Alunos de escolas municipais da zona sul de SP são proibidos de repetir frutas e lanches na merenda

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Alunos de algumas escolas da rede municipal de São Paulo estão sendo proibidos de repetir a fruta e o lanche fornecidos por uma empresa contratada pela gestão Ricardo Nunes (MDB) como a responsável pela distribuição de merendas na região do Campo Limpo (na zona sul).

O contrato entre a empresa Sepat Multi Service LTDA, sediada em Joinville (SC), e a prefeitura entrou em vigor no dia 1º deste mês e terá validade por um ano, até o final de 2025.

Este acordo é válido somente para o fornecimento de merendas em 190 instituições de ensino sob a responsabilidade da Diretoria Regional de Ensino (DRE) Campo Limpo —entre elas, as instituições de ensino infantil (CEI e EMEI) e fundamental (EMEF), educação especial (EMEBS) e de jovens e adultos (EJA).

O cardápio diário da rede pública prevê lanche, refeição e sobremesa. Para atender a DRE Campo Limpo, a prefeitura pagará quase R$ 12 milhões por mês à Sepat.

A medição que define o valor a ser pago pela prefeitura à empresa é baseada na quantidade de refeições servidas diariamente. Cabe a direção da unidade de ensino entregar este levantamento às diretorias regionais de ensino com o número de refeições servidas e, inclusive, uma observação quanto a avaliação de desempenho do serviço prestado.

A reportagem conversou com diretores de escola na região do Campo Limpo sob a condição de anonimato e também teve acesso a uma dessas medições diárias da merenda. Na planilha, o servidor inseriu a quantidade total de refeições servidas pela primeira vez e as que foram repetidas.

Na coluna de sobremesa, porém, o funcionário da escola descreveu que a empresa não liberou a repetição de frutas como melão, melancia e salada de frutas —disponibilizadas respectivamente nesta segunda-feira (4), terça (5) e quarta (6).

Uma diretora e uma professora também contam que a alimentação dos alunos autistas está sendo negligenciada pela nova empresa. Isto porque, segundo elas, a criança autista que possui seletividade alimentar não está sendo atendida de acordo com a sua demanda.

Como exemplo, uma professora contou que, nesta terça, um autista que só come arroz recebeu o prato com todos os ingredientes: feijão carioca, arroz, strogonoff de frango e batata rústica.

A prefeitura afirmou, em nota, que a Secretaria Municipal de Educação (SME) orientou para as cozinheiras sobre a necessidade de flexibilização na oferta do prato no caso de alunos com seletividade alimentar. “A Coordenadoria de Alimentação Escolar irá reforçar as orientações com todas as unidades”, diz a gestão Nunes.

A Sepat afirmou que “segue rigorosamente e estritamente o que está estabelecido no contrato realizado com a entidade contratante [no caso, a prefeitura], não havendo, por parte da empresa, atuação divergente das diretrizes.”

E, sobre as crianças com seletividade, a empresa diz que direciona “nutricionistas exclusivas para o treinamento e acompanhamento das merendeiras no preparo das dietas especiais”, diz a Sepat.

Procurada pela reportagem, a prefeitura afirmou que as refeições e as frutas como sobremesa são disponibilizadas para os alunos na quantidade que eles desejarem. “Qualquer informação diferente disso não condiz com as diretrizes da Divisão de Nutrição Escolar da Secretaria”, diz o texto.

Com relação a impossibilidade de repetir o lanche, a gestão Nunes disse que o departamento de nutrição da secretaria recomenda a oferta de um lanche para cada estudante por dia.

“Para evitar que o aluno reduza o interesse no consumo da refeição seguinte (almoço ou jantar), com maior valor nutricional. É compromisso da prefeitura o acesso a uma alimentação saudável nas escolas”, afirma a gestão Nunes.

Uma professora do Campo Limpo afirmou que há vários casos em que os alunos chegam famintos na escola, e o lanche é o primeiro alimento à disposição para saciar a fome.

Outra queixa relatada pelos servidores é que, com a troca de fornecedor, as merendeiras estavam descontentes com a nova política salarial oferecida pela nova empresa. A Sepat rebateu dizendo que segue as premissas do sindicato da categoria (SindRefeições), mas reconheceu que houve uma debandada de funcionárias no início desta semana.

“Tivemos nos dois primeiros dias número excessivo de ausências das colaboradoras, fato esse regularizado no decorrer da semana. Neste momento, possuímos reservas técnicas para cobertura”, diz a Sepat.

A região, no extremo da zona sul, está entre os dez distritos da capital com os menores indicadores do Mapa da Desigualdade, elaborado pela organização Rede Nossa São Paulo. O ranking leva em consideração indicadores em áreas como educação, habitação, saúde e trabalho e renda.

Para a nutricionista Sabrina Theil, da clínica Doutora Fit, a justificativa para vetar a repetição dos lanches faz sentido desde que seja observado a necessidade calórica do estudante. Por outro lado, ela criticou a impossibilidade do aluno em repetir a fruta.

“Pode acontecer, sim, de preferirem comer lanches ao invés de refeição completa. Mas [vetar] depende do contexto geral. A escola pública é muitas das vezes fonte de alimentação para crianças com insegurança alimentar”, afirmou Theil.

“Em relação à repetição da fruta, não vejo problema, até porque se é uma criança que vive em insegurança alimentar é uma forma de garantir a quantidade necessária de nutrientes, principalmente vitaminas e minerais”, prosseguiu a nutricionista.

Segundo a prefeitura, os lanches tanto para os estudantes da manhã ou tarde são servidos antes das refeições principais, nutricionalmente mais completas e que podem ser consumidas na quantidade desejada e repetidas por cada estudante.

“Essas refeições têm em seu cardápio arroz e leguminosa ou macarrão; carne bovina, suína, frango, ovo ou peixe e vegetal, além de frutas como sobremesa”, diz a nota da secretaria de Educação.

A pasta também ressaltou que a gestão Nunes elevou os recursos destinados para alimentação de R$ 184,2 milhões em 2021 para R$ 270,6 milhões no ano passado. Por dia, diz a prefeitura, são servidas 2,7 milhões de refeições aos estudantes da rede municipal.

A Sepat também firmou contrato com a DRE Santo Amaro pelo valor estimado de R$ 70 milhões ao ano —a prestação deste serviço deverá ocorrer a partir de dezembro.

A cidade de São Paulo é dividida entre 13 DREs, e a do Campo Limpo está entre as que mais reúne alunos matriculados e concentra o maior número de equipamentos públicos.

CARLOS PETROCILO / Folhapress

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