RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) não vai criar nenhuma medida com o objetivo de prejudicar os beneficiários de planos de saúde no país, afirma o diretor-presidente do órgão regulador, Paulo Rebello, em entrevista à reportagem.
A declaração é uma resposta às críticas que a agência recebeu nos últimos dias por colocar em debate um pacote de ações que abre margem para mudanças na política de preços dos serviços.
Um dos pontos mais contestados por representantes dos consumidores é a possibilidade de planos individuais e familiares terem reajustes excepcionais mediante a comprovação de desequilíbrio econômico-financeiro nos contratos.
Caso a proposta avance, Rebello diz defender a fixação de “ciclos” para que as operadoras possam pedir a revisão técnica. Os “ciclos”, segundo ele, podem chegar a cinco anos.
Durante o período, as empresas ficariam impossibilitadas de obter mais de uma revisão em um mesmo contrato. “São questões que a gente precisa ainda estudar, mas defendo isso. Ou seja, não seria a cada ano apresentar uma revisão técnica”, afirma o diretor-presidente.
Ele também defende a ideia de que os reajustes excepcionais, se aprovados, sejam parcelados ou diluídos ao longo do prazo. A intenção seria atenuar o impacto para as famílias.
“Esses cinco anos seriam o tempo em que haveria a diluição [do aumento] caso a agência venha a autorizar o reajuste da revisão técnica.”
A possibilidade estaria condicionada à definição de requisitos que caracterizam ameaça ao equilíbrio das operadoras. “Você [empresa] precisa justificar e demonstrar perante a agência qual foi o motivo desse desequilíbrio”, aponta Rebello.
Em agosto, a ANS contabilizou quase 8,8 milhões de beneficiários de planos de saúde individuais e familiares no país. O contingente equivale a 17,1% do total de 51,4 milhões de consumidores de planos de assistência médica a maioria é atendida por contratos coletivos (42,6 milhões).
No caso dos planos individuais ou familiares, a ANS aprova, anualmente, um limite para os reajustes. Neste ano, o índice máximo autorizado foi de 6,91%. Já o aumento médio dos planos coletivos foi de 13,8%.
MUDANÇAS EM PLANOS COLETIVOS
A ANS também propõe mudanças nas modalidades coletivas.
Uma delas é a definição de uma cláusula padrão que trate dos critérios dos reajustes. O objetivo seria dar ao consumidor maior transparência sobre o cálculo realizado para a definição dos percentuais.
Ainda nos planos coletivos, outra medida levada para a discussão é a ampliação de agrupamentos, hoje compostos por contratos com até 29 beneficiários. O objetivo seria diluir riscos e obter aumentos “mais equilibrados”.
“Nos contratos coletivos acima de 29 vidas, a gente via um comportamento um pouco mais homogêneo com relação ao reajuste divulgado pelo setor, enquanto esses contratos de até 29 vidas tinham uma certa discrepância”, afirma Rebello.
“Obviamente, com um grupo menor e talvez uma situação de medicamento com custo ou tratamento mais caro em algum desses pacientes, você acaba tendo um repasse maior no valor da mensalidade”, acrescenta.
CRÍTICAS DE CONSUMIDORES
O pacote de possíveis alterações foi tema de audiência pública no dia 7 de outubro. O evento online foi marcado por uma série de críticas de beneficiários e representantes dos consumidores.
Eles reclamaram dos serviços prestados por operadoras no país e da forma como as mudanças foram colocadas em discussão pela ANS.
Uma das queixas envolveu a suposta pressa na condução do processo. A agência anunciou em 27 de setembro a aprovação do projeto de reformulação da política de preços e a realização da audiência pública no início de outubro.
Rebello diz que o tema já vinha no radar do órgão, mas afirma que o debate ainda está em fase inicial.
Segundo ele, a intenção é assegurar que o beneficiário “não sofra” com a paralisação de serviços em caso de dificuldades financeiras e falência de operadoras.
“Obviamente, a agência em nenhum momento vai estar criando qualquer medida que seja com o intuito de prejudicar o consumidor, muito longe disso”, declara.
Ainda não há uma data definida para a conclusão das discussões. A próxima etapa do processo, conforme o diretor-presidente, é a tomada pública de subsídios.
Nessa fase, interessados poderão enviar sugestões e críticas por meio de um formulário no site da ANS. A expectativa é divulgar o documento a partir de quarta-feira (16), segundo Rebello.
“Estamos abertos ainda a esse processo de transparência, para que as pessoas possam apresentar as suas razões e as suas opiniões relacionadas à proposta que a gente está colocando”, diz.
Uma das entidades que criticaram a ANS foi o Idec (Instituto de Defesa de Consumidores). Em nota, o coordenador do programa de saúde do Idec, Lucas Andrietta, disse que o conjunto de propostas atende apenas a interesses do setor regulado, não incorporando nenhuma reivindicação relevante e historicamente defendida pela sociedade civil.
“Distorce prioridades e falha em demonstrar a causalidade entre problemas e soluções”, afirmou.
O instituto também disse considerar inapropriado discutir em uma mesma audiência “temas tão complexos e com grande potencial negativo às pessoas consumidoras”.
Na visão da entidade, a iniciativa abre brechas para “abusividades” contra os usuários.
VEJA AS PROPOSTAS DE MUDANÇAS DA ANS
Revisão técnica de preços de planos individuais/familiares: estabelecer requisitos para que operadoras possam ter reajustes excepcionais para o conjunto da carteira individual em razão de desequilíbrio econômico-financeiro em determinado contrato.
Reajuste de planos coletivos: ampliar tamanho dos agrupamentos, hoje compostos por contratos com até 29 beneficiários, para maior diluição do risco e obtenção de reajustes mais equilibrados; dar ao consumidor maior transparência sobre o cálculo realizado para a definição do percentual de reajuste.
Coparticipação e franquia: definição do percentual máximo que poderá ser cobrado por procedimento; definição dos limites financeiros mensal e anual; definição dos procedimentos não elegíveis (sobre os quais não poderá haver cobrança por realização).
Venda online: obrigatoriedade da venda de planos via internet, a fim de facilitar o acesso dos consumidores a diferentes opções de produtos, de forma rápida.
Planos exclusivamente ambulatoriais: revisão das regras atuais a fim de incentivar a venda de planos com cobertura para realização de consultas e exames de forma segura para o consumidor.
LEONARDO VIECELI / Folhapress