BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A venda da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), capitaneada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), deve encerrar o ciclo das grandes privatizações de saneamento no país no curto prazo.
Nos próximos anos, as operações devem ser dominadas pelas concessões feitas por municípios ou por leilões de grupos de cidades.
As concessões em âmbito municipal devem ser vistas especialmente em estados que combinam grande número de cidades e população significativa. Estão nesse grupo Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo.
A proximidade entre os municípios favorece a criação de arranjos regionais com população suficiente para tornar o projeto atrativo para a iniciativa privada.
A regionalização é prevista na atual legislação do setor e aumenta o ganho de escala das operações porque a densidade populacional é um fator chave para a lucratividade de cada empreendimento.
Entre as principais operações esperadas no âmbito municipal estão as das cidades do interior paulista. Para o setor, a própria Sabesp privatizada é vista como uma concorrente forte para esses leilões.
Em São Paulo, o governo estadual tem incentivado as operações por meio do programa UniversalizaSP. A iniciativa dá assistência técnica para que mais de 100 municípios decidam a melhor forma de repassar o serviço de saneamento ao setor privado de forma a acelerar as metas de universalização no estado.
De acordo com o governo de São Paulo, seriam necessários mais três décadas para universalizar o serviço de água e esgoto no estado caso a média de investimentos dos últimos cinco anos fosse mantida.
Nos outros estados, os municípios esperavam um apoio mais forte por parte dos governos estadual ou federal nas discussões, principalmente na organização do processo de regionalização.
Sem esse apoio, as cidades maiores tendem a escolher caminhar sozinhas e conceder individualmente seus serviços de água e esgoto. Entre especialistas, a visão é que esse caminho ameaça a regionalização e a eficiência do modelo.
“Os municípios cansaram de esperar e estão buscando alternativas próprias. Por um lado é bom porque dinamiza o mercado, mas por outro pode afetar o desempenho da regionalização”, ponderou o diretor executivo da Abcon Sindicon (Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto), Percy Soares.
Como em muitos casos a concessão municipal não gera receitas suficientes a ponto de atrair interesse das empresas, a tendência é que seja adotado em grande parte para as cidades o modelo de PPP (parceria público-privada).
Na prática, a PPP funciona como um contrato entre o poder público e uma empresa privada para realizar os investimentos necessários para ampliar a rede de esgoto e água. Em troca, o Estado remunera o parceiro privado.
O modelo é diferente da concessão, quando o dinheiro para a companhia privada vem exclusivamente da tarifa cobrada pelo serviço de água e esgoto.
“No novo ciclo que se inicia, vamos ver um movimento muito pró-PPP em projetos municipais. Esse deve ser o tom do mercado”, acrescentou.
Já no nível estadual, dois caminhos devem ser trilhados nos próximos anos.
Em um, é feita a concessão apenas dos serviços de distribuição de água e captação do esgoto -ficando com o governo a chamada produção da água (processo em que ela é purificada para o abastecimento público). No segundo, são estruturadas PPPs.
As duas rotas preservam as empresas estaduais de saneamento e, por isso, têm menos percalços do que a privatização pura e simples.
“Onde tem uma estatal que não vai ser privatizada, uma das formas de garantir a sua existência é deixar a captação e produção de água a cargo dela”, explicou a sócia de infraestrutura do Stocche Forbes, Mariana Saragoça.
O Paraná já ofertou um bloco na modalidade de PPP, com investimento esperado de R$ 1,2 bilhão, e tem outros dois a caminho. A expectativa no setor é de que essa trilha também será a escolhida por Bahia, Ceará e Rio Grande do Norte.
Já a concessão de parte dos serviços de saneamento deve ser a rota do Pará, Pernambuco e Sergipe.
Depois da Sabesp, especialistas veem no horizonte chance de privatização somente da Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais). Mas, nesse caso, o percurso promete ser mais conturbado. No momento, é estudada a federalização da estatal mineira, com uma possível privatização em um segundo momento.
O marco legal do saneamento, sancionado em 2020, definiu 2033 como meta para a chamada universalização do serviço –o objetivo, no caso, é fornecer água para 99% da população e coleta e tratamento de esgoto para 90%.
“Em 2023, praticamente não teve nenhum grande projeto. Foi um hiato já esperado pela mudança de governo e pela discussão dos decretos que regulam o marco. Mas em 2024 o processo deve ser retomado”, disse Saragoça.
LUCAS MARCHESINI / Folhapress