SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Algas, fungos e briófitas, alguns deles centenários, estão de mudança. Mas não vão longe. Eles permanecerão dentro do Jardim Botânico, na zona sul paulistana, porém em um espaço só para eles.
O Instituto de Pesquisas Ambientais (IPA) começou em agosto deste ano a realocar aproximadamente 240 mil amostras de 3 das suas 18 coleções científicas -juntas, somam mais de 630 mil amostras. Antes, elas eram acondicionadas, havia algumas décadas, de forma improvisada em um andar, suscetíveis a incêndios e sem proteção da luz. A expectativa é concluir a transferência até o primeiro semestre do ano que vem.
A nova casa das amostras, cujo valor é estimado em cerca de R$ 20 milhões, fica no térreo do IPA, vinculado à Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil). A concessionária do Jardim Botânico, a Reserva Paulista, desembolsou R$ 900 mil para a readequação do espaço, e a Fapesp, R$ 70 mil para a transposição dos acervos.
As três coleções, com amostras de mais de cem países, estavam dispersas junto a salas de pesquisa, o que prejudicava o tratamento das amostras e expunha os funcionários a poeira e a resíduos de venenos utilizados no tratamento de pragas que atacam as coleções. A mudança era uma reivindicação tanto de integrantes do instituto quanto de pesquisadores que visitavam o local.
“As coleções científicas registram não só as espécies existentes em uma região, neste caso principalmente o estado de São Paulo, mas também características na sua época. Elas são testemunhas da história do nosso meio ambiente”, diz o coordenador do IPA, Marco Aurélio Nalon. “Daí, a importância de mantê-las em estruturas adequadas, protegidas da ação do tempo, para que possam ser acessadas por quem deseja estudá-las.”
Entre as amostras há, por exemplo, a de um gênero de musgo encontrado na região da avenida Paulista antes da construção da via, inaugurada em 1891.
“Quando bem cuidadas, sem umidade e protegidas da luz e insetos, as amostras podem durar milhares de anos”, afirma Denilson Peralta, diretor do Núcleo de Coleções Biológicas, Geológicas e Paleontológicas do IPA.
Só a coleção de briófitas reúne 160 mil amostras de 1.600 espécies. Segundo os pesquisadores, elas servem de indicadores da qualidade do ar e do solo, sinalizando com sua presença a ausência de poluentes, além de fornecerem dados que permitem avaliar os efeitos da atividade humana sobre o meio ambiente ao longo do tempo.
“A briófita é uma planta pioneira. Foram elas as primeiras plantas a conseguir ocupar o ambiente terrestre. Elas conseguem se estabelecer em rochas, lugares onde nenhuma outra planta consegue ocupar. Começam a reter água e vão gerando substrato, um ambiente que serve de habitat para outras espécies”, diz Aline Maganhato, professora de ciências biológicas da Esalq/USP.
A biológa e pesquisadora Adriana Gugliotta, 58, organiza amostras no setor de fungos e herbáceas no IPA, no Jardim Botânico Eduardo Knapp Folhapress A biológa e pesquisadora Adriana Gugliotta, 58, organiza amostras no setor de fungos e herbáceas no IPA, no Jardim Botânico **** Muitas vezes a pesquisa de determinada espécie é realizada a partir de um exemplar que só existe em registro no herbário, pois está extinta na natureza.
“É por isso que as coleções são importantes. Elas são um catálogo da nossa biodiversidade e de muita coisa que inclusive já foi perdida”, afirma Maganhato.
As coleções do IPA contêm 30 mil amostras de algas e 50 mil de fungos e são as maiores desses grupos do Brasil. Embora distintos, algas e fungos têm em comum uma infinidade de cores e formas. Em alguns casos estabelecem uma interação entre si. Enquanto fungos vivem na umidade e se alimentam de matéria orgânica em decomposição, as algas usam a luz para obter alimento e em sua maioria são unicelulares e aquáticas.
A associação entre algas e fungos pode ser vista em troncos de árvores, muros, pedras e paredes, onde surgem como círculos, os líquens -estes usados na composição de perfumes, remédios e em pesquisas pela propriedade antitumoral de alguns. Por não sobreviverem em ambientes poluídos, assim como as briófitas, esses seres são considerados um indicador de boas condições ambientais.
“[As algas] são as principais produtoras de oxigênio do planeta, muito mais do que as plantas”, diz Maganhato. “A maioria do oxigênio do ar vem da fotossíntese das algas, que compõem o fitoplâncton, organismos que ficam nas camadas da água dos oceanos.”
Além disso, as algas, em seus cerca de 10 mil tipos, são usadas como matéria-prima para fertilizantes, adubos, ingredientes na culinária, além de conferir consistência pastosa ou em gel como estabilizantes e emulsificantes em sorvetes, gelatinas, pasta de dente e cremes.
Os fungos, por sua vez, com cerca de 100 mil espécies entre unicelulares (microscópicos) e multicelulares, têm papel de decompositores de matéria orgânica (plantas e animais) e, no processo de obtenção de alimento, eles disponibilizam nutrientes no solo, que as plantas absorvem. Na indústria são usados como fermento, em cervejas e pães e, na medicina, na produção de penicilina.
EXEMPLARES MAIS ANTIGOS DAS TRÊS COLEÇÕES
Fungo: Polyporus gaudichaudii Lév., de 1837
Origem: Singapura
Alga: Nitella gollmeriana, de 1903
Origem: Brasil (São Paulo)
Briófita: Climacium dendroides, de 1828
Origem: Reino Unido
Como visitar o acervo
Agendar previamente pelo email [email protected]. As visitas são abertas a estudantes de graduação e pesquisadores de algas, briófitas e fungos.
DENISE BRITO / Folhapress