WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Os Estados Unidos vão impor sanções a indivíduos que ameaçarem a “paz, segurança e estabilidade” na Cisjordânia, anunciou a Casa Branca nesta quinta-feira (1º). O decreto, uma resposta inédita aos assentamentos na região, tem como alvo ações de colonos judeus, que atingiram nível recorde no ano passado.
As sanções financeiras miram coordenadores e participantes de atos ou ameaças de violência contra civis, intimidação, destruição e tomada de propriedades e participação em atividades terroristas na Cisjordânia.
Citando uma preocupação em particular com a “violência extremista de colonos”, o conselheiro especial de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, disse em nota que o problema é uma grave ameaça a Cisjordânia, a Israel e a toda a região do Oriente Médio, assim como aos “interesses de segurança nacional e a política externa dos EUA”. Pouco depois, o Departamento de Estado anunciou os primeiros indivíduos alvos das sanções.
O primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, reagiu à medida. “A vasta maioria dos residentes da Judeia e da Samaria são cidadãos que cumprem leis. Israel age contra todos que violam as leis em todos os lugares, e portanto não há lugar para atos drásticos”, disse em comunicado.
O ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, de extrema direita, foi mais duro e acusou Biden de cooperar com inimigos de Israel. “A campanha de ‘violência de colonos’ é uma mentira antissemita que inimigos de Israel disseminam com o objetivo de manchar e ferir colonos pioneiros e todo o Estado de Israel. É péssimo que a administração Biden coopere com essas ações”, disse.
Os assentamentos na Cisjordânia são um dos principais entraves a um acordo de paz entre israelenses e palestinos e já foram motivo de embate entre Tel Aviv e Washington. Durante o governo Barack Obama, a Casa Branca pressionou Netanyahu a combater o problema, e uma trégua temporária em novos assentamentos chegou a ser adotada.
As negociações, no entanto, fracassaram, e os assentamentos voltaram a se expandir.
Essas não são as primeiras sanções envolvendo o conflito mais recente no Oriente Médio, mas as primeiras a mirarem israelenses. Desde os ataques perpetrados pelo Hamas em 7 de outubro, os EUA impuseram cinco rodadas de sanções contra o grupo terrorista, a mais recente na semana passada.
Em 2023, 500 palestinos foram mortos na Cisjordânia pelas forças de segurança israelenses ou por colonos, segundo as Nações Unidas. Desse total, 200 foram assassinados antes dos ataques pelo grupo terrorista Hamas em 7 de outubro o maior número registrado em um período de dez meses desde que a ONU passou a monitorar esse número, em 2005.
Depois dos ataques, mais 300 palestinos foram mortos até 27 de dezembro, segundo a ONU.
A ordem executiva emitida por Joe Biden é uma resposta à crescente pressão que o presidente sofre por seu apoio a Israel desde a eclosão do conflito em Gaza. Inicialmente, o democrata afirmou que os EUA estavam “100%” ao lado de Tel Aviv, mas, conforme críticas à reação israelense ganharam força, a Casa Branca passou a adotar uma abordagem mais crítica.
Segundo dados do Ministério da Saúde de Gaza, ligado ao grupo terrorista Hamas, mais de 27 mil pessoas foram mortas pela ofensiva israelense até esta quarta (31). O país é alvo de uma denúncia de genocídio apresentada pela África do Sul na Corte Internacional de Justiça (CIJ), conhecida como Corte de Haia.
Protestos contra a abordagem de Biden são frequentes e preocupam a Casa Branca em ano eleitoral. Na semana passada, em um comício sobre o direito ao aborto planejado para ser um gol pela campanha democrata, o presidente foi interrompido diversas vezes por manifestantes pró-Palestina que o chamavam de “Joe Genocida” e pediam o fim da ajuda americana a Israel.
O tema tem apelo especialmente junto ao eleitorado jovem. Pesquisas de intenção de voto também mostram uma desaprovação crescente à atuação do presidente no conflito no Oriente Médio entre a população negra. As duas demografias são vistas pelos democratas como cruciais para uma vitória contra Donald Trump em novembro deste ano.
A relação de Washington e Tel Aviv foi ainda mais tensionada por declarações de Netanyahu, e de membros do seu governo contrárias a uma solução de dois Estados e em favor de alguma forma de controle sobre a Faixa de Gaza em um cenário pós-conflito.
O governo americano afirma que a criação de um Estado palestino é a única solução para a região, e defende que Gaza fique sob controle da Autoridade Nacional Palestina (ANP), que controla a Cisjordânia.
De acordo com o site Axios, que ouviu dois funcionários americanos sob anonimato, o secretário de Estado Antony Blinken pediu ao departamento uma revisão das opções de medidas e políticas disponíveis para o reconhecimento de um Estado palestino após eventual cessar-fogo em Gaza.
O porta-voz do Departamento de Estado, Matt Miller, no entanto, disse na quarta (31) que isso não mudaria a posição dos EUA. “Não houve mudança de política. Deixamos claro publicamente que apoiamos o estabelecimento de um Estado palestino, e essa tem sido a política dos EUA há um tempo”, afirmou.
Na semana passada, a Corte de Haia afirmou que Israel “deverá […] tomar todas as medidas ao seu alcance para impedir a prática de todos os atos no âmbito do artigo dois da Convenção do Genocídio”, mas não determinou um cessar-fogo.
FERNANDA PERRIN / Folhapress