BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ironizou nesta segunda-feira (8) o erro da Polícia Federal sobre o valor do suposto desvio de joias recebidas de autoridades estrangeiras. Ele não se pronunciou, no entanto, sobre evidências que, segundo a PF, mostram que o ex-presidente tinha conhecimento da tentativa de venda dos presentes.
A defesa de Bolsonaro também não respondeu aos detalhes das acusações da PF, mas disse ter recebido com indignação o equívoco no valor. Os advogados disseram ainda que, assim que instado pelo TCU (Tribunal de Contas da União), Bolsonaro entregou de forma espontânea os presentes à corte.
O documento da PF, enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal) no relatório que fundamenta o indiciamento do ex-presidente e de mais 11 pessoas no caso, afirmava que o valor dos bens somava R$ 25 milhões (US$ 4.550.015,06).
Durante a tarde, porém, a PF corrigiu o dado. O valor total, na verdade, é de R$ 6,8 milhões (US$ 1.227.725,12). A quantia correta era mencionada em outros trechos.
“Aguardemos muitas outras correções. A última será aquela dizendo que todas as joias ‘desviadas’ estão na CEF [Caixa Econômica Federal], acervo ou PF [Polícia Federal], inclusive as armas de fogo”, disse Bolsonaro nas redes sociais.
Seus advogados divulgaram nota na noite desta segunda-feira (8), em que disseram que o ex-presidente se apresentou espontaneamente para a entrega dos presentes, assim que a legalidade deles passou a ser questionada pelo TCU.
A nota de Paulo Cunha Bueno e Daniel Tesser também questiona a competência do STF (Supremo Tribunal Federal) e do ministro Alexandre de Moraes para estarem com a investigação, e citam parecer da PGR (Procuradoria-Geral da República) que defendeu que o caso fosse para a primeira instância.
Em outra frente, os advogados citam o relógio do presidente Lula (PT), recebido em outro mandato, pelo ex-presidente francês Jaques Chirac. Eles alegam que o caso é idêntico ao de Bolsonaro, mas Moraes já decidiu que “não há indícios mínimos de ocorrência de ilícito criminal”, ao arquivar o pedido de investigação.
Ex-secretário de Comunicação do governo Bolsonaro, Fábio Wajngarten também se manifestou no mesmo sentido e citou “Estado policial”.
“Na matemática do Estado policial temos: 6,8 milhões = 25 milhões; cumprir a lei = crime; e adversário político = culpado. Quanto mais avança, mais fica claro o atraso desse relatório da PF”, disse no X. À Folha, ele classificou o relatório como “vergonhoso”.
Wajngarten estava atuando também como advogado do ex-presidente, mas foi indiciado pela PF neste mesmo inquérito das joias. Por isso, se afastou formalmente do caso.
Aliados alegam que todo o processo de investigação está contaminado politicamente, e o erro da PF será explorado ao máximo como forma de ilustrar isso.
Em outra frente, também buscam minimizar o inquérito e dizem que o ex-presidente seguirá viajando pelo país para ajudar candidatos municipais de seu partido. Ainda não há agenda das próximas viagens.
O inquérito das joias sempre foi tratado como o mais delicado por aliados do ex-presidente. Tanto do ponto de vista criminal quanto do ponto de vista simbólico: para o bolsonarismo, passa a imagem de corrupção, algo que eles sempre atacaram nos adversários.
Outro argumento explorado como forma de demonstrar suposta falta de isenção ou mesmo contaminação política da PF é o fato de o diretor de Inteligência da corporação ser o delegado do caso Adélio Bispo.
Bolsonaro e seus apoiadores não acreditam na conclusão das investigações, que apontou que ele atuou sozinho quando deu uma facada em Bolsonaro em 2018.
No tuíte em que comentou o relatório da PF, o ex-presidente também buscou explorar isso. “Aguarda-se a PF se posicionar no caso Adélio: ‘quem foi o mandante?’. Uma dica: o delegado encarregado do inquérito é o atual diretor de Inteligência”, disse.
O vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (Republicanos) também voltou a falar do caso Adélio Bispo. Ele disse que não foi chamado para depor no caso da facada, mas que hoje fazem uma devassa em sua vida. “Creio que seja só mais um erro nas investigações e no modus operandi de tudo também”, ironizou.
Bolsonaro também foi indiciado no caso de fraude em cartão de vacina e é investigado por tentativa de golpe. Sua defesa nega todos os crimes.
No caso das joias, o ex-presidente é suspeito dos crimes de associação criminosa (com previsão de pena de reclusão de 1 a 3 anos), lavagem de dinheiro (3 a 10 anos) e peculato/apropriação de bem público (2 a 12 anos).
Em relatório que veio a público nesta segunda-feira (8), a PF diz que Bolsonaro tinha ciência da tentativa de venda do conjunto de joias ouro rosé em leilão que ocorreria no dia 8 de fevereiro, em uma loja nos Estados Unidos.
Segundo o relatório produzido pelo órgão, isso ficou evidenciado numa troca de mensagens entre Bolsonaro e o seu ex-ajudante de ordens, Mauro Cid, em que este manda um link de um leilão e o ex-presidente responde “selva”.
O órgão relatou também que, durante a sua análise do celular de Bolsonaro, foram encontrados cookies e históricos de navegação da página da empresa Fortuna Auction, responsável pelo leilão.
ANA POMPEU E MARIANNA HOLANDA / Folhapress