Anatel investiga uso de programa encontrado pela PF na Abin e que acessa rede 4G

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) abriu uma investigação após a Polícia Federal encontrar na Abin (Agência Brasileira de Inteligência) um programa com suposta capacidade de coletar dados da rede de telefonia 4G.

O programa se chama LTESniffer, e sua descoberta foi citada na decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que autorizou busca e apreensão contra o deputado federal Alexandre Ramagem, ex-diretor da Abin no governo de Jair Bolsonaro (PL).

Um trecho da representação do delegado do caso, transcrito por Moraes, fala da necessidade do “devido aprofundamento” sobre o programa encontrado na agência.

A Abin disse que não faz ações invasivas contra redes e que “realiza estudos sobre o funcionamento da ferramenta para preservar a segurança cibernética do país”.

Após a citação na decisão de Moraes, a Anatel instaurou uma apuração e irá solicitar dados para a Abin sobre o uso da LTESniffer.

As operadoras foram notificadas e questionadas sobre eventual utilização de ferramentas desse tipo para saber se houve ataques às suas redes. Após as repostas, a Anatel vai definir os próximos passos.

A agência de telecomunicações também está em contato com a Abin para entender por que a agência de inteligência possui o programa.

O 4G, também conhecido como LTE, é um tipo de tecnologia por meio de ondas de rádio para comunicação de equipamentos sem fio, como celulares.

O LTESniffer, de acordo com informações em grupo de discussão sobre o tema, tem capacidade de detectar o tráfego de dados entre as antenas que transmitem as ondas de 4G.

A tecnologia, no entanto, não consegue capturar as comunicações criptografadas, embora consiga acessar algumas informações como o IMSI, que é a identidade internacional do assinante do celular. É o número que identifica cada usuário da rede.

A capacidade de invasão da rede de telefonia brasileira por softwares é um dos principais pontos da investigação em andamento na PF e que mira a suposta Abin paralela durante a gestão Bolsonaro.

Nesse caso, está no centro das apurações outro software, o FirstMile -a PF afirma que ele invade a rede de telefonia para acessar a geolocalização dos celulares monitorados.

Como mostrou a Folha, um dos elementos de prova indicados pela PF é uma troca de email em que um funcionário da empresa responsável pelo FirstMile relata tentativa de invasão na rede da Tim.

As investigações na Anatel ainda buscam informações sobre quais dados foram acessados, em qual volume e de qual país partiram os ataques.

O LTESniffer atua de forma diferente do FirstMile, mas também usa dados protegidos pelo sigilo e cujo acesso depende de autorização prévia da Justiça.

No caso do FirstMile, a ferramenta, diz a PF, usa a “estrutura de telefonia no exterior (SS7) para simular chamadas em roaming, inclusive valendo-se de envios de SMS Spoofing, resultando na manipulação dos sinais da rede de telefonia”.

A PF afirma que, desde o início, a Abin sabia do caráter invasivo do software e de sua capacidade de invadir a rede de telefonia nacional.

Para os investigadores, já na proposta comercial a empresa vendedora informou que a ferramenta usa técnicas para acessar a rede de telefonia.

Nas investigações feitas até o momento, a Anatel não conseguiu mapear quais dados e qual a origem dos ataques às redes das operadoras brasileiras.

As operadoras, afirma a Anatel, corrigiram as falhas que permitiam a atuação do FirstMile antes de março de 2023, quando o caso veio a público em reportagem do jornal O Globo.

“Os autos da apuração não conseguem concluir quando ou se as operadoras Claro, Vivo e Tim realmente perceberam os ataques de invasão por meio do FirstMile. No entanto, quando a Anatel iniciou os processos de investigação para esclarecer o que havia sido noticiado, foi identificado que medidas de proteção já haviam sido implementadas pelas operadoras em um passado recente”, disse a agência.

O uso do software espião e a produção de relatórios de inteligência sobre adversários políticos da família do ex-presidente Bolsonaro estão na mira da Polícia Federal. As operações deflagradas tentam esclarecer a atuação da chamada “Abin paralela” do governo Bolsonaro na gestão de Ramagem, hoje deputado federal.

Os investigadores afirmam que oficiais da Abin e policiais federais lotados na agência monitoraram os passos de adversários políticos de Bolsonaro e produziram relatórios de informações “por meio de ações clandestinas” sem “qualquer controle judicial ou do Ministério Público”.

A Abin disse em nota que não realiza ações invasivas contra redes. Segundo a agência, o “LTESniffer é um software de código livre, gratuito, que, de acordo com o desenvolvedor, seria capaz de obter informações trafegadas pelo protocolo LTE, utilizado na comunicação celular”.

A Abin afirma que o programa é conhecido por ser utilizado por serviços de inteligência estrangeiros e também para realizar ataques cibernéticos contra órgãos da administração pública federal.

Por isso, diz a Abin, a agência realiza estudos sobre o “funcionamento da ferramenta para preservar a segurança cibernética do país”, já que cabe aos oficiais de inteligência estarem atualizados sobre os “métodos utilizados por agentes adversos contra o Estado brasileiro.”

“A Agência Brasileira de Inteligência não realiza ações invasivas contra redes. Na verdade, a agência atua na ponta oposta: a área de segurança cibernética detecta possível uso de ferramentas por atores maliciosos contra redes da agência ou de algum órgão do Estado”, diz nota enviada à Folha de S.Paulo.

FABIO SERAPIÃO / Folhapress

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