SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Capitão, estou contigo em tudo, menos o Nunes banana, vou de Marçal”, comentou no Instagram o usuário Edmilson Meyrelles em uma publicação do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) com um vídeo em que Jair Bolsonaro (PL) reitera seu apoio a Ricardo Nunes (MDB), nesta segunda-feira (19), depois do flerte com Pablo Marçal (PRTB) na última semana.
Para a maior parte dos políticos e estrategistas bolsonaristas ouvidos pela reportagem, o ex-presidente, que não costuma aceitar bem traições no seu grupo político, não tem que se preocupar com a rebelião de seu exército em São Paulo.
Na opinião deles, a preferência por Marçal mesmo após a aliança selada com Nunes não tem a ver com um eventual enfraquecimento da liderança de Bolsonaro na direita radical e tampouco é sinal de que o conservadorismo cresceu para além de sua órbita. Quer dizer, apenas, que o influenciador representa valores caros a esse público, enquanto o prefeito não -e nem tenta, segundo críticos.
Além disso, aliados de Bolsonaro admitem que, sim, ele deu uma série de sinais a Marçal que não passaram despercebidos por seu público -de certa forma, ele próprio teria fomentado a deserção.
Nesta segunda-feira, Marçal divulgou um vídeo de recado a Bolsonaro em que expressa em parte o pensamento desse eleitor bolsonarista fiel ao ex-presidente, mas que escolheu o influenciador. Ele próprio pede perdão a Bolsonaro, mas diz que não vai retroceder.
“Deixo claro meu respeito a você [Bolsonaro], mas o povo de São Paulo não vai prestar continência nem pra vagabundo de Boulos nem pro banana do Nunes, que é um comunista com seu secretariado nojento”, afirmou.
“Me perdoe, você sabe o carinho e o respeito que eu tenho por você”, completa Marçal, mencionando que Bolsonaro deu a palavra ao PL, ou seja, que seu acordo partidário é em torno de Nunes.
Também nesta segunda, Marçal afirmou que São Paulo não quer saber de indicações e que concorre sem padrinho político, assim como fez Bolsonaro, a quem chamou de capitão, em 2018.
“O eleitor de esquerda é bem gado. Segue sempre um jumento. Agora o de direita é livre, segue princípios e valores. Todo mundo sabe que o Nunes é um banana, que não segue esses princípios”, completou.
Há, no entanto, quem tenha avaliação contrária. De que o voto bolsonarista em Marçal em vez de Nunes aponta para um futuro em que Bolsonaro perderá o monopólio do eleitor conservador, ainda que ele tenha sido o primeiro desde a redemocratização a canalizar essa força social.
Sustenta essa tese o surgimento de outros líderes na direita num contexto de inelegibilidade de Bolsonaro em 2026, incluindo governadores como Ratinho Júnior (PSD-PR), Romeu Zema (Novo-MG), Ronaldo Caiado (União Brasil-GO) e o próprio Tarcísio, que até agora manteve a fidelidade do eleitor bolsonarista apesar de rejeitar partes da cartilha.
O próprio Marçal seria um risco para o domínio de Bolsonaro, considerando que, no passado recente, o autodenominado ex-coach fez críticas ao ex-presidente.
Quem convive com a família Bolsonaro minimiza as divisões na direita e afirma que não há aflição da parte deles com uma eventual derrota para o próprio bolsonarismo -o que pode acontecer em São Paulo, se Marçal ultrapassar Nunes, mas também em outras oito capitais em que o eleitor do PL se dividiu.
Alguns políticos fieis a Bolsonaro dizem que, no fim da campanha, o ex-presidente vai demonstrar ter maioria. A aposta é a de que, ao pesquisarem a experiência de Nunes e de Marçal, a maior parte dos bolsonaristas acabará optando pelo prefeito.
Para auxiliares do ex-presidente, cabe mais a Nunes do que a Bolsonaro frear o fluxo de votos para Marçal. Eles cobram que o emedebista convide Bolsonaro para a campanha, inclua seu entorno nas decisões estratégicas e, sobretudo, demonstre ao eleitor alinhamento com o conservadorismo.
Nesta segunda, Nunes deu mais um gesto contrário ao não confirmar presença na manifestação bolsonarista contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF, prevista para o 7 de Setembro.
“A direita só tem um líder. O nome dele é Jair Bolsonaro. Quem não entender o tamanho de Bolsonaro está fadado a perder a eleição”, diz à Folha Fabio Wajngarten, advogado e auxiliar do ex-presidente.
Analistas ponderam, entretanto, que, em eleições municipais, nem sempre o padrinho nacional consegue direcionar votos para seu escolhido, dado que a realidade local também pesa.
Até agora, a influência de Bolsonaro dá mostras de resiliência segundo a pesquisa Datafolha de agosto, já que 38% dos eleitores do ex-presidente escolhem Nunes enquanto 29% escolhem Marçal (eram 22% em julho).
“O pensamento da direita é livre. O eleitor vê no comportamento do Marçal valores muito semelhantes aos de Bolsonaro em relação à família, Deus, liberdade, combate ao comunismo”, afirma à Folha Filipe Sabará, um dos coordenadores da campanha do influenciador.
Essa visão é exposta por eleitores do ex-presidente nas redes sociais e em grupos de WhatsApp -não há pudor em declarar um voto que o contrarie pois isso não seria um rompimento. Na publicação de Tarcísio, um seguidor comenta que “bolsonarista de verdade vota em Marçal”.
Esses eleitores entendem que Bolsonaro está refém do PL de Valdemar Costa Neto, que forçou a aliança pragmática com Nunes. O ex-presidente foi convencido de que a direita bolsonarista não venceria sozinha e, por isso, optou pelo candidato à reeleição como forma de evitar uma vitória de Guilherme Boulos (PSOL).
Entre os sinais enviados por Bolsonaro a Marçal, está a entrega da medalha de “imbrochável” ao influenciador em junho.
Mais recentemente, após Nunes ter gravado uma vinheta para a candidata a vereadora Joice Hasselmann (Podemos), considerada traidora no bolsonarismo, o ex-presidente e seu filho Eduardo Bolsonaro (PL-SP) reagiram com declarações favoráveis a Marçal e desencorajadoras para Nunes.
Foi essa crise que levou aliados de Bolsonaro e emedebistas a agirem por uma reaproximação, que gerou a série de declarações públicas de apoio do ex-presidente a Nunes desde o fim de semana.
Segundo Nunes afirmou nesta segunda, Marçal foi “criando uma história” de que Bolsonaro e Tarcísio o apoiavam e “se fez necessário uma vacina para reafirmar aquilo que já estava afirmado”.
CAROLINA LINHARES / Folhapress