BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – O argentino já esperava que o dólar paralelo, que puxa os preços no país, pudesse atingir os 1.000 pesos antes do fim do ano. Mas aconteceu mais rápido do que o previsto. A marca foi batida nesta terça (10), menos de duas semanas antes das eleições presidenciais, que agora ganham mais tensão com uma nova crise cambial e trocas de acusações sobre de quem é a culpa.
“São um bando de irresponsáveis”, disse o ministro da Economia e candidato pelo peronismo, Sergio Massa, nesta segunda (9), quando a moeda já estava em ascendência. Ele acusa seu maior rival, o ultraliberal Javier Milei, de estar gerando uma corrida ao dólar ao prometer dolarizar o país e eliminar o Banco Central caso seja eleito.
Mais cedo, Milei havia recomendado numa entrevista que os argentinos não usassem o peso para economizar ou investir: “Jamais em pesos, o peso é a moeda emitida pelo político argentino, portanto não vale nem excremento, esses lixos não servem nem como adubo”, repetiu o deputado e economista.
O candidato libertário, por outro lado, tem postado repetidamente que a responsabilidade é dos últimos governos, principalmente kirchneristas. “É vergonhoso o espetáculo que os políticos estão dando, tentando obter vantagens políticas do desastre econômico, inventando responsabilidades. Se querem encontrar os responsáveis, olhem-se no espelho, sem-vergonhas”, escreveu.
Já a terceira colocada nas pesquisas, a macrista Patricia Bullrich, convocou uma entrevista coletiva de urgência sobre a crise para o fim da tarde ao lado de Carlos Melconian, cotado para ser seu ministro da Economia.
O chamado dólar “blue” subiu cerca de 30% em apenas uma semana, o que significa que todos os preços devem aumentar na mesma proporção. Se um argentino fosse a uma casa de câmbio paralela no último dia 3 o que é proibido, mas comum, já que há muitas restrições para comprar a moeda oficialmente, pagaria cerca de 810 pesos por dólar. Nesta tarde, já estaria pagando cerca de 1.040.
Enquanto isso, o ministro e candidato Massa continua segurando o valor da moeda estrangeira usado em transações oficiais a 367 pesos para tentar conter a inflação e, desde a semana passada, reforça o controle sobre a compra de divisas no mercado financeiro, à medida que investidores e poupadores se desfazem de seus ativos em pesos devido à constante desvalorização e alta inflação.
Grande parte dos economistas e bancos também apontam as promessas de dolarização de Milei como o principal motivo para a explosão do câmbio, mas também citam flexibilizações do governo e possíveis ações especulativas do mercado.
“Hoje, sem ser a moeda oficial, o dólar já tem uma demanda enorme e uma oferta muito contraída na Argentina. Se passar a ser a moeda legal, seu valor vai disparar ainda mais, portanto te convém comprar dólares hoje, o que faz o preço subir”, explicou o economista argentino Ignacio Galará, do Centro de Estudos Monetários e Financeiros de Madri.
A crítica central dos especialistas à proposta de Milei é que o país tem reservas baixíssimas até negativas, segundo estimativas de dólares nos cofres do governo. Também dizem que, quanto mais alto o valor da moeda estrangeira, mais pobres os argentinos ficarão no momento em que seus salários forem transformados em dólar.
Milei já chegou a afirmar o contrário: que quanto mais valioso estiver o dólar e mais desvalorizado estiver o peso, mais barata fica a dolarização, já que se necessitaria menos moeda estrangeira “para trocar o Monte Evereste de pesos que há no país por um montinho de dólares”, como cita o jornal Clarín.
As perspectivas são de piora nos próximos dias e para depois do primeiro turno, em 22 de outubro. Foi o que ocorreu em agosto, depois do triunfo inesperado de Milei e de uma desvalorização parcial do peso promovida por Massa, atendendo a uma exigência do FMI para liberar empréstimos. Parte das vendas de produtos e serviços chegaram a ser paralisadas, já que não havia referência para os preços.
Finalizado o mês, contou-se uma alta de 12,4% na inflação somando 124% em um ano, o que é considerado altíssimo até para os padrões argentinos. As expectativas são de que o número de setembro, que será divulgado na quinta (12), também não fique muito atrás, gerando mais notícias negativas para o ministro da Economia.
JÚLIA BARBON / Folhapress