SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após a confirmação de sua derrota na eleição para a Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL) afirmou neste domingo (27) que perdeu a eleição, mas a campanha recuperou a “dignidade da esquerda brasileira”.
Boulos foi derrotado pelo candidato à reeleição, Ricardo Nunes (MDB). O psolista registrou 40,65% dos votos, enquanto o adversário ganhou com 59,35%.
No discurso, que fez no meio da militância, disse que nada na vida se conquista sozinho, por isso decidiu fazer o discurso ao lado daqueles que apoiaram sua campanha.
O candidato disse que foi aconselhado a não falar do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra) e afirmou: “Uma eleição se ganha ou se perde, uma dignidade não se perde, um compromisso de vida não se pode perder”.
Também agradeceu a esposa e as duas filhas e disse que elas se mantiveram firmes ao lado dele mesmo diante de mentiras. Sobre o presidente Lula (PT), afirmou que ele é a “maior liderança da história desse país” e agradeceu ao presidente, principal fiador de sua campanha.
O deputado afirmou que nos momentos difíceis da campanha ouviu do presidente o conselho de “siga em frente e seja quem você é” e reafirmou sua aliança com o mandatário.
Ao lado da candidata a vice Marta Suplicy (PT) e do ministro Alexandre Padilha (PT), Boulos agradeceu o apoio do presidente Lula, da equipe, da família, do MTST e dos candidatos Tabata Amaral (PSB) e José Luiz Datena (PSDB).
Boulos disse que se preocupa com o futuro de São Paulo, que seria alvo da “infiltração do bolsonarismo e do crime organizado na maior cidade do Brasil”. “Nós avisamos isso a campanha inteira. Eu espero que o povo de São Paulo e do Brasil tenha forças para evitar o pior.”
“Ergam a cabeça, sigam firmes”, disse aos simpatizantes, admitindo “o resultado eleitoral adverso”. “O futuro vai ser nosso”, disse, citando o sonho de “justiça social e uma cidade mais humana”.
“Em qualquer circunstância, na vitória ou na derrota, saibam que aqui era sempre um combatente corajoso pelas formas de justiça do nosso povo”, afirmou.
O candidato e aliados acompanharam a apuração em um espaço de eventos na região central, onde o clima geral era de indignação com a afirmação do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) vinculando a candidatura do deputado ao PCC (Primeiro Comando da Capital).
O governador afirmou no início da tarde, sem mostrar provas, que facção orientou o voto no candidato do PSOL.
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo afirmou que “o Sistema de Inteligência da Polícia Militar interceptou a circulação de mensagens atribuídas a uma facção criminosa determinando a escolha de candidatos à prefeitura nos municípios de Sumaré, Santos e Capital. A Polícia Civil investiga a origem das mensagens”.
Após a fala do governador, Boulos entrou na Justiça Eleitoral e pediu a cassação de Nunes e a inelegibilidade do prefeito e de Tarcísio. O psolista chamou a declaração de “uma vergonha” e disse que é o “laudo falso” do segundo turno, em referência ao documento forjado divulgado na primeira etapa da campanha por Pablo Marçal (PRTB).
No discurso de derrota, Boulos preferiu não falar sobre o caso e disse que a Justiça Eleitoral deve apurá-lo.
Integrantes da campanha disseram em conversas privadas que a campanha termina com um “gosto amargo” por causa do que foi considerado jogo baixo do grupo político de Nunes.
Após a derrota de Boulos, Alexandre Padilha, ministro de Relações Institucionais, comentou a acusação de Tarcísio no dia das eleições e afirmou que nunca viu “uma ação criminosa tão grave de crime eleitoral, de abuso do poder econômico, como o cometido pelo governador de São Paulo no dia de hoje”.
Ele afirmou que nem o Ministério da Justiça nem a Justiça Eleitoral receberam as acusações de Tarcísio. “A informação é falsa, se fosse verdade, ele teria prevaricado ao não encaminhar aos órgãos corretos o que ele já tem encaminhado. Foi um exercício de tentar influenciar o resultado eleitoral, algo que eu nunca vi nenhum governador de São Paulo fazer.”
Padilha disse ainda que Tarcísio abusou do poder político e cometeu crime eleitoral que precisa ser apurado pelos órgãos competentes.
Há quatro anos, Boulos encerrou a batalha com 40,62% dos votos válidos, porcentagem semelhante à de 2024. A campanha trabalhava para que o candidato atingisse uma margem mais próxima à do adversário, o que não aconteceu.
Esta foi a segunda candidatura e a segunda derrota seguida de Boulos, 42, para prefeito. Em 2020, num resultado surpreendente, ele passou ao segundo turno, quando foi superado por Bruno Covas (PSDB), que tinha Nunes como vice. Com a morte de Covas, em 2021, o emedebista herdou a cadeira.
A derrota do deputado federal se estende ao presidente Lula, principal apoiador e fiador da candidatura, que fez o PT romper pela primeira vez desde a redemocratização a tradição de lançar nome próprio na corrida paulistana. O apoio foi dado em troca do acordo em que Boulos abriu mão de concorrer a governador de São Paulo em 2022 para unificar a esquerda em torno de Fernando Haddad (PT).
Lula foi não fez atos presenciais com Boulos na capital neste segundo turno a chuva levou ao cancelamento de uma sequência de duas caminhadas no dia 19, e um acidente doméstico do presidente na noite do mesmo dia em Brasília o impediu de viajar para uma atividade na véspera da votação.
Com isso, a participação do presidente se resumiu a uma live e gravações para o horário eleitoral e redes sociais. A partir das derrotas na capital paulista e em outras cidades, Lula e a esquerda estudam caminhos para se reconectar com um eleitorado perdido para forças do centro e da direita.
Boulos tem mandato na Câmara dos Deputados até 2026, ano em que deve encarar as urnas novamente. A alternativa vista por aliados como mais provável é que ele tente a reeleição, considerando a necessidade de o PSOL de eleger uma bancada que assegure ao partido fatias dos fundos eleitoral e partidário.
Há especulações de que, com o resultado de agora, o parlamentar seja considerado para a disputa ao Governo de São Paulo ou ao Senado, mas a definição passará por uma análise do perfil de candidaturas que o chamado campo progressista deve lançar no esforço para estancar a perda de espaço.
Apontado inclusive pela candidata a vice, Marta Suplicy, como um potencial sucessor de Lula, Boulos evita comentar o assunto, mas é nome incontornável nas discussões de 2026, que incluem a eventual tentativa de reeleição do presidente. Auxiliares não descartam também a possibilidade de que os dois candidatos derrotados em São Paulo sejam chamados para postos no governo federal.
Desde a pré-campanha, Lula tentou reeditar na eleição paulistana o embate entre ele e Jair Bolsonaro (PL), mas a presença aquém do esperado do petista e a relação ambígua do ex-presidente com Nunes, seu candidato oficial na disputa, frustraram a expectativa de se formar um “terceiro turno” de 2022. Sem empolgação com o atual prefeito, Bolsonaro chegou a flertar com Pablo Marçal (PRTB).
Embora o peso dos padrinhos tenha acabado relativizado, no saldo final Bolsonaro triunfou, ao lado do governador Tarcísio, com a vitória de Nunes sobre a esquerda.
JOELMIR TAVARES, CARLOS PETROCILO, ISABELLA MENON, GUSTAVO ZEITEL E MARCOS HERMANSON / Folhapress