Barbie e Super Mario Bros. ‘salvam traseiro’ de Hollywood em 2023

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Você salvou o traseiro de Hollywood”. Assim foi o filosófico agradecimento de Steven Spielberg a Tom Cruise no início de 2023, complementado com um: “Sério, ‘Top Gun: Maverick’ pode ter salvado toda a indústria cinematográfica”.

O famoso diretor se derretia para o ator pelo sucesso da sequência de “Ases Indomáveis”, a maior bilheteria de 2022. Cruise e Spielberg se encontraram algumas vezes no início deste ano em eventos de premiação –Cruise por “Maverick”, Spielberg por “Os Fabelmans”.

Se Spielberg quiser encontrar novamente o salvador da indústria no fim de 2023, provavelmente terá que ir a uma loja de brinquedos e dar um longo abraço na boneca Barbie e em algum produto inspirado no game Super Mario Bros. Ambos ganharam filmes homônimos que foram os principais sucessos do ano e quase livraram Hollywood de uma temporada desastrosa. Quase.

Depois de um 2022 claudicante (apesar do retorno pleno do entretenimento presencial), 2023 deveria ver a total recuperação na indústria de cinema.

Faltando um fim de semana para terminar o ano, os números foram desoladores. Até aqui, as produções de 2023 somam US$ 8,6 bilhões de arrecadação, uma das piores cifras do período pré-Covid no século 21.

De 2009 a 2019, a bilheteria anual nunca foi inferior a US$ 10 bilhões (em 2020 as salas fecharam). E entre 2015 e 2019 sempre superou os US$ 11 bi –a maior marca é a de 2018, com US$ 11,9 bilhões, graças a títulos como “Pantera Negra”, “Vingadores – Guerra Infinita” e “Os Incríveis 2”. Para encontrar arrecadação semelhante a de 2023 é preciso retornar a 2005, quando a cifra total foi de US$ 8,8 bilhões, capitaneados por “Star Wars: Episódio 3 – A Vingança dos Sith”.

Alguns apontam a greve de roteiristas e atores como um dos fatores para o fraco desempenho da temporada –a paralisação impediu astros de promoverem os filmes em premières e, sem roteiristas, produções foram paralisadas, outras, adiadas, e um grande rearranjo do calendário precisou ser feito, empurrando para frente títulos e provocando um efeito dominó em longas como a segunda parte de “Duna”, mais um “Caça-Fantasmas”, sequências de “Avatar”, “Deadpool 3” e muitos outros.

Ainda assim, não faltaram lançamentos superlativos, incluindo heróis da Marvel e da DC, a volta de Indiana Jones (sem Spielberg) e a primeira parte da última aventura de “Missão: Impossível”, com Tom Cruise –olha ele de novo. E todos fracassaram em alguma escala.

Ainda assim, quem quiser olhar o copo meio cheio pode rufar os tambores para “Barbie”, de Greta Gerwig, maior bilheteria da temporada, com US$ 636 milhões arrecadados nas bilheterias americanas (menos que os US$ 716 mi de “Maverick” no ano anterior) –é também a primeira vez que o campeão do ano tem uma mulher no comando.

O surpreendente “Super Mario Bros. – O Filme” ficou em segundo, com US$ 575 milhões, à frente de outra animação, “Homem-Aranha: Através do Aranhaverso”, com US$ 381 milhões. “Guardiões da Galáxia – Vol. 3”, único motivo de sorrisos para a Marvel, foi o quarto colocado, com US$ 359 milhões.

Fechando o top 5, “Oppenheimer” arrecadou US$ 326 milhões. Dirigido por Christopher Nolan, o filme se beneficiou por uma inesperada ação que se transformou na campanha boca a boca do ano, ou o evento mais comentado do cinema nas redes sociais, o “Barbenheimer”.

Lançados no mesmo dia, os títulos levaram a mesma pergunta para perfis de famosos e desconhecidos, envolvidos ou não com os longas: qual filme você verá, “Barbie” ou “Oppenheimer”? Em vez de entrar em alguma forçada polêmica, o próprio Nolan e outros atores diziam estar ansiosos para ver os dois. Funcionou, para os dois.

Porém, lançamentos de superproduções espremidos em sequência não ajudaram os outros amiguinhos. Em um espaço de poucas semanas, se acumularam as estreias de “Transformers: O Despertar das Feras” (9 de junho), “Elementos” (16 de junho), “The Flash” (16 de junho), “Aranhaverso” (23 de junho), “Indiana Jones e o Chamado do Destino” (30 de junho) e “Missão: Impossível – Acerto de Contas – Parte 1” (13 de julho). Nenhum deles chegou aos US$ 175 milhões, valor baixo considerando seus respectivos orçamentos. Pior, todos foram ultrapassados pelo documentário-show “Taylor Swift: The Eras Tour”, que somou US$ 179 milhões e teve custo irrisório.

Provavelmente o maior fracasso vai para conta da adaptação da DC “The Flash”, da Warner, que somou US$ 108 milhões nas bilheterias de EUA e Canadá contra um orçamento de US$ 200 milhões –sem contar o gasto com publicidade.

Já a despedida de “Indiana Jones”, da Disney, parecia ter tudo no lugar, um personagem carismático, um astro para atrair gerações antigas e o talento da atriz-roteirista Phoebe Waller-Bridge (“Fleabag”) para os mais jovens. Com custo de US$ 300 milhões, arrecadou US$ 174 milhões, apenas a 12ª bilheteria do ano.

Pixar e Marvel, responsável por blockbusters da Disney, também falharam. “As Marvels” repôs aos cofres da nave-mãe apenas US$ 84 milhões, menos que um terço dos US$ 270 milhões do orçamento. O valor também é ridículo se comparado aos US$ 426 milhões de “Capitã Marvel” (2019).

E mesmo depois de salvar os cinemas em 2022, Tom Cruise descobriu que algumas missões são impossíveis. A última aventura do agente Ethan Hunt não passou dos US$ 172 milhões nas bilheterias americanas –é a sexta pior bilheteria dos sete filmes da franquia. Com orçamento de US$ 291 milhões, só não ficou pior porque chegou à somatória de US$ 567 milhões, contando o resto do mundo. Mas há de se deduzir o valor gasto com publicidade no mundo inteiro, o que é praticamente uma caixa de pandora.

Da série maior a altura, maior a queda, “Velozes e Furiosos 10” gastou US$ 340 milhões e entra para a história como um dos filmes mais caros do cinema. Nas salas dos EUA e Canadá, conseguiu recuperar minguados US$ 146 milhões. Mas chegou a US$ 704 milhões de bilheteria mundial, graças ao inexplicável sucesso em países como China e Brasil. Só isso explica porque ainda teremos “Velozes e Furiosos 10 – Parte 2”, ou “Velozes 10,5”, talvez.

Até isso “Barbie” foi superior. O filme, que deve marcar presença também na temporada de premiações que se aproxima, teve orçamento de US$ 145 milhões, menor do que a dos concorrentes de peso. Somando a bilheteria mundial, a comédia repetiu o primeiro lugar, com US$ 1,4 bilhão (13ª maior arrecadação mundial em números absolutos). “Super Mario” (US$ 1,36 bi) foi o outro filme do ano a superar a marca de US$ 1 bilhão.

É possível que Hollywood não tenha aprendido com os erros de 2023, mas como acontece na sua casa ou no governo de um país responsável, a grande lição para 2024 é ficar de olho no orçamento. Quem gasta menos, perde menos.

SANDRO MACEDO / Folhapress

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