Apuração indica que partido governista deve perder maioria na África do Sul

JOANESBURGO, ÁFRICA DO SUL (FOLHAPRESS) – A apuração parcial da eleição sul-africana nesta quinta-feira (30) indica um revés histórico para o CNA (Congresso Nacional Africano), que governa desde o fim do apartheid, em 1994, e deve pela primeira vez perder a maioria dos votos.

Até as 19h de Brasília, com 48,1% das urnas apuradas, o CNA, do líder Nelson Mandela (1918-2013), tinha 42,8% dos votos. A persistir o cenário, tido como provável por analistas, não chegará a 50% e será obrigado a buscar parceiros para formar uma coalizão e seguir no poder. Na última eleição, em 2019, a legenda obteve 57,5%.

Em segundo lugar aparece o partido de centro-direita Aliança Democrática, com 23,5%, patamar ligeiramente superior ao que indicavam as pesquisas. No pleito anterior, a AD obteve 20,77%.

Em seguida, praticamente empatadas, estão duas siglas populistas de esquerda que surgiram a partir de dissidências do CNA: o o MK, do ex-presidente Jacob Zuma (2009-2018), com 10,2%, e o Combatentes da Liberdade Econômica (CLE), com 9,4%.

Diversos partidos de menor expressão vêm a seguir na apuração –52 concorreram na eleição para o Congresso, que por sua vez elegerá o presidente pelos próximos cinco anos.

O cenário, se confirmado, terá o efeito de um terremoto político no país, com repercussões em toda a África. Não é comum, afinal, um partido de libertação nacional, como é o CNA, ser rechaçado dessa forma pelos eleitores no continente.

Na atual eleição, o CNA pagou o preço pelo desgaste de 30 anos no poder, em que se acumularam acusações de corrupção e incompetência na gestão do país. A África do Sul tem níveis recordes de desemprego e criminalidade, além de sérios problemas de infraestrurura, com sucessivos apagões, por exemplo.

A depender do impacto da derrota, o próprio presidente do país, Cyril Ramaphosa, pode ser sacrificado, bastando para isso uma decisão do partido. Nesse caso, o mais cotado para assumir o comando da legenda, e do país, seria seu vice, Paul Mashatile.

De forma geral, o CNA terá dois caminhos para se manter no poder: uma aliança com a AD, segunda colocada na eleição, o que daria uma feição moderada e pró-mercado ao governo, ou fazer o movimento oposto, coligando-se com um dos partidos populistas de esquerda.

Nesse caso, o país certamente sofreria forte rejeição de investidores, uma vez que o MK e o CLE defendem, por exemplo, a estatização de bancos e minas e a expropriação sem compensação de terras.

Em declarações dadas durante a apuração, líderes do CNA evitavam o clima de derrota e pediam paciência. “O resultado vai determinar se devemos discutir coalizões”, disse Gwede Mantashe, presidente do partido.

Um dos maiores vencedores da eleição foi Zuma, que mostrou grande força eleitoral, apesar de ter sua candidatura barrada por ter sido condenado judicialmente. Seu partido, recém-criado, teve expressiva votação nacional e deve vencer com larga margem na província de Kwa-Zulu Natal, bastião do ex-presidente.

Sua filha Duduzile Zuma-Sambudla descartou a princípio participar de uma coalizão com o CNA, mas deve haver tratativas entre as duas legendas, apesar de pesadas trocas de acusação de lado a lado na campanha.

O CNA também registrou derrotas em algumas das nove províncias nas quais o país está subdividido, equivalentes aos estados brasileiros.

Além de KwaZulu-Natal, perdeu para a AD no Cabo Ocidental, onde fica a Cidade do Cabo. Essa era uma derrota esperada, no entanto, uma vez que a região já é administrada pelo partido de oposição.

Mais preocupante para o CNA, porém, é a possível perda em Gauteng, centro econômico e político do país, onde estão Joanesburgo, maior cidade sul-africana, e a capital administrativa, Pretória. A disputa estava apertada, com 35,1% para o partido governista e 29,1% para a AD. Em 2019, o CNA teve maioria milimétrica de 50,19% na província.

Os resultados finais devem ser divulgados pela comissão eleitoral no próximo domingo (2).

A eleição realizada na quarta-feira (29) teve filas longas e diversos problemas de organização, o que fez a votação ser estendida para além do prazo previsto, de 21h.

O comparecimento deve ficar em torno de 58%, um pouco abaixo das projeções iniciais, de que poderia passar de 60%. Isso pode ser atribuído em parte ao fato de que muitos desistiram de votar em razão do caos nas zonas eleitorais.

A África do Sul tem hoje uma das mais altas taxas de desemprego do mundo (32%) e uma crise energética que por vezes deixa a população sem eletricidade por mais de dez horas por dia.

O país, um dos maiores produtores mundiais de ouro e platina, recebe turistas do mundo inteiro em seus modernos aeroportos, mas, segundo o Banco Mundial, é um dos mais desiguais do planeta, com milhões de pessoas ainda vivendo abaixo da linha da pobreza.

FÁBIO ZANINI / Folhapress

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