SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A biografia de Roberto Rodrigues se mistura com a história da agricultura das últimas décadas. Nasceu em 1942 e cresceu no campo, e ainda hoje é um verdadeiro mascate das ideias de inovação no setor.
Agrônomo formado pela Esalq/USP, Rodrigues tem uma lista enorme de associações e de cargos ligados ao setor, inclusive o de ministro da Agricultura do primeiro mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Onde se sente mais à vontade, no entanto, é quando o assunto é cooperativismo.
A biografia de Rodrigues está no livro “Roberto Rodrigues, o semeador: Quem planta, colhe”, de Ricardo Viveiros, da editora Reflexão.
O autor avisa que a publicação não é um livro sobre política e economia, mas não há como separar os caminhos de Rodrigues da política agrícola do país.
Pertencente a uma família voltada para a agricultura, Rodrigues assumiu os negócios do pai logo cedo, não sem pequenos desentendimentos de gerações.
Troca de tratores, adoção de caminhões com o terceiro eixo -para aumentar o volume transportado-, carregamento mecânico da cana, acordos de entrega com usinas e ampliação das variedades de cana plantadas na propriedade foram os primeiros passos.
Do lado ambiental, promoveu reflorestamento em áreas desmatadas, uma vez que a fazenda da família havia sido aberta décadas antes, em um período em que não se olhava muito para esse quesito. Do lado social, fez acordo com um hospital da região para atendimento dos funcionários da fazenda.
Rodrigues surpreendeu vizinhos e usineiros ao ser pioneiro na rotação de cana-de-açúcar com soja na região, no início dos anos 1970. No vazio de outubro a março, além de amendoim e feijão, semeava também a oleaginosa.
Em 1971, iniciou a caminhada pelo cooperativismo agrícola na Coplana (Cooperativa de Produtores de Cana de Guariba), assumindo a presidência da entidade dois anos depois.
Em 1976, nascia a Orplana (Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil), tendo como primeiro presidente Antônio Rodrigues, pai de Roberto.
Cooperativismo sempre foi a grande paixão dele, que ajudou a criar cooperativas de produção e de crédito. Em 1980, uma nova luta pelo setor sucroalcooleiro, buscando o pagamento da cana-de-açúcar pelo teor de sacarose e não apenas pelo peso. O sistema até então não contemplava a qualidade da cana.
Em 1985, mais um passo no cooperativismo ao assumir a presidência da OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras).
Entidades do setor viviam isoladas e desarticuladas, após um domínio do estado na orientação do setor. Rodrigues reuniu 19 entidades agropecuárias para criar a Frente Ampla da Agropecuária.
A entidade, criada para fomentar uma política de longo prazo, já contava com 72 associadas em pouco tempo. Os objetivos da frente eram debater os problemas de natureza econômica, social e política do setor.
Era um período de campo minado e de dificuldades econômicas. Em fevereiro de 1986, ocorre o Plano Cruzado, com congelamento de preços que atinge também o setor agrícola.
Foram duras as negociações. “É preciso que o governo pare de ouvir a Unicamp para ouvir o unicampo”, afirmou Rodrigues à época. O governo tinha muitos economistas da universidade.
Na presidência da OCB, que havia assumido em 1985, Rodrigues reuniu o setor e propôs a inclusão de alguns pontos básicos nas discussões sobre a Constituinte.
Entre eles, a autogestão e a necessidade de o estado incentivar o cooperativismo. As cooperativas de crédito deveriam ser reconhecidas como banco e o sistema deveria ter um tratamento tributário adequado.
Os itens foram aprovados, menos uma das sugestões que tratava do ensino do cooperativismo nas escolas. A aprovação desse item abriria campo para o pedido de vários outros setores com o mesmo objetivo.
Rodrigues deixa a presidência da OCB em 1991 e abre espaço para uma agenda internacional, assumindo a vice-presidência da Organização das Cooperativas da Américas.
Em 1992 foi eleito presidente do Comitê Americano da ACI (Aliança Cooperativa Internacional), entidade que assumiu a presidência em 1997. Foram 30 países visitados em quatro anos, participando de eventos das principais organizações internacionais como ONU, FAO, OIT e OMC.
A vida passou a ser de aeroporto em aeroporto. Rodrigues teve certeza disso no dia em que a netinha Carol lhe perguntou: “É verdade que você é meu avô?
Foi ainda presidente da SRB (Sociedade Rural Brasileira) e participou da criação da Abag (Associação Brasileira do Agronegócio), entidade criada com o objetivo de buscar inovação científica para o setor.
Quando estava na Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, junto com Antonio Palocci, prefeito de Ribeirão Preto pelo PT, viabilizou a criação do Agrishow, evento que ocorre até hoje.
Com farta experiência no setor agrícola, passou a ser a primeira escolha pessoal de Lula para ser ministro da Agricultura durante o seu governo, que teve início em 2003.
No discurso de posse destaca a necessidade de o país superar o medo e se tornar refém da esperança. Iniciava-se aí um período de intensas mudanças na política agrícola do país e na resolução de vários entraves que inibiam o crescimento.
O objetivo de Rodrigues era criar um programa de renda para o setor, permitir a formação de organizações privadas robustas e desenvolver mecanismos de negociações internacionais.
Agregação de valor, incentivos às pesquisas, seguro rural, questão ambiental e valorização da biotecnologia também entravam nessa agenda.
Logo no primeiro ano foi criada a Lei dos Orgânicos, que incentivava a produção na Agricultura Familiar. A da Biossegurança, que dava regras à transgenia e outras questões de biossegurança, veio em 2005. Foi criado também um programa de subvenção ao prêmio do seguro rural.
Desfalcado até então no campo externo, o país passou a contar com a Secretaria de Relações Internacionais e um programa de Adidos Agrícolas, que atuavam junto às representações diplomáticas no exterior.
O ano de 2005 foi de dias difíceis. Após o boom das commodities, quando os preços subiram em 2003, os produtores foram incentivados a plantar e obtiveram uma safra recorde em 2005.
Custos de produção elevados, preços de grãos em queda, juros altos, logística sucateada e dólar pressionando foram a gota d’água para uma severa crise no campo, agravada ainda mais com a ocorrência do foco da febre aftosa em Mato Grosso do Sul.
Para diminuir a dependência do setor das mãos do governo, houve uma abertura para novos meios de financiamento rural, com a criação dos títulos financeiros específicos para o setor.
Em 2004, foi criado o Programa Nacional de Biodiesel e, em 2005, o Plano Nacional de Agroenergia.
Apesar do avanço em política agrícola e de novos programas no setor, Rodrigues tinha dificuldades no ministério devido às limitações orçamentárias da pasta. Era difícil fazer a classe agrícola entender as dificuldades da gestão pública.
O ministro havia sido escolha pessoal de Lula, mas o PT mais radical sempre o viu como forma de tensão. Em 2006, quando se aproximava a eleição que daria um segundo mandato a Lula, Rodrigues deixa o Ministério da Agricultura.
Após a saída, passa pela FGV Agro e cria o Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Rodrigues continuou avaliando o agronegócio como colunista de jornais como Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo.
Aos 82 anos, ainda atua em várias instituições. Há 15 dias fez um giro pelo Oriente Médio em busca de investidores para o setor.
ROBERTO RODRIGUES, O SEMEADOR: QUEM PLANTA, COLHE
Preço R$ 154,90 (400 páginas)
Autoria Ricardo Viveiros
Editora Reflexão
MAURO ZAFALON / Folhapress