SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Moradores que vivem no entorno do Campo de Marte, em Santana, na zona norte de São Paulo, têm perdido o sono com festas realizadas na área do aeroporto.
Uma associação de residentes foi à Justiça pedir o fim dos eventos no Hangar Estrella Galicia, onde os festivais ocorrem, caso não sejam instalados equipamentos para redução de ruído.
A ação foi ajuizada em novembro de 2022, e em maio do ano passado foi concedida uma liminar (decisão provisória) ordenando a interrupção de shows e festas no aeroporto. Mas os moradores alegam descumprimento da determinação.
A Allien Produções, que controla o Hangar Estrella Galicia, afirmou ter todos os alvarás e licenças de funcionamento, e disse respeitar e cumprir a lei. Ressaltou ter feito melhorias no projeto acústico para isolar os sons em festas. Questionada se os eventos seguem acontecendo apesar a liminar, a empresa disse que não iria comentar.
A Infraero, que operou o aeroporto Campo de Marte até agosto de 2023, arrematou espaço para a Allien em 2020, prevendo a finalidade de bar ou restaurante, com possível produção de eventos. A empresa foi a única do processo licitatório.
O hangar é um espaço voltado para a pista do aeroporto. No site do estabelecimento é citada a segurança como diferencial, por estar em área federal. É possível entrar no local pela entrada principal do Campo de Marte, mediante ingresso.
A área onde está o hangar fica em espaço do Campo de Marte diferente daquele onde a Prefeitura de São Paulo pretende construir um parque.
No site Reclame Aqui e nas avaliações do espaço no Google estão registradas uma série de queixas sobre o barulho na madrugada e o desrespeito ao Psiu (Programa de Silêncio Urbano).
Um militar residente na vila confirmou, sob anonimato, o volume excessivo, citando dificuldade para dormir. Segundo ele, o som começa por volta das 22h e se estende até depois das 6h, ininterruptamente.
Em vídeos enviados por moradores das redondezas é possível notar o barulho até mesmo em casas a quilômetros de distância do aeroporto. Segundo lei municipal, a região deve ter ruído noturno de até 50 decibéis, nível de som equivalente a uma rua pouco movimentada.
A Allien pediu duas vezes a suspensão da liminar de maio de 2023, mas as solicitações foram negadas. Nos autos da ação, obtida pela reportagem, constam ao menos 27 festivais até maio, descumprindo ordem do Judiciário.
A Prefeitura de São Paulo diz que foram realizadas vistorias no local em 25 de maio e 1º de junho e que em ambas as ocasiões o ruído não comportava penalidade. Afirma ainda que o aeroporto será fiscalizado novamente.
A Infraero disse não administrar mais o local e que se manifestará sobre o caso apenas ao final do processo na Justiça. Ela concedeu a infraestrutura à Pax Aeroportos.
Já a concessionária ressaltou que a ação foi aberta antes da transição da área e que desde o início de sua administração busca reforçar uma atuação responsável, “com foco em segurança operacional, inovação, cumprimento das exigências regulatórias, normativas e contratuais”.
Perícia realizada no local em outubro de 2023 concluiu que os níveis das caixas de som reproduzidos na análise foram semelhantes ao encontrado em locais como o Allianz Parque e o Morumbis, onde frequentemente há shows.
Apesar disso, o Ministério Público de São Paulo afirmou que mesmo com esses níveis é necessário um projeto de mapa acústico e isolamento, com limitadores de ruído. Também registrou que os moradores foram unânimes em dizer que o som da perícia estava muito inferior ao praticado.
A consultora de relacionamento comercial Daniela Catuta, 40, mora perto do aeroporto e disse ter iniciado tratamento psicológico e psiquiátrico por causa do barulho e da dificuldade de dormir.
Vivendo na região desde os oito anos de idade, ela afirmou que pensa em se mudar dali. “É chegar final de semana, bate a crise de ansiedade e eu falo ‘meu Deus do céu, eu preciso sair deste lugar’. É insuportável morar aqui.”
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COMO DENUNCIAR RUÍDO EXCESSIVO
Barulho
A lei de zoneamento da capital estabelece diferentes parâmetros sobre ruídos a depender da região da cidade e do horário. Em zonas mistas, a regra geral é de até 50 decibéis das 22h às 7h. É possível consultar a zona à qual seu bairro pertence no site da prefeitura
Reclamações
É possível registrar queixa sobre barulho excessivo pelo telefone 156, pelo portal digital da prefeitura ou pelas subprefeituras. É necessário informar nome completo do estabelecimento, horário do barulho e a atividade exercida; o denunciante deve informar nome, endereço e telefone
Fiscalização
A Prefeitura de São Paulo criou o Psiu (Programa de Silêncio Urbano), que vistoria locais e veículos usando decibelímetro dia e noite. O programa divide a fiscalização com as subprefeituras, que avaliam locais que vendam bebida alcoólica ou perturbam o sossego público entre 1h e 5h
MATHEUS TUPINA / Folhapress