SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Bolsa brasileira caiu e fechou abaixo dos 118 mil pontos nesta terça-feira (27), enquanto o dólar subiu ante o real, após a divulgação da ata da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) e dos dados de inflação medidos pelo IPCA-15 (Índice de Preços ao Consumidor Amplo – 15) referentes a junho.
Apesar de a ata do Copom ter reforçado as projeções de corte na Selic (taxa básica de juros) em agosto, o que beneficiaria empresas brasileiras, a Bolsa foi afetada novamente por um movimento de realização de lucros.
Influenciou também o movimento a perspectiva de o dólar ganhar força ante o real num cenário de redução de juros no Brasil, diante do encurtamento da distância entre as taxas de juros brasileira e americana.
Com isso, o Ibovespa encerrou a sessão em queda de 0,60%, a 117.522 pontos, e o dólar subiu 0,62%, fechando o dia cotado a R$ 4,797.
A ata do Copom divulgada nesta terça mostrou que a maioria dos integrantes do comitê defende um corte de juros já em agosto, em sua próxima reunião, se a inflação continuar caindo. O colegiado afirma, porém, que a redução da Selic exige confiança e que uma redução de juros prematura pode reacelerar a inflação do país.
“A avaliação predominante foi de que a continuação do processo desinflacionário em curso, com consequente impacto sobre as expectativas, pode permitir acumular a confiança necessária para iniciar um processo parcimonioso de inflexão na próxima reunião”, afirma o documento.
A ata refere-se à reunião do Copom realizada nos dias 20 e 21 de junho. Na ocasião, o comitê não deu sinalizações explícitas de um corte na Selic em agosto, o que frustrou expectativas do mercado.
As apostas de uma redução de juros na próxima reunião do comitê, porém, foram mantidas e, agora, reforçadas pela divulgação da ata nesta terça.
O economista-chefe da XP, Caio Megale, afirma que ata mostra uma sinalização do Copom de que sua estratégia está aberta a um afrouxamento gradual do juros nos próximos meses.
“Ao mesmo tempo, ao reforçar o risco de uma flexibilização prematura e ao elevar a taxa neutra de juros, o Copom sinaliza que, sob as condições atuais, não vislumbra um ciclo intenso de corte de juros”, pondera Megale.
A XP manteve sua projeção de um corte de 0,25 ponto percentual em agosto, seguido de cortes de 0,50 ponto nas próximas reuniões, até a Selic chegar em 12,00% no fim de 2023.
O chefe de pesquisa macroeconômica da Kínitro Capital, João Savignon, também projeta um corte de 0,25 ponto em agosto. Para ele, o processo de queda das expectativas de inflação, que deve se manter após a reunião do CMN (Conselho Monetário Nacional) na quinta (29), e o baixo nível da inflação corrente, que segue em desaceleração, reforçam o cenário para queda nos juros até a próxima reunião do Copom.
Para Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe da Warren Rena, a sinalização mais dura da ata foi observada na mudança da estimativa do comitê para a taxa de juros real neutra um nível de taxa que não pressiona e não desacelera a inflação de 4,0% para 4,5% ao ano.
“A mudança da estimativa se deu justamente num momento em que o processo de desinflação parece avançar de forma mais rápida, inclusive com desaceleração dos núcleos [que excluem preços de alimentos e energia]. Aparentemente, a ala mais conservadora do BC recorreu a esse expediente para balizar uma postura mais parcimoniosa na condução da política monetária”, diz Goldenstein.
A casa de análise afirma que a ata reforçou um cenário de corte de 0,25 ponto percentual da Selic em agosto e também espera que a taxa termine o ano em 12,00%.
Após a divulgação da ata, os mercados de juros futuros registraram leve queda. Os contratos com vencimento em janeiro de 2024 saíram de 13,00% para 12,97%, enquanto os para 2025 foram de 10,97% para 10,95%.
Com a indicação de corte de juros próximo, o dólar reverteu as perdas do início do dia e passou a subir ante o real. A moeda brasileira tende a se beneficiar de juros mais altos, que oferecem maiores retornos para a renda fixa brasileira e, consequentemente, atraem recursos para o país.
O desempenho do real ante o dólar também foi impactado pelo cenário externo, sob temores de novas altas de juros em economias desenvolvidas.
Na semana passada, o presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central americano), Jerome Powell, afirmou que a batalha contra a inflação ainda não acabou e sinalizou que a autoridade monetária pode realizar mais uma subida nos juros neste ano. Além disso, o Banco da Inglaterra aumentou as taxas do país em 0,50 ponto percentual, acima do esperado pelo mercado.
“As notícias do cenário externo vêm na contramão. As autoridades estão preocupadas com a inflação nas economias centrais, que justificariam a necessidade de novas altas de juros na zona do euro e nos Estados Unidos. Por isso, as moedas emergentes estão sofrendo hoje”, diz Cristiane Quartaroli, economista do Banco Ourinvest.
Ela cita, ainda, que a moeda também pode estar passando por uma correção após as fortes quedas registradas nas últimas sessões, que fizeram com que o dólar atingisse seus menores valores em mais de um ano.
Boa parte do mercado acredita, porém, que, ainda que o Banco Central do Brasil comece o processo de cortes da Selic no futuro próximo, os juros reais (que descontam o IPCA) seguirão favoráveis à atração de investimentos, ainda mais num ambiente de queda da inflação. Portanto, ainda há espaço para queda da moeda americana no Brasil.
A alta nos preços, aliás, mostrou mais um sinal de fraqueza nesta terça. O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou que a inflação medida pelo IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15) variou 0,04% em junho, no segundo mês seguido de desaceleração.
A variação em maio foi de 0,51%, e em abril, de 0,57%. Em junho do ano passado, o índice subiu 0,69%. No período de 12 meses, o IPCA-15 ficou em 3,40%, o menor desde setembro de 2020, quando acumulava 2,65%.
Apesar da desaceleração, o resultado ficou acima do projetado por analistas consultados pela agência Bloomberg, que previam variação mensal de 0,01%. Economistas ouvidos pela Reuters previam queda no período.
“O IPCA-15 trouxe mais uma desaceleração, com redução na média dos núcleos e na difusão. Apesar de não entrar no campo deflacionário e ficar ligeiramente acima do consenso do mercado (queda de 0,01%), isso não é suficiente para reverter as expectativas de direcionamento para a meta”, diz o economista Alexsandro Nishimura, sócio da Nomos.
Após a divulgação do IPCA-15, o Bank of America reduziu sua estimativa de inflação para 2023 para 4,8%, ante 5,5% da projeção anterior, citando os cortes recentes nos preços de combustíveis e automóveis, a forte queda das commodities e a valorização do real.
“A melhora consistente da inflação, associada à manutenção da meta de inflação em 3,0% (o que deve derrubar as projeções de inflação de longo prazo) deve abrir caminho para que o Banco Central inicie o ciclo de flexibilização em agosto, conforme esperamos”, afirma David Beker, chefe de economia para Brasil do banco.
BOLSA CAI MESMO COM PROJEÇÕES OTIMISTAS
Apesar do cenário positivo, a Bolsa brasileira teve queda e fechou abaixo dos 118 mil pontos nesta terça, ainda impactada por realização de lucros, ou seja, quando investidores vendem ações que tiveram forte valorização para consolidar seus ganhos.
A maior pressão do índice veio da Petrobras, que registrou queda de 0,57% em suas ações ordinárias e 0,71% nas preferenciais em dia de fraqueza do petróleo no exterior. Quedas de Assaí (5,61%), Localiza (1,36%) e Itaú (1,53%), que ficaram entre as mais negociadas da sessão, também puxaram o Ibovespa para baixo.
O GPA voltou a registrar forte queda de 4,89%, após a notícia de que o Casino que detém 40,9% do capital da varejista pode vender sua participação na companhia para reduzir sua dívida e garantir sustentabilidade econômica.
As ações da Vale, que subiram 1,30%, atenuaram a queda da Bolsa. A companhia foi a única a registrar alta entre as mais negociadas da sessão, beneficiada pelos contratos futuros do minério de ferro no exterior.
Para o analista Alison Correia, da casa de análise Top Gain, o mercado local experimentou mais uma sessão de ajuste, após semanas de altas na expectativa de uma possível sinalização do BC sobre corte da Selic, o que acabou acontecendo neste pregão.
Na visão de Correia, a sinalização do BC é uma notícia positiva para a Bolsa, “sem sombra de dúvida”, mas que vem após uma sequência de ganhos e com várias instituições já tendo se posicionado antecipadamente para tal cenário.
Alguns profissionais do mercado também citaram como argumento para a correção na bolsa a decisão do BC de elevar a estimativa de taxa de juros real neutra de 4,0% para 4,5%, bem como a visão de que o ciclo de corte da Selic não deve ser longo.
Nos Estados Unidos, os principais índices acionários se recuperaram após uma série de perdas recentes, depois que dados econômicos otimistas dos EUA acalmaram preocupações de investidores sobre uma recessão iminente desencadeada pelos aumentos de taxa de juros pelo Fed. O Dow Jones, o S&P 500 e o Nasdaq tiveram alta de 0,63%, 1,15% e 1,65%, respectivamente.
MARCELO AZEVEDO / Folhapress