RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O policial militar aposentado Robson Calixto Fonseca, acusado de ser o braço-direito de Domingos Brazão na relação com milicianos, tinha linha direta com coronel Fábio Villela Pinho, atual chefe de gabinete do secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, Victor Santos, de acordo com a Polícia Federal.
Agentes identificaram troca de mensagens entre os dois no celular apreendido com Fonseca em março, quando ele foi alvo de busca e apreensão nas investigações sobre a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL) e seu motorista Anderson Gomes.
O coronel Pinho não está sob investigação. A troca de mensagens foi incluída em relatório complementar da PF para demonstrar “a intensa rede de contatos da orcrim [organização criminosa] investigada”.
Em nota, o oficial afirmou que não mantinha relação de amizade com o PM. “Na ocasião da conversa, ele se dirigia ao então assessor de um conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e não com alguém de relação próxima a ele.”
O advogado Gabriel Habib, que defende Fonseca, afirmou ter recebido com surpresa a prisão de seu cliente. “Robson sequer figurou no inquérito policial como investigado. Em momento algum ele foi alvo de investigação. Não existe absolutamente nenhum elemento concreto contra ele na investigação e a defesa irá provar isso.”
Peixe, como o PM é conhecido, era assessor de Domingos Brazão, conselheiro do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro) e um dos acusados por encomendar o crime. O policial era, segundo denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República), um dos responsáveis por intermediar o contato com milicianos de Rio das Pedras, além de intermediar a grilagem de terras pela família.
O ex-PM Ronnie Lessa, acusado de ser o executor do crime, afirma em sua delação que Peixe foi o responsável por lhe entregar a arma usada no homicídio, bem como recolhe-la após a morte de Marielle. A PGR, porém, afirma que não foi possível corroborar a versão do colaborador.
A PF indicou em relatório complementar três conversas travadas entre Peixe e Pinho.
A primeira ocorreu em outubro do ano passado. Na ocasião o PM pediu para que o coronel intercedesse em favor de um segurança da equipe de Brazão que havia sido alvo de um registro de ocorrência por lesão corporal na Taquara.
“Chefe, estou precisando que o sr. atendesse um polícia que trabalha conosco, para o sr. orientar”, enviou Peixe para Pinho, indicando que um outro PM o procuraria sobre o tema. O relatório não expõe se houve algum desdobramento após a solicitação.
Em janeiro, o coronel Pinho enviou uma imagem mostrando trecho do Diário Oficial que trazia sua nomeação para a chefia de gabinete do secretário. A mensagem é enviada com votos de feliz ano novo.
Duas semanas antes de ser alvo de busca e apreensão, em março, Peixe voltou a procurar o coronel. Ele pediu orientação em relação à fiscalização de um depósito de gás de um amigo em Mangaratiba. O oficial encaminhou o telefone do dono de uma empresa do setor.
“Esta continuação de análise do chat entre Peixe e Cel. Pinho serviu apenas para reforçar o alcance da orcrim investigada, não sendo objeto da investigação a conduta do servidor interlocutor ou de outras pessoas citadas”, afirma a PF em relatório.
Eles também encontraram uma mensagem enviada por Peixe em março de 2023 para um assessor do presidente da Assembleia Legislativa, Rodrigo Bacellar (União), cobrando a nomeação da filha do ex-chefe de Polícia Civil Álvaro Lins. Ela não foi nomeada.
O celular de Peixe foi a apreensão na qual os agentes conseguiram mais evidências sobre a atuação da família Brazão, por meio de seu braço-direito.
Também chamou a atenção dos investigadores uma foto em que Peixe posa com a farda da PM. Ele se aposentou como soldado, mas o uniforme que vestia, com seu nome na lapela, levava as insígnias de coronel.
O celular de Peixe é também usado para corroborar as suspeitas de vínculos entre Brazão e a milícia de Rio das Pedras.
A PF localizou no aparelho mensagens apagadas com Katia Lenise Pereira, mãe do filho de Marcus Vinícius Reis dos Santos, o Fininho, apontado como um dos líderes da milícia da favela na zona oeste.
Ela foi nomeada num cargo na Assembleia Legislativa fluminense. A PF encontrou manuscritos no gabinete de Brazão no TCE menção à indicação dela para o posto, incluindo o nome “Fininho” em parênteses após o da escolhida.
O documento e as conversas no celular foram relevantes porque Brazão, em depoimento à PF em 2019, negou ter relação política com Fininho. As evidências, para os investigadores, ampliam o nível de relacionamento entre eles.
Segundo a acusação, os irmãos Brazão decidiram matar a vereadora para impedir que ela continuasse a prejudicar os interesses dos dois em práticas de grilagem de terras e para dissuadir outros integrantes da sigla a adotar a mesma postura.
De acordo com a PGR, era essa atividade que estava sob ameaça com a atuação de Marielle e políticos do PSOL. Segundo a denúncia, o assassinato foi o ápice de uma série de desavenças anteriores dos irmãos Brazão com membros da sigla.
A defesa de Domingos Brazão afirmou, no momento de sua prisão, que ele não tem qualquer ligação com o caso da morte da vereadora e que “delações não devem ser tratadas como verdade absoluta”.
ITALO NOGUEIRA / Folhapress