Boulos e Nunes ignoram segurança viária mesmo com recorde de mortes no trânsito

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Há uma notável ausência nos planos de governo de Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL): a segurança viária. Mesmo com o recorde de mortes no trânsito dos últimos oito anos, o tema é tratado de forma apenas superficial por ambos os candidatos.

Os programas falam em campanhas educativas ou em melhorar a infraestrutura das vias, e defendem a Faixa Azul, exclusiva para o trânsito de motocicletas e sem eficácia comprovada, segundo especialistas.

Nunes e Boulos também dão sinais no sentido contrário, opondo-se a medidas que reduziriam mortes. Enquanto o prefeito critica o que chama de “indústria da multa” e congela as estruturas de fiscalização de velocidade nas vias da cidade, Boulos diz que, se eleito, não reduzirá os limites das marginais como fez o ex-prefeito Fernando Haddad (PT).

“A Faixa Azul está virando uma faixa expressa”, comenta Horácio Figueira, consultor de segurança no trânsito e crítico dessa medida. Ele argumenta que as faixas estimulam comportamento já agressivo dos motociclistas e podem levar a um aumento da frota de motocicletas na cidade.

“Não tem produção de dados suficiente para identificar se ela reduziu mortes de motociclistas”, diz Ana Carolina Nunes, diretora da Cidadeapé, associação que discute políticas de mobilidade.

Tentativas de redução de velocidade nas vias são impopulares, embora defendidas por técnicos em segurança viária para reduzir as vítimas. Em 2016, João Doria, então no PSDB, foi eleito com o slogan “acelera SP” e uma campanha que atacava os radares.

“A velocidade impacta muito na chance de sobrevivência em acidentes viários”, lembra Rafael Drummond, especialista em mobilidade urbana, apontando a ausência do tema em ambas as campanhas. Ele defende redução tanto nas marginais quanto nas grandes vias da cidade.

A cidade de São Paulo registrou neste ano o maior número de mortes no trânsito desde 2015. Foram 689 óbitos, alta de 24% em relação a 2023.

O número de agentes da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), responsáveis por fiscalizar infrações e organizar o trânsito na capital, também caiu 20% de 2014 para 2023, como mostrou a Folha. No ano passado, cada “marronzinho” tinha sob sua responsabilidade 70% mais carros do que uma década antes.

De forma mais ampla, a gestão Nunes (2021-2024) ficou marcada por reforçar a lógica “rodoviarista”, com investimento recorde em recapeamento e asfalto e pouca atenção ao transporte público, que teve sucessivas metas descumpridas.

Dos 40 km de corredores de ônibus prometidos, apenas 6,8 km foram entregues. Dos 300 km de ciclovias previstos, só um terço foi implementado. E a frota de ônibus elétricos e trólebus que deveria ser de 2.390 veículos até o fim deste ano, segundo o Plano de Metas, estagnou em 360.

Agora, o programa do candidato à reeleição para o transporte público promete concluir oito novos corredores de ônibus e BRTs (corredores expressos com cobrança na plataforma), citando apenas o da avenida Radial Leste. Também diz que fará novos terminais de ônibus, sem citar quantos ou quais.

“No fim das contas a gente fica um pouco na dúvida se realmente vai sair do ritmo atual, que é lento”, comenta Rafael Drummond.

Ana Carolina Nunes, do Cidadeapé, calcula que, com o dinheiro gasto em recapeamento em 2023 (quase R$ 4 bilhões), seria possível construir 60 km de corredores de ônibus, levando em consideração o valor do BRT da Radial Leste, cuja licitação foi suspensa e retomada no mês passado.

Em seu programa, Boulos cita especificamente oito corredores aos quais pretende dar prioridade, como Aricanduva, Radial Leste e Miguel Yunes. Sobre a lotação dos coletivos, o candidato promete ampliar o controle e a fiscalização sobre o serviço, o que garantiria o número de viagens previstas em contrato e reduziria o número de passageiros por veículo.

TARIFA ZERO

A tarifa zero, implementada aos domingos na capital e uma das grandes vitrines eleitorais de Ricardo Nunes, não aparece entre as propostas do candidato à reeleição. Nunes tem repetido que implementará o “Mamãe Tarifa Zero”, voltado a mães com filhos não atendidos pelo transporte escolar gratuito.

Neste tema, Boulos promete expandir gradualmente a política, “com responsabilidade fiscal” e mantendo a qualidade do transporte.

Segundo Drummond, faz sentido evitar uma transição repentina para o modelo. “Se a gente considerar que São Paulo tem transporte sobre trilhos, com CPTM e Metrô, a implementação repentina da tarifa zero poderia gerar a migração em massa dos usuários, fazendo o sistema de ônibus colapsar”, diz.

MARCOS HERMANSON / Folhapress

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