SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Sucesso de público no mundo literário, “Barba Ensopada de Sangue”, de 2012, escrito por Daniel Galera, enfim foi adaptado para o cinema. Sob direção de Aly Muritiba, das séries “Cangaço Novo” e de “Cidade de Deus: A Luta Não Para”, o filme compete na mostra de longas do Festival de Gramado.
“Fico muito feliz em estar de volta [a Gramado] para exibir o filme mais gaúcho dessa mostra”, disse Muritiba antes da exibição, na noite de quinta. Isso por tratar-se de um escritor gaúcho que conta a história de um jornalista gaúcho em busca do passado do avô, Gaudério. É a quarta obra de Galera que chega às telonas, com destaque para “Cão sem Dono”, pelas mãos de Beto Brant e Renato Ciasca.
Thriller soturno, estrelado por Gabriel Leone e por Thainá Duarte, o filme desloca o enredo da catarinense Garopaba, como no livro, e vai para a fictícia Armação criada na paisagem do litoral sul paulista.
“Garopaba hoje está muito diferente de quando o livro foi escrito. Não queria que as pessoas ficassem buscando elementos da cidade”, disse Muritiba, que preferiu uma praia ventosa e de mar revolto, dois elementos que dialogam com a solidão do protagonista.
O filme conta a história de Gabriel, papel de Leone, que após a morte do pai se muda para a antiga casa do avô em uma praia isolada de Santa Catarina, cuja economia do passado se baseava na caça de baleias. O trabalho se soma a uma sequência de papéis de destaque de Leone, que brilhou recentemente em “Ferrari”, de Michael Mann, e será Ayrton Senna na série da Netflix, que estreia em novembro.
Em busca da memória do avô, um homem odiado na comunidade, Gabriel também é rejeitado pelos locais. Além da companheira Beta, sua cachorra a Texas, uma boiadeiro australiano, que subiu ao palco do festival, ele cria apenas um vínculo na cidade, com Jasmin, vivida por Duarte, uma guia conhecedora de baleias que leva turistas a passeios históricos.
“Para mim, a essência dessa história se comunica com a de outros filmes que fiz, e por isso esse livro me pegou tanto. Gosto de contar a história de personagens masculinas machucadas, doídas, que tentam encontrar um caminho na escuridão”, afirmou o diretor.
Jasmin também é uma personagem vulnerável, vivendo deslocada na cidade. Duarte conseguiu imprimir um sotaque catarinense impecável à personagem, fruto de uma breve imersão da atriz em Garopaba.
A escuridão dos personagens se traduz na direção de arte e na fotografia, fria e escura, com dias quase sempre nublados.
Muritiba assume um desfecho diferente do livro. Ele afirma que o fez para contemplar o gênero cinematográfico escolhido, que dependia de uma finalização menos aberta a interpretações. Os antagonistas também ganham contornos mais definidos, enquanto no livro são sutis. São os moradores de Armação, que veem Gabriel como uma espécie de encarnação do amaldiçoado avô.
“Leio o livro muitas vezes, mas quando vou escrever o roteiro, não pego mais. Tem coisas que não sei se vêm do livro ou de mim”, disse Muritiba, que assina o texto com Jessica Sato.
Daniel Galera, presente na estreia e no debate sobre o filme, diz não ter ciúmes de suas obras, quando adaptadas. “O filme ficou lindo. Amigos desde ontem me perguntam e aí, como foi? Toda vez arranjo coisas novas para responder. Isso é sinal de que é um filme complexo. O sentimento é mais bom do que ruim, mas, às vezes, é confuso, não vou negar.”
Galera acompanhou o processo de construção do filme, como uma espécie de consultor.
Durante o festival, Muritiba também exibiu o piloto da série de “Cidade de Deus”, que estreia em 25 de agosto na Max. No ano passado, ele estreou “Cangaço Novo” também durante o evento Duarte é uma das protagonistas da série.
A premiação da mostra de longas do festival acontece no sábado (17). Nesta sexta, “Virgínia e Adelaide”, filme de Yasmin Thayná e Jorge Furtado, fora de competição, encerra o evento.
A jornalista viajou a convite do Festival de Gramado
PAULA SOPRANA / Folhapress