BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Sob uma insistente crise econômica, os argentinos vão às urnas neste domingo (13) escolher que políticos disputarão a Presidência do país nas eleições em outubro. Mais do que isso, porém, testarão o poder de fogo das principais forças do tabuleiro político atual e apontarão o nome que poderá liderar a oposição de direita nos próximos anos.
As primárias têm como função solucionar eventuais disputas internas de um mesmo partido, convocando os próprios eleitores a escolherem os candidatos que representarão a legenda que apoiam no pleito oficial. Com os nomes praticamente consolidados do lado do peronismo e da ultradireita, o resultado mais aguardado é o da coalizão Juntos por el Cambio, na qual competem o chefe de governo de Buenos Aires, Horacio Larreta, mais de centro, e a ex-ministra de Segurança Patricia Bullrich, mais linha-dura.
Até aqui, ninguém arrisca dizer quem é o favorito na aliança de direita sem algum grau de ponderação. Isso porque as pesquisas publicadas até a última semana, o limite estabelecido pela legislação eleitoral, apontavam resultados muito próximos e ao mesmo tempo variantes, com ambos flutuando em torno de 15% a 17% das intenções de voto.
Quem ganhar terá grandes possibilidades de chegar a um eventual segundo turno, já que a Juntos por el Cambio vinha aparecendo levemente à frente nas sondagens. Logo atrás estavam as coligações União pela Pátria, pela qual concorre o ministro da Economia, Sergio Massa, e, em seguida, A Liberdade Avança, liderada pelo deputado ultraliberal Javier Milei.
Tanto Massa quanto Milei se esforçam para angariar a maior porcentagem de votos possível de modo a mostrar que têm fôlego para outubro. O primeiro terá que superar um antiperonismo crescente, a contradição de liderar um país em crise e, por fim, a candidatura do sindicalista Juan Grabois, que se inscreveu de forma independente pela mesma aliança. Já o segundo colocará à prova sua força individual após os candidatos que apoiava nas províncias fracassarem.
Para o analista político Eduardo Fidanza, o que está em jogo é uma renovação da cena política argentina. “O que vai se definir entre Larreta e Bullrich é a liderança do PRO [partido Proposta Republicana, criado pelo ex-presidente Mauricio Macri] e da coalizão de oposição a partir de agora”, afirma o diretor da empresa de pesquisas Poliarquía, referindo-se à decadência de Macri.
O mesmo acontece do lado peronista, mas com uma diferença relevante na postura da ex-presidente e atual vice Cristina Kirchner. “Enquanto ele ainda tenta impedir que o poder que sobrou escape das suas mãos, ela está buscando sair do centro do cenário e colocar uma nova liderança, condicionada à sua confiança.”
É diferente do que ela fez nas últimas eleições, em 2019, empurrando à Presidência Alberto Fernández, que segundo o consultor não tinha as mesmas grandes ambições que Massa tem. Os últimos três presidentes argentinos, aliás, se retiraram da corrida há alguns meses, um atrás do outro, ao ver seus índices de rejeição popular ultrapassarem os 70%.
A partir disso, abriu-se um grande clima de incerteza sobre quem entraria na disputa. Enquanto as duas principais forças brigavam internamente, Milei tomava tração. Finalmente, em junho, com o fechamento das listas eleitorais e a definição de Massa no último segundo, os dois polos tradicionais da política do país voltaram a despontar um pouco acima nas sondagens.
Acontecimentos violentos e uma nova corrida do dólar nos últimos dias, porém, jogaram tensão sobre a reta final das campanhas das primárias e ampliaram ainda mais o clima de incerteza. Na quarta-feira (9), uma menina de 11 anos morreu ao ser atacada por dois homens de moto na porta da escola em Lanús, perto de Buenos Aires, gerando comoção geral. Na quinta (10), um manifestante de esquerda sofreu um mal súbito enquanto era detido por policiais num ato em frente ao icônico Obelisco, na capital.
A violência e a inflação têm sido os dois grandes temas da corrida até aqui. A desvalorização da moeda é citada por 55% da população como sua maior preocupação, e a insegurança, por 38% em uma pesquisa da Universidade de San Andrés –mesmo que a Argentina seja considerada um dos países mais seguros da América Latina.
Se há um ano US$ 1 (R$ 4,91) comprava cerca de 300 pesos argentinos, hoje compra mais de 600. Os preços subiram 116% no mesmo período, corroendo parte dos salários, que passam por constantes reajustes. Os dados mais recentes, do primeiro trimestre deste ano, mostram um aumento da pobreza e da desigualdade no país, que havia caído no ano passado.
Tudo isso tem provocado um descontentamento geral com a política entre os argentinos. Muitos deles diziam ainda não saber em quem iam votar a uma semana das primárias, colocando à prova sua disposição para cortar e depositar na urna as listas de papel usadas na maioria das seções eleitorais neste domingo.
Além do presidente, as chamadas Paso (Primárias, Abertas, Simultâneas e Obrigatórias) também definirão os candidatos das diferentes forças políticas para um terço do Senado, metade da Câmara de Deputados e para governos importantes, como o da província e da cidade de Buenos Aires.
JÚLIA BARBON / Folhapress