual do todo, assim como quais nações ou comunidades terão acesso ao dinheiro e em que medida.

A definição de uma meta compatível com o desafio socioambiental, mas sem clareza sobre esses detalhes, pode fazer a NCQG fracassar. Ao mesmo tempo, determinar todos esses procedimentos, mas não chegar a um acordo sobre a quantidade total, pode ser tão inócuo quanto os atuais US$ 100 bilhões.

“Existe um certo consenso entre os países que é: precisamos aumentar muito o atual financiamento”, diz.

Rafiyev afirma que as discussões técnicas já estão quase finalizadas e que então será necessário o empenho do alto nível da diplomacia para tomar decisões e chegar a definições sobre isso.

Outro obstáculo para as negociações podem ser as diversas eleições pelas quais o mundo passou ou passará antes da COP, em especial a dos Estados Unidos, que coloca frente a frente Donald Trump e Kamala Harris.

Trump é abertamente contrário às negociações das COPs e, quando presidente, retirou o país do Acordo de Paris.

Ao mesmo tempo, para que seja efetivo, um acordo global de financiamento climático não pode prescindir de um compromisso dos Estados Unidos –o que faz alguns diplomatas temerem que uma vitória republicana coloque todas as negociações ambientais em xeque.

Rafiyev, porém, se diz confiante no comprometimento dos americanos, independentemente do resultado eleitoral.

“Houve mudança significativa no cenário político da União Europeia [com a vitória da extrema direita], mas isso não teve impacto negativo nas nossas negociações”, afirma.

“No caso dos Estados Unidos, acreditamos que não terá impacto nos processos de negociação. Os delegados dos Estados Unidos estão engajados nos debates”, completa.

O Azerbaijão foi alvo de críticas, quando escolhido para sediar a COP29, por ser um dos principais produtores de petróleo do mundo. Os diplomatas de Baku, por outro lado, argumentam que não há contradição entre explorar combustíveis fósseis e promover o principal evento climático do mundo.

Pelo contrário, defendem utilizar a renda do petróleo e do gás para financiar a transição energética –o país lançou um fundo especial para produtores de óleo que tem essa finalidade.

JOÃO GABRIEL / Folhapress

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