ÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, diz que mal vê televisão ultimamente. Com 88 anos, o homem que ajudou a fazer da TV Globo líder de audiência só acompanha mesmo o noticiário. “Se eu vejo mais, minha mulher me mata. Eu reclamo do som, do texto, da escalação de atores. Faz dez anos que estou interditado, proibido de ver televisão.”
A criticidade se explica pelo papel de liderança que exerceu por três décadas na TV Globo, onde entrou em 1967 para comandar a direção de programação e produção da emissora.
“Acho que todo mundo que sai da operação fica distante [da TV] porque é tão viciante que você fica preso a ela e carrega isso até o túmulo. Não dá”, diz ele, que lançou nesta terça-feira (20), em São Paulo, o livro “O Lado B de Boni”.
A obra apresenta uma versão final sobre o que viveu ao longo de mais de 70 anos de carreira. O executivo é considerado um dos responsáveis pela qualidade da líder de audiência. Na TV Globo, cabia a ele definir a grade de programação, aprovar programas e novelas, contratar autores, diretores e atores.
Em novembro de 1997, porém, Boni foi afastado do poder, processo que não ocorreu como esperava. “Eu saí de lá como se eu tivesse feito alguma coisa errada, mas não fiz nada errado. A lucratividade estava no auge, a audiência estava no auge, estava tudo no auge”, diz, acrescentando que gostaria de ter sido tratado com mais respeito.
A saída da emissora é um dos episódios que ele narra em “O Lado B de Boni”. “Depois de 31 anos de trabalho para construir a TV Globo, fui barrado no baile. Ou melhor: fui expulso da sala”, escreve o executivo.
Essa é a terceira obra que ele lança. Em 2015, publicou “Unidos do Outro Mundo” e, em 2011, lançou “O Livro do Boni”, em que já tecia críticas à forma como Roberto Irineu Marinho, filho de Roberto Marinho, conduziu a sua saída.
Embora não esteja mais na chefia da emissora carioca, ele continua à frente da TV Vanguarda, canal de sua propriedade, afiliada da Globo na região do Vale do Paraíba, em São Paulo. Ele nega as notícias em torno de sua aposentadoria e diz que isso está fora de questão. “Só vou sair se me abaterem a tiros.”
Lá, segundo o executivo, a rotina é menos estressante do que seu período na chefia da Globo, quando precisou lidar com problemas com a ditadura militar. Em 1975, por exemplo, o regime decidiu censurar a novela “Roque Santeiro” e proibir que o folhetim fosse ao ar.
Boni diz que a emissora se destacou em relação às concorrentes por investir mais em novidades. “Eu queria algo novo por ano”, afirma o executivo, acrescentando que a inovação é que pode fazer a TV aberta vencer a disputa contra o streaming.
“A televisão precisa buscar histórias e tem que produzir melhor. Se ela competir em qualidade, vai ganhar essa luta por oferecer um serviço que é de graça.” Boni, aliás, não é fã das plataformas.
“São todas iguais. Elas têm uma fórmula única. Apresentam o problema, mostram o personagem e daí segue a história. No terceiro ou quarto capítulo, eu já vi tudo o que vai acontecer.”
É justamente pela possibilidade de inovar que Boni vê com bons olhos a migração de artistas do SBT para a TV Globo, como fizeram Eliana e Maísa Silva.
“O mais importante é buscar gente nova. Isso é essencial para manter a televisão viva para competir com outros meios de comunicação que estão disponíveis no mercado. Se não inovar, aí vem a internet, o streaming e comem a perna dela.”
Por falar em SBT, a emissora desafiou por décadas a hegemonia da TV Globo com programas como “Casa dos Artistas”, “Quem Quer Dinheiro” e “Show do Milhão”. Todas essas atrações foram comandadas por Silvio Santos, apresentador que morreu neste sábado (17), aos 93 anos.
Apesar da rivalidade entre as emissoras, ele diz que a relação com Silvio era boa. “Tanto que acabei tendo um convite para ir para o SBT.”
No começo dos anos 2000, Boni chegou a assinar um contrato para comandar a programação da emissora. No entanto, a contratação não foi adiante porque Silvio considerou que o executivo teria muito poder no canal.
Boni lembra que o apresentador ligou para ele dizendo que gostaria de mudar uma cláusula que limitava as suas intervenções no SBT.
“Ele disse: Eu assinei esse troço, mas eu não vou poder cumprir porque eu quero interferir. Mas essa cláusula era fundamental para mim, então decidimos desmanchar o contrato amigavelmente”, diz Boni. “Mas não brigamos nem nada. O Silvio Santos era uma pessoa especial, então a gente tinha que respeitá-lo.”
O LADO B DE BONI
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– Preço R$ 82,47 (576 págs.); 19,95 (ebook)
– Autoria Boni
– Editora BestSeller
MATHEUS ROCHA / Folhapress