PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – A leve redução no nível do lago Guaíba já começa a deixar evidentes os rastros de sujeira e poluição nas ruas de Porto Alegre.
A reportagem percorreu diferentes vias do centro da capital gaúcha e verificou que a água está baixando, mas em uma velocidade muito aquém da desejada pela população.
No bairro Praia de Belas, próximo à rua André Belo, foram encontrados peixes vivos nadando livremente próximos às vias que registraram alagamentos de mais de 1,5 metro. Foi no bairro vizinho, Menino Deus, que um jacaré de pequeno porte foi avistado na terça-feira (7).
Já na rua Uruguai, no coração do centro histórico de Porto Alegre, cinco peixes mortos boiavam em um trecho da calçada, na parte mais rasa.
Depois de atingir 5,32 metros na segunda-feira (6), o nível do Guaíba caiu abaixo de 5 metros pela primeira vez na semana, marcando 4,86 metros às 18h15.
Caminhando com um macacão impermeável que vestia até o peito, o estoquista Henrique Xavier circulava pela rua Uruguai para confirmar a altura da água dentro de uma das lojas que atende. Segundo ele, a inundação alcançou 1,6 metro na frente da loja.
Uma quadra abaixo, nas proximidades do prédio histórico que sediava a administração municipal, as placas de ruas e de regras de trânsito parecem boiar.
“Da esquina para a frente, só de barco”, disse Henrique. “Próximo da prefeitura, nem dá pé”. Ele estava certo: logo que concluiu a frase, uma embarcação passou ao longe, navegando sobre o largo em frente ao edifício antigo. Minutos depois, bombeiros entraram na água com um bote e seguiram o caminho que Henrique não conseguiu fazer caminhando.
Em diferentes pontos do centro, visitados entre segunda (6) e esta quinta, ele diz ter anotado uma redução de “quatro dedos” na marca da água.
Henrique comprou o macacão com estampa camuflada na cidade vizinha de Alvorada, em uma loja de pescaria. Segundo ele, há uma demanda muito grande por peças do tipo. “Não tinha a pronta entrega. Demorou três dias para vir e custou R$ 300.”
No bairro Praia de Belas, sede de instituições como o Tribunal de Justiça, o Foro Central de Porto Alegre e o Tribunal de Justiça Militar, muitos moradores tiveram que deixar seus carros estacionados dentro dos prédios ou na rua por causa da elevação muito rápida do nível da água na segunda-feira (6).
Na falta de régua ou trena, o registro do nível da água é feito da forma que dá. De dentro de um dos edifícios alagados, um morador conta que conseguiu verificar uma redução de “três dedos” na enchente.
Na esquina da rua Demétrio Ribeiro com a General Auto, uma pichação no asfalto marca onde o alagamento chegou na terça (7). Naquele trecho, a inundação alcançou as calçadas, e na quinta-feira já havia um recuo parcial. Agora, com a água mais baixa, o que ficou foi uma fina camada de lama seca nas lajotas.
Pela rua dos Andradas, polo comercial e cultural do centro, detritos acumulados em frente às fachadas de bazares, lojas de vestuário e galerias evidenciam o estrago.
Caminhando nas vias paralelas à Voluntários da Pátria, região de comércio popular, é possível constatar novamente o impacto para lojistas da cidade. Pouca gente circula pelo local, mas há vendedores ambulantes em várias esquinas com pequenos engradados de água gaseificada para vender. A versão sem gás, hoje, é uma raridade na cidade de quase 1,5 milhão de habitantes.
Antes de circular pela rua Uruguai, Henrique Xavier desceu a Pinto Bandeira de macacão para ver onde chegou a enchente na loja de sapatos em que trabalha. Ele conta que ali a água batia em sua cintura e que haverá muita perda de mercadoria.
“A gente começou a subir as coisas superficialmente na sexta-feira [3] e quando a gente pensou em voltar para a loja no sábado, a água já estava dentro”, disse.
No Pop Center, shopping popular que tem terminais rodoviários no térreo, a água estava na metade de suas costelas, ele conta. A partir daquele ponto, preferiu não continuar a caminhada. Na rua Júlio de Castilhos, via paralela para onde os ônibus do terminal saem, muitas lojas estão com todo o primeiro andar submerso.
A inundação também afetou o nível do arroio Dilúvio, curso dágua que divide Porto Alegre ao meio, vindo do extremo leste e desembocando no Guaíba. A água ainda está muito alta, mas já é possível ver parte da vegetação ribeira amarelada, “queimada” pela água suja.
CARLOS VILLELA / Folhapress