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Atalho para doutorado em universidades paulistas divide pesquisadores

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma forma mais reduzida de trilhar a pós-graduação em São Paulo foi aprovada em novembro pelas três universidades estaduais paulistas (USP, Unesp e Unicamp) e as três federais do estado (Unifesp, UFABC e UFSCar).

O novo modelo oferece a possibilidade de um aluno de mestrado -atualmente com dois anos de duração- passar para o doutorado após completar os 12 primeiros meses de curso. Dessa forma, o título de doutor seria obtido em cinco anos.

As seis universidades assinaram um contrato para o chamado PAPG (Plano de Aperfeiçoamento da Pós-Graduação), uma iniciativa da Pró-Reitoria de Pós-Graduação da USP que, agora, está em fase de discussão para o financiamento.

Segundo o pró-reitor de pós-graduação da universidade, Rodrigo Calado, houve uma consulta junto aos programas nas instituições paulistas que aderiram de forma voluntária à mudança. “De uma forma geral, a pós-graduação hoje no país não necessariamente atende aos interesses do estudante”, afirma ele.

A ideia é que, ao encurtar o tempo da pós, os alunos consigam ingressar no mercado de trabalho mais cedo -a idade média de titulação de doutores no país é de 38 anos, maior do que a de países ricos da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), de 35 anos.

“O mestrado acadêmico ficou como um treino para o doutorado, sendo que o curso, ao redor do mundo, tem um objetivo muito mais voltado para uma especialização. Então, o aluno vai poder optar, ao término do primeiro ano, se deseja aprofundar o seu conhecimento e concluir um doutorado, ou se ele tem objetivos profissionalizantes. Hoje, em média, 30% dos alunos de mestrado seguem com o doutorado”, diz.

A nova proposta é, inclusive, favorável à inserção de mais doutores no mercado de trabalho, afirma o pró-reitor. “Ele vai se tornar mais competitivo, porque vai ter uma maior especialização, e poder ganhar um salário maior, mas sem ter que esperar dez anos para a formação.”

Atualmente, já existe uma via para ingresso no doutorado direto nas universidades, mas nesses casos os alunos passam por uma avaliação de uma banca e precisam fazer o requerimento de uma bolsa específica de doutorado direto da Fapesp (órgão de fomento a pesquisa no estado). Por isso, o novo modelo proposto é condicionado também a um financiamento conjunto da agência paulista e da Capes, ligada ao Ministério da Educação.

A mudança, no entanto, divide opiniões de docentes. Fernando Luis Cônsoli, professor do departamento de entomologia e acarologia da Esalq/USP (escola de agricultura) afirma que a medida não traz nada de novo justamente porque os programas de excelência já preveem o avanço de mestrandos para o doutorado direto com uma avaliação de competência do aluno.

“Se o recurso de ‘encurtar’ o tempo de titulação já era disponível e se a formação tradicional de mestres é obsoleta, por que não tivemos a maior utilização do doutorado direto no passado?”, questiona.

Segundo ele, o debate reacendeu uma discussão maior sobre o o que define um doutor na sociedade. Ele cita o fato de o novo modelo incluir, nos programas de pós, disciplinas voltadas à inovação, ao empreendedorismo e para a inserção na indústria, empresas privadas ou estatais públicas.

“O papel da pós-graduação stricto sensu [mestrado e doutorado] é a formação de recursos humanos treinados para o desenvolvimento da pesquisa. Adicionar um novo propósito, o aprendizado necessário para se desenvolver como empreendedor ou gestor de negócios, certamente produz um ambiente sem foco, com risco de não formarmos recursos humanos de excelência para a prática do questionamento científico”, afirma.

O presidente da ANPG (Associação Nacional dos Pós-Graduandos), Vinicius Soares, afirma que faltou debate amplo com todos os setores envolvidos antes da aprovação do modelo. “Estamos enfrentando, nos últimos anos, uma crise na pós-graduação, e o modelo atual não é atrativo para quem sai da graduação. Não é só pela dificuldade de absorção de mestres e doutores no mercado, mas pela própria desvalorização do pós-graduando e a falta de perspectiva de direitos sociais”, diz.

Lázaro Eustáquio Peres, professor de fisiologia vegetal na Esalq, considera que um modelo voltado para a inovação não vai atrair novos ingressantes no mestrado e doutorado. “Um dos argumentos apresentados é a baixa procura pela pós-graduação, mas não dá para dizer que o problema é o tempo de titulação para o doutorado, porque antes levava o mesmo tempo e a gente tinha uma procura muito maior”, diz.

Já Cláudio Schön, professor do departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da Escola Politécnica (Poli-USP), afirma que o novo modelo aproxima a pós-graduação do que já ocorre em outros países como os Estados Unidos, onde há o ingresso direto do doutorado a partir da graduação.

“A gente quer reter nossos estudantes de graduação e ter esse tempo para mostrar a vantagem de fazer um doutorado. Um jeito é oferecendo um caminho abreviado para ele concluir o título de doutor e ter uma empregabilidade boa”, afirma.

Para José Roberto Simões-Moreira, professor de engenharia mecância da Poli, o novo modelo pode fornecer uma formação avançada aos alunos. “Os riscos são menores do que os do sistema atual, se o sistema for bem concebido e implementado”, avalia.

CRITÉRIOS PARA A MUDANÇA

A proposta é voltada apenas para os programas com conceito 6 e 7 pela Capes -as notas mais altas da avaliação do órgão, que expressam excelência constatada em nível internacional. Nos de nível 5 (“muito bom”) ou inferior, o modelo atual segue vigente.

De acordo com o portal Geocapes (Sistema de Informações Georreferenciadas do órgão federal), existem no país 412 programas de nível 6 e 262 de nível 7, sendo que São Paulo concentra cerca de um terço deles.

Ainda de acordo com a proposta, os mestrandos que optarem pelo ingresso no doutorado após 12 meses terão uma complementação da bolsa, atualmente de R$ 2.100 para mestrado, para chegar aos valores hoje destinados à bolsa de doutorado da Fapesp: R$ 5.520 no primeiro e segundo ano de doutorado e R$ 6.810 no terceiro e no quarto.

Concluída a primeira etapa, os discentes vão passar por um exame de qualificação do mestrado para avaliar seu desempenho e o projeto de pesquisa. Caso aprovado, o aluno pode prosseguir no mestrado e concluí-lo em mais um ano ou convertê-lo ao doutorado.

ANA BOTTALLO / Folhapress

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