Autoras pedem revogação de prêmio do MinC por suposto preconceito linguístico

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um grupo de escritoras pede que o Ministério da Cultura revogue o Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura afirmando que houve falhas no processo de seleção e que um de seus critérios estimula preconceito linguístico. O MinC nega as acusações e diz que vai se reunir com as artistas na quinta-feira (11).

Lançado em abril do ano passado, o prêmio distribuiu R$ 3 milhões para 61 escritoras. Cada autora recebeu R$ 50 mil. Elas puderam concorrer com contos, crônicas, poesias, histórias em quadrinhos, romances e roteiros de teatro.

No edital, o Ministério da Cultura previa que “domínio técnico e inventividade no uso de recursos linguísticos” seria um dos critérios de seleção. É justamente esse um dos pontos criticados pelo coletivo “Nós, Carolinas do Brasil”, que lançou uma carta aberta pedindo que o prêmio fosse revogado e refeito.

“A medida força uma adaptação que tenta restringir nossa rica diversidade a um único modelo de escrita considerado como ‘correto’, modelo decorrente da norma linguística imposta pelos colonizadores desta nação”, diz o coletivo. “Uma prova concreta disso é que absolutamente nenhuma escritora quilombola ou indígena atingiu a nota máxima neste edital.”

O Ministério da Cultura, porém, refuta as acusações e diz que esse critério não se baseia em conhecimento gramatical, mas no modo como as escritoras usam recursos linguísticos na criação literária.

“Há um entendimento equivocado quando se compara ‘domínio técnico’ e ‘preconceito linguístico’ como se técnica indicasse algum tipo de exigência da norma padrão da língua portuguesa, o que não é o caso”, diz o governo, em nota.

As integrantes do grupo afirmam também que tiveram três dias para elaborar recursos caso discordassem do resultado, prazo que consideram pequeno. Além disso, argumentam que não tiveram a possibilidade de ver a pontuação que receberam em cada uma das categorias.

Segundo elas, isso fez com que seus recursos tivessem argumentos vagos, uma vez que não sabiam em quais áreas perderam pontos.

A multiartista Laila Garroni diz ter entrado três vezes em contato com o MinC para ter acesso às suas notas. No entanto, diz ela, obteve resposta apenas no dia 12 de dezembro, cinco dias após a divulgação da lista com os nomes das selecionadas.

“Eu tive que escrever um recurso sobre todos pontos, ou seja, tive que atirar para todos os lados. Isso enfraquece muito o meu pedido de recurso”, diz ela, que é uma das seis integrantes do coletivo.

Por sua vez, o MinC diz que o prazo de três dias para apresentar recurso não é diferente daquele dado pela maioria dos editais públicos. A pasta afirma também que encaminhou as notas para as candidatas que solicitaram, mas que esses dados não eram fundamentais para a elaboração de recursos.

Garroni critica também o modo como a reserva de vagas foi aplicada na seleção. Ela diz que o prêmio teria restringido a candidatura de mulheres negras a vagas voltadas a cotistas.

Ocorre, afirma a artista, que as candidatas negras alocadas no sistema de cotas tiveram notas máximas. Por essa razão, considera que elas deveriam estar na ampla concorrência para que outras candidatas pudessem ter mais chances. “Mas esse edital pegou centenas de mulheres negras e disse que elas podem competir só entre elas.”

Garroni afirma ainda que uma das premiadas havia se autodeclarado negra no começo da seleção. No entanto, teria entrado com um recurso e passado a fazer parte da categoria “não se aplica”, ou seja, voltada para a ampla concorrência, e conseguido uma vaga extra nesse grupo.

Inicialmente, o prêmio iria contemplar 60 autoras, número que subiu para 61 quando a lista das selecionadas foi divulgada.

“Como que um edital com o nome de Carolina Maria de Jesus premia uma mulher que se dizia negra, depois passa a ser branca e aí consegue uma vaga extra? Isso é outro absurdo”, afirma a artista.

“As mulheres que estão comigo neste coletivo têm dificuldade de colocar comida na mesa. São mulheres que estão num lugar que precisam ter o mínimo de dignidade para exercer sua literatura.”

O MinC diz que a candidata foi incluída na categoria voltada a mulheres negras por um equívoco da Comissão Técnica de Habilitação. Após perceber o erro, diz a pasta, a escritora solicitou a correção para o grupo adequado.

O órgão afirma ainda que, como havia recursos disponíveis, decidiu premiar mais uma candidata, motivo pelo qual criou uma vaga extra.

Redação / Folhapress

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